As mortes por infeções bacterianas podem atingir quase 40 milhões de pessoas nos próximos 25 anos. A responsabilidade deverá ser das superbactérias que se tornarão resistentes aos medicamentos destinados a tratá-las, revela um estudo agora conhecido.
A Organização Mundial da Saúde (OMS) já tinha alertado para a questão das superbactérias, a que chamou de RAM – resistência aos antibióticos.
A RAM ocorre quando microrganismos - bactérias, fungos, vírus e parasitas - sofrem alterações quando expostos a medicamentos que combatem os micróbios, como antibióticos, antifúngicos, antivirais, antimaláricos ou anti-helmínticos, por exemplo.
A OMS acrescenta que, em 2050, morrerá mais gente por ano devido a infeções resistentes a antibióticos do que por cancro.
“A resistência a antibióticos faz parte de um processo evolutivo natural. Os maiores produtores de antibióticos são as próprias bactérias. Uma bactéria capaz de atirar uma porção de antibiótico para o meio de outras, mata- as, garantindo que essas que estão a competir por espaço e nutrientes deixem o caminho livre”, argumenta a microbiologista Natalia Pasternak, presidente do Instituto Questão de Ciência e pesquisadora do Instituto de Ciências Biomédicas da USP, citada na publicação brasileira O Globo.
A partir desta base de conhecimento, o novo estudo revela que, quando se trata da prevalência da RAM e os seus efeitos, os autores “estimam que piore“.
"Ao analisar o papel da RAM nas mortes por sepsis, descrevemos uma tendência crescente e preocupante de que, quando alguém morre de sepsis, a probabilidade de o organismo causador da infeção ser resistente a medicamentos é 25 por cento maior em 2019 em relação a 1990", descreve o estudo.
Estudo aponta mais mortes para idades acima dos 50
Cerca de 520 milhões de registos individuais fizeram parte dos dados analisados neste estudo que projeta a estimativa de mais de 39 milhões de mortes até 2050.
Entre 1990 a 2021, as mortes por RAM caíram mais de 50 por cento entre crianças menores de cinco anos, mas aumentaram mais de 80 por cento entre adultos com 70 anos ou mais — tendências que os investigadores acreditam que vai continuar.
Murray afirma ter sido surpreendido com os padrões encontrados.
“Tivemos essas duas tendências opostas a acontecer: um declínio nas mortes por RAM em menores de 15 anos, principalmente devido à vacinação, programas de água e saneamento, alguns programas de tratamento e o sucesso destes”, sublinhou, citado na CNN.
No estudo declara-se que "grande parte dessa redução deve-se à prevenção de infecções, melhorias no tratamento da septicemia e reduções na mortalidade por sepsis em crianças menores de cinco anos".
“E, ao mesmo tempo, há um aumento constante no número de mortes acima dos 50 anos”, realça Murray. “À medida que o mundo envelhece, os adultos mais velhos podem ser mais suscetíveis a infeções graves”, acrescenta.Os especialistas descobriram que a combinação micróbio-medicamento que teve o maior aumento a causar a maior carga entre todas as faixas etárias foi o Staphylococcus aureus resistente à meticilina, ou MRSA.
Com recurso a ferramentas de estatística, os investigadores colocaram três premissas:
- se o clima atual continuar;
- se novos medicamentos antibióticos potentes forem desenvolvidos para combater micróbios resistentes;
- se o mundo tiver melhorado a qualidade dos cuidados de saúde para infeções e melhor acesso a antibióticos.
Se se verificarem estes pressupostos, até 2050, o número de mortes globais atribuíveis à resistência dos medicamentos pode chegar a 1,9 milhão, e aquelas associadas à resistência aos antibióticos podem chegar a 8,2 milhões. Porém, as regiões dos mundo não são abrangidas de igual modo pelas três premissas. O Sul da Ásia, a América Latina e o Caribe e a África subsaariana não têm acesso equitativo a cuidados de qualidade, descreve Murray.
“Infelizmente, ainda há muitos lugares em cenários de poucos recursos onde as pessoas que precisam de antibióticos mas simplesmente não os recebem”, refere.
Já num cenário onde a população tem melhor assistência médica, os investigadores afirmam que 92 milhões de mortes cumulativas poderiam ser evitadas entre 2025 e 2050.
Se se subir no patamar do acesso a medicamentos novos e mais potentes, estima-se que cerca de 11 milhões de mortes cumulativas poderiam ser evitadas.
Desafio para reduzir o uso de antibióticos
A abordagem “inovadora e colaborativa” desta investigação fornece uma “avaliação abrangente da resistência aos antibióticos e o seu potencial fardo no mundo”, escreveu Samuel Kariuki, do Instituto de Pesquisa Médica do Quênia.
Porém, Kariuki acredita que “estes dados devem impulsionar investimentos e ações direcionadas para enfrentar o crescente desafio da resistência aos medicamentos, em todas as regiões do planeta”.
Para Steffanie Strathdee, reitora associada de ciências da saúde global e professora emérita da Faculdade de Medicina da Universidade da Califórnia, em San Diego, o novo estudo, publicado na Lancet, abre uma janela de “esperança de que o mundo pode reduzir o fardo potencial da resistência aos antibióticos”.
Porém, Kariuki acredita que “estes dados devem impulsionar investimentos e ações direcionadas para enfrentar o crescente desafio da resistência aos medicamentos, em todas as regiões do planeta”.
Para Steffanie Strathdee, reitora associada de ciências da saúde global e professora emérita da Faculdade de Medicina da Universidade da Califórnia, em San Diego, o novo estudo, publicado na Lancet, abre uma janela de “esperança de que o mundo pode reduzir o fardo potencial da resistência aos antibióticos”.
Para isso, exige-se melhorar o acesso a antibióticos e novos medicamentos, vacinas, água limpa e outros aspetos de cuidados de saúde de qualidade em todo o mundo. Ao mesmo tempo, será preciso “reduzir o uso de antibióticos na pecuária, na produção de alimentos e no meio ambiente, o que pode gerar maior resistência”, remata Strathdee.