Mais de 420 mil crianças estão a ser afetadas por níveis de escassez de água e seca extrema em três país da região da Amazónia, nomeadamente o Brasil, a Colômbia e o Peru, segundo novos dados da UNICEF, divulgados na quinta-feira. A seca recorde, que começou no ano passado, tem provocado mínimos históricos nos níveis dos rios e comprometido o acesso à educação, alimentos e serviços essenciais da população, particularmente das comunidades ribeirinhas e indígenas.
O novo relatório da Agência das Nações Unidas para a Infância (UNICEF) alerta para o impacto que a crise climática está a ter na vida das populações da região da Amazónia. Devido à seca extrema, os serviços essenciais estão paralisados, ameaçando a vida dessas populações, que dependem dos rios para transportarem água, alimentos, combustível, medicamentos ou para aceder a escolas e cuidados de saúde.
"A Amazónia tem sido o lar de valiosos recursos naturais", explica a diretora Executiva da UNICEF, Catherine Russel, no comunicado de imprensa. No entanto, "estamos a assistir à devastação de um
ecossistema vital do qual as famílias dependem e que está a privar
muitas crianças do acesso a alimentos e água adequados, a cuidados de
saúde e a escolas", afirma.
A escassez de chuva e o aquecimento do clima provocados pela crise climática fizeram com que os rios utilizados pela população amazónica para o transporte secassem, deixando as crianças com pouca comida e água e escassos acessos à escola e a cuidados de saúde, segundo a UNICEF.
“Esta seca, a pior do século passado, é uma demonstração clara de que as alterações climáticas, infelizmente, já cá estão e estão a ficar cada vez mais fortes”, afirma António Marro, responsável regional de Emergência da UNICEF, no comunicado, divulgado esta quinta-feira. "Os rios da Amazónia são as nossas estradas e estão a secar. Nem nós nem os nossos avós jamais vimos algo assim”, alerta.
António Marro explica que, "para as comunidades mais remotas, esta é realmente uma situação de risco de vida" e adianta que as crianças da região da Amazónia "estão a contrair dengue, malária e outras doenças graves e não
há forma de chegarem a um centro de saúde para receberem tratamento".
Só no Brasil, mais de 1.700 escolas e 760 centros de saúde foram encerrados ou tornados inacessíveis, ou mesmo fora de alcance, devido aos baixos níveis de água. De acordo com uma recente avaliação no terreno realizada pela UNICEF em catorze comunidades no sul da Amazónia brasileira, metade das famílias afirmou que os seus filhos não estavam a frequentar a escola devido à seca.
Mas a desgraça causada pela crise climática não se fica só pelo Brasil. Também na Amazónia colombiana, o nível dos rios caiu até 80 por cento, limitando o acesso a água potável e alimentos e interrompendo as aulas presenciais em mais de 130 escolas, aumentando assim o risco de exploração infantil por grupos armados devido ao encerramento das escolas, de acordo com a organização.
No Peru, a região de Loreto está a ser severamente afetada com mais de 50 centros de saúde inacessíveis e incêndios florestais agravados pela seca, provocando perdas de biodiversidade e poluição do ar.
A UNICEF estima que sejam necessários dez milhões de dólares (cerca de nove milhões de euros) nos próximos meses para conseguir dar resposta às necessidades mais urgentes das comunidades afetadas, incluindo a entrega de bens e medicamentos e o reforço dos serviços locais e públicos nas comunidades indígenas do Brasil, da Colômbia e do Peru.
A Amazónia, longe de ser "o pulmão do planeta", é um baluarte contra a crise climática, uma vez que ajuda a regular os padrões climáticos regionais e a sugar o carbono, porém está a ser transformada pelo aquecimento do clima e pela desflorestação. A perda global de floresta tropical prossegue ao ritmo de quase dez campos de futebol por minuto, de acordo com os dados mais recentes da Universidade de Maryland, nos EUA, divulgados na página do World Resources Institute (WRI).
Antecipando a Conferência das Nações Unidas sobre as Mudanças Climáticas (COP29), que começa na segunda-feira em Baku, no Azerbaijão, a UNICEF defende que as crianças devem estar no centro das negociações climáticas e pede ações urgentes aos líderes mundiais.
"A saúde da Amazónia afeta a saúde de todos no planeta" e "em todas as partes do mundo, as crianças estão a enfrentar as
consequências devastadoras das crises climáticas", afirma a diretora Executiva da UNICEF, Catherine Russell. “Estamos num momento crítico. As crianças devem estar no
centro das negociações sobre o clima”.