Síria. Metade de Alepo controlada pelas forças jihadistas e rebeldes

por Cristina Sambado - RTP
Mahmoud Hasano - Reuters

Os jihadistas e os seus aliados tomaram “a maior parte” de Alepo depois de uma ofensiva contra as forças governamentais de Bashar-al Assad, revelou o Observatório Sírio dos Direitos Humanos, relatando ataques russos na segunda cidade da Síria pela primeira vez desde 2016.

“Metade da cidade de Alepo está agora sob o controlo (do grupo jihadista) Hayat Tahrir al-Sham (HTS) e das fações aliadas”, avançou à AFP o diretor do Observatório Sírio dos Direitos Humanos (OSDH), Rami Abdel Rahmane.

Segundo a ONG, o número de mortos da ofensiva lançada na quarta-feira subiu para 311 - 183 combatentes do HTS e seus aliados, 100 soldados e membros das forças pró-governamentais e 28 civis. Os jihadistas e os seus aliados chegaram à cidadela histórica de Alepo depois de as forças do regime sírio se terem retirado “sem luta” nesta última fase, acrescentou o diretor da ONG sediada no Reino Unido, que dispõe de uma vasta rede de fontes na Síria.

Segundo a Reuters, que cita fontes militares, as autoridades sírias fecharam, este sábado, o aeroporto de Alepo, bem como todas as estradas que levam à segunda cidade da síria, numa altura em que os rebeldes que se opõem ao presidente Bashar al-Assad disseram ter chegado ao coração de Alepo.
Os combates são os mais violentos desde 2020 na região, onde a província de Alepo, maioritariamente detida pelo regime de Bashar al-Assad, faz fronteira com o último grande reduto rebelde e jihadista de Idleb.
Os combatentes jihadistas entraram em Alepo na sexta-feira, após uma ofensiva de dois dias que pôs fim a anos de relativa calma no noroeste da Síria.

Os combatentes da oposição, liderados pelo grupo militante islâmico Hayat Tahrir al-Sham, realizaram investida surpresa através de cidades controladas pelo governo esta semana e chegaram a Alepo quase uma década depois de terem sido forçados a sair por Assad e seus aliados.

Os rebeldes tomaram igualmente o controlo da cidade estratégica de Saraqeb, a sul de Alepo, no cruzamento de duas autoestradas que ligam Damasco a Alepo e Latakia.

Segundo o OSDH, o grupo jihadista HTS e os grupos aliados, alguns deles próximos da Turquia, tinham chegado às portas da cidade na sexta-feira, após “dois ataques suicidas com carros armadilhados”. Em seguida, tomaram progressivamente o controlo de um número crescente de bairros, segundo esta fonte.

O exército sírio, que enviou reforços para Alepo, segundo um responsável da segurança, afirmou ter repelido “a grande ofensiva dos grupos terroristas” e recuperado várias posições.O exército russo anunciou que a sua força aérea estava a bombardear grupos “extremistas” na Síria em apoio às forças do regime, de acordo com as agências russas. A força aérea síria também lançou ataques intensivos na região de Idleb, revelou o OSDH.

Outro aliado fiel da Síria, o Irão reiterou o seu “apoio contínuo” ao país, onde se comprometeu militarmente a apoiar o Presidente Assad durante a guerra civil.

Na sexta-feira, o Kremlin apelou às autoridades sírias para que “ponham ordem na situação o mais rapidamente possível” em Alepo.

A Rússia, um dos principais aliados de Assad, prometeu a Damasco uma ajuda militar suplementar para contrariar os rebeldes, disseram duas fontes militares à Reuters, acrescentando que o novo hardware começaria a chegar nas próximas 72 horas. Damasco espera que o novo equipamento militar russo comece a chegar à base aérea russa de Hmeimim, perto da cidade costeira síria de Latakia.

O chefe do autoproclamado “governo” de Idleb, Mohammad al-Bashir, justificou a ofensiva na quinta-feira, acusando o regime de ter “começado a bombardear zonas civis, o que provocou o êxodo de dezenas de milhares de civis”.

Os rebeldes, que começaram a sua incursão na quarta-feira, estão a regressar Alepo pela primeira vez desde 2016, quando Assad e os seus aliados Rússia, Irão e milícias xiitas regionais a reconquistaram, com os insurgentes a concordarem em retirar-se após meses de bombardeamentos e cerco.

De acordo com o Gabinete das Nações Unidas para os Assuntos Humanitários (OCHA), a violência deslocou “mais de 14 mil pessoas, quase metade das quais são crianças”. Mustafa Abdul Jaber, um comandante da brigada rebelde Jaish al-Izza, disse que o seu rápido avanço esta semana tinha sido ajudado pela falta de mão de obra apoiada pelo Irão na província de Alepo. Os aliados do Irão na região sofreram uma série de golpes às mãos de Israel, à medida que a guerra de Gaza se expandia pelo Médio Oriente.

Os combatentes da oposição disseram que a campanha era uma resposta à intensificação dos ataques nas últimas semanas contra civis pela força aérea russa e síria em áreas de Idlib controladas pelos rebeldes, e para evitar quaisquer ataques do exército sírio.

O ataque é o maior desde março de 2020, quando a Rússia e a Turquia chegaram a um acordo para desanuviar o conflito.

Fontes da oposição em contacto com os serviços secretos turcos disseram que a Turquia, que apoia os rebeldes, tinha dado luz verde à ofensiva.

No entanto, o porta-voz do Ministério turco dos Negócios Estrangeiros, Oncu Keceli, afirmou na sexta-feira que a Turquia procurava evitar uma maior instabilidade na região e tinha avisado que os recentes ataques minavam os acordos de redução de intensidade do conflito.
Guerra civil matou mais de meio milhão Durante a guerra civil que eclodiu em 2011, matou mais de meio milhão de pessoas e deslocou milhões de pessoas, o HTS, dominado pelo antigo ramo sírio da Al-Qaeda, tomou o controlo de vastas áreas da província de Idleb e de territórios vizinhos nas regiões de Alepo, Hama e Latakia.

Em 2015, o regime sírio recuperou o controlo de uma grande parte do país com o apoio dos seus aliados russos e iranianos. Em 2016, as suas forças, apoiadas pela força aérea russa, reconquistaram a parte oriental de Alepo aos insurretos, após bombardeamentos devastadores.

Nos últimos anos, o norte da Síria tem desfrutado de uma calma precária, possibilitada por um cessar-fogo introduzido após uma ofensiva do regime em março de 2020.

A trégua foi patrocinada por Moscovo em conjunto com a Turquia, que apoia alguns grupos rebeldes sírios na sua fronteira.

A ofensiva permitiu aos jihadistas conquistar cerca de 70 localidades desde quarta-feira, incluindo cerca de 20 na sexta-feira, entre as quais Saraqeb, segundo o OSDH.

c/agências
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