Relatório. Procurar a imunidade coletiva por infeção foi a maior falha de saúde pública no Reino Unido

por Carla Quirino - RTP
Londres Henry Nicholls - Reuters

As estratégias de saúde pública para conter a pandemia revelaram-se um fracasso. O documento de 150 páginas produzido por parlamentares britânicos faz o retrato da abordagem do governo perante a pandemia. Diz que foram cometidos "erros monumentais". As lentas decisões tiveram como consequência muitas mortes devido ao atraso da implementação do primeiro confinamento. Em ano e meio, morreram quase 140 mil pessoas com Covid-19.

A comissão aponta a decisão de tentar obter a imunidade coletiva ao Sars-Cov-2 como a maior falha de todos os tempos do serviço nacional de saúde do Reino Unido.

Esta opção, apoiada por cientistas, não acautelou a propagação da Covid no início da pandemia, apesar das evidencias da China e Itália, revelando-se um fracasso.

"O véu de ignorância através do qual o Reino Unido viu as primeiras semanas da pandemia foi parcialmente auto-infligido", disse o relatório.

Os parlamentares afirmaram que as tardias decisões sobre o confinamentos e recomendações sobre o distanciamento social durante as primeiras semanas da pandemia, foram desastrosas. Classificaram-nas como "uma das mais importantes falhas de saúde pública que o Reino Unido já viveu".
John Sibley - Reuters

O documento acrescenta que esta abordagem não refletiu desacordos entre ministros e assessores: "Foi uma política deliberada - proposta por assessores científicos oficiais e adotada pelos governos de todas as nações do Reino Unido. Agora está claro que essa foi uma política errada e que levou a um número inicial de mortes mais alto do que teria resultado de uma política inicial mais enfática. Numa pandemia que se espalhou rápida e exponencialmente, todas as semanas contam."

O grupo de trabalho, constituído por elementos dos vários partidos, também destaca alguns pontos positivos. Diz que o processo cientifico desencadeado até às primeiras vacinas foi "uma das iniciativas mais eficazes na história do Reino Unido".
"Coronavírus: Lições aprendidas até agora" As 150 páginas, assinadas pelas Comissões parlamentares de Saúde e Assistência Social e de Ciência e Tecnologia, analisam e retratam os fracassos e sucessos das medidas de saúde pública tomadas pelo governo, ao longo da pandemia.

Esta doença com propagação global é descrita pelos parlamentares como o "maior desafio em tempos de paz" do século.

Os conservadores Jeremy Hunt e Greg Clark, que presidem o grupo de trabalho, disseram que perante a natureza da pandemia é "impossível fazer tudo certo".

"O Reino Unido combinou algumas grandes conquistas com alguns grandes erros. É vital aprender com ambos", acrescentaram num comunicado que acompanha o relatório.

Um porta-voz do governo respondeu: "Nunca nos esquivamos de tomar medidas rápidas e decisivas para salvar vidas e proteger nosso NHS, incluindo a introdução de restrições e bloqueios”. Acrescentou que "graças a um esforço nacional coletivo, evitamos que o Serviço Nacional de Saúde (NHS) ficasse sobrecarregado."

Mas o trabalhista Jonathan Ashworth, declarou que as informações apuradas são "contundentes" e demonstram que "erros monumentais" foram cometidos.Testagem, dificuldades e vacina Em janeiro de 2020, o Reino Unido foi um dos primeiros países do mundo a desenvolver um teste para a Covid.

Mas não aproveitou esse avanço a seu favor não apostando num sistemático rastreio eficaz de testagem durante o primeiro ano da pandemia.

Os testes na comunidade pararam em março de 2020 e durante semanas, durante o primeiro pico, apenas aqueles internados no hospital foram testados.
Foi só em maio que o sistema NHS Test and Trace foi lançado em Inglaterra. O relatório classificou este início como "lento, incerto e frequentemente caótico".

A pandemia também exacerbou as desigualdades sociais, económicas e de saúde existentes que precisariam ser abordadas.

O documento destacou taxas de mortalidade "inaceitavelmente altas" em grupos étnicos minoritários e entre "pessoas com dificuldades de aprendizagem e autismo".

É sublinhada a falta de prioridade atribuída aos lares de idosos no início da pandemia.
Carl Recine - Reuters

O maior elogio do relatório é atribuído ao programa de vacinação e à forma como o governo apoiou o desenvolvimento de uma série de vacinas, incluindo a vacina Oxford-AstraZeneca.

O relatório concentrou-se predominantemente na resposta à pandemia em Inglaterra. A comissão não analisou as medidas tomadas individualmente pelo País de Gales, Irlanda do Norte e Escócia.

Os representantes das famílias que perderam parentes devido à Covid criticaram os parlamentares por não terem falado com familiares das vítimas.
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