Rússia pede investigação após Trump cancelar viagem para acompanhar conflito na Síria

por Christopher Marques - RTP
Esta terça-feira, depois de os Estados Unidos terem admitido avançar com uma intervenção militar, a Rússia defendeu a realização de uma investigação e deixou um aviso às potências ocidentais Sergei Karpukhin - Reuters

O chefe da diplomacia russa revelou que Moscovo vai apresentar uma resolução para que seja realizada uma investigação independente ao alegado ataque químico na cidade síria de Douma. O anúncio de Sergei Lavrov surge pouco depois de a Casa Branca ter revelado que Donald Trump cancelou a sua participação numa cimeira internacional para supervisionar a resposta norte-americana ao alegado ataque químico.

A partir de Moscovo, o ministro russo dos Negócios Estrangeiros anunciou que a Federação Russa vai propor a realização de uma investigação “transparente e sincera” ao Conselho de Segurança das Nações Unidas, que contaria com a participação da Organização para a Proibição das Armas Químicas (OPAQ).

Na segunda-feira, o chefe da diplomacia russa tinha rejeitado que houvesse qualquer evidência de um eventual ataque químico na localidade síria de Duma. “Os nossos especialistas visitaram o local, acompanhados por representantes do Crescente Vermelho Sírio e não encontraram qualquer vestígio do uso de cloro ou de qualquer outra substância química contra civis”, tinha então referido o chefe da diplomacia russa.

Esta terça-feira, depois de os Estados Unidos terem admitido avançar com uma intervenção militar, a Rússia defendeu a realização de uma investigação e deixou um aviso às potências ocidentais. “Se, sob o pretexto da falta de segurança, aqueles que recorrem a argumentos anti Rússia para prosseguir com os seus objetivos russófobos não autorizarem o envio de especialistas, serão claros os seus verdadeiros planos e o seu desinteresse na verdade”, disse o governante russo.

Esta tomada de posição acontece três dias depois de a organização não-governamental Syrian American Medical Society ter denunciado que mais de 40 pessoas morreram na sequência de um ataque com “gases tóxicos” em Douma. A mesma entidade denuncia que mais de 500 pessoas tiveram de receber assistência médica naquele que é um dos últimos redutos dos rebeldes na Síria.

Washington e Paris não têm dúvidas que ocorreu um ataque químico e responsabilizam Damasco e Moscovo pelo mesmo. Na segunda-feira, o Presidente dos Estados Unidos afirmou que anunciará “grandes decisões” sobre a Síria no prazo máximo de 48 horas.

Donald Trump condenou o alegado ataque químico do passado fim de semana e garantiu que “não podemos permitir atrocidades como estas”. O líder norte-americano disse que todas as opções estão em aberto, o que inclui uma eventual ação militar em território sírio. Aliás, em fevereiro de 2017, na sequência de um outro ataque imputado ao regime de Bashar al-Assad, Donald Trump tinha mandado bombardear uma base militar síria.

Esta terça-feira a ideia de que os Estados Unidos poderão estar a preparar-se para uma ação militar ganhou novo fôlego. A Casa Branca anunciou que Donald Trump cancelou a sua participação numa cimeira que tem início esta sexta-feira no Peru.

“A pedido do Presidente, o vice-presidente irá viajar no seu lugar. O Presidente continuará nos Estados Unidos para supervisionar a resposta americana à Síria e monitorizar os desenvolvimentos no mundo”, anunciou em comunicado a porta-voz da Casa Branca.

Uma eventual intervenção militar na Síria está a ser discutida entre os Estados Unidos e os seus aliados, nomeadamente França e o Reino Unido. A secretária britânica do Desenvolvimento Internacional admitiu que este é um tema que está em cima da mesa.

No passado mês de maio, o Presidente francês Emmanuel Macron tinha estabelecido que o uso de armas químicas seria a linha vermelha que motivaria uma "resposta imediata" por parte de Paris. Em 2013, Bashar al-Assad ultrapassou a "linha vermelha" na altura desenhada por Barack Obama mas os Estados Unidos não intervieram militarmente.
Rússia pede investigação
Perante a hipótese de uma resposta militar por parte do ocidente, a Rússia junta-se às vozes que pedem uma investigação. No entanto, não é claro ainda quais as condições propostas por Moscovo para esta investigação.

Até 2017, as Nações Unidas participavam no chamado Mecanismo de Investigação Conjunto (JIM), uma entidade que agrupava a ONU e a Organização para a Proibição das Armas Químicas (OPAQ). O JIM chegou ao fim devido ao veto de Moscovo que discordava do seu método de funcionamento.

Ainda no passado mês de janeiro decorreram negociações para que um novo instrumento conjunto de investigação fosse criado mas os membros do Conselho de Segurança não chegaram a acordo. A Rússia insistia então que o Mecanismo de Investigação Conjunto não poderia responsabilizar ninguém pelo ataque, limitando-se a entregar um relatório ao Conselho de Segurança.

O jornal The Guardian enfatiza que não é ainda claro se Moscovo pretende manter estas condições para que seja realizada uma investigação conjunta ao alegado ataque de Douma. O assunto tem sido falado entre diplomatas das Nações Unidas e estará à mesa da reunião desta terça-feira do Conselho de Segurança.

Aliás, os membros do Conselho de Segurança irão discutir e votar uma outra proposta de resolução apresentada por Washington para que seja criado um mecanismo de investigação internacional sobre o recurso a armas químicas na Síria.

O projeto prevê a criação de um novo "mecanismo de investigação independente das Nações Unidas" (UNIMI) sobre o uso de armas químicas na Síria, com um mandato inicial de um ano, renovável.

A proposta norte-americana inclui também uma condenação do regime sírio na sequência do presumível ataque químico perpetrado no sábado. A Rússia já classificou disse que esta proposta contém “elementos inaceitáveis”. Em declarações à France Presse, fonte diplomática indicou que “um veto russo é garantido”.

A Organização para a Proibição de Armas Químicas anunciou entretanto que vai enviar "em breve" uma equipa de peritos para a Síria para investigar o alegado ataque químico contra a cidade rebelde de Douma, em Ghouta Oriental.
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