Relatório da ONU. Mais de 81 mil mulheres e raparigas foram assassinadas em 2021

por Joana Raposo Santos - RTP
Em 2021, mais de cinco mulheres e raparigas foram mortas a cada hora por um familiar. Raquel Cunha - Reuters

Um novo relatório das Nações Unidas, divulgado esta quarta-feira, põe a nu números preocupantes sobre o femicídio a nível global. Em 2021, foram 81.100 as pessoas do sexo feminino assassinadas em todo o mundo. E, desses muitos milhares de mulheres e raparigas, mais de metade (56 por cento) foram mortas pelo marido, parceiro ou outro elemento da família.

Apesar de a maioria dos homicídios por todo o mundo serem cometidos contra homens e rapazes (81 por cento), as mulheres e raparigas são desproporcionalmente afetadas pelos assassinatos na esfera privada. Enquanto 56% dos homicídios de mulheres foram cometidos pelos parceiros ou membros da família, apenas 11% dos homicídios de homens ocorreram nessas circunstâncias.

Segundo os dados da ONU, em 2021 mais de cinco mulheres e raparigas foram mortas a cada hora por um familiar. Os departamentos das Nações Unidas para as Mulheres e para o Crime consideram estes números “elevados e alarmantes”, especialmente se for tido em conta que o número real de assassínios é, provavelmente, muito superior.

Cerca de quatro em cada dez mortes de mulheres em 2021 não foram considerados femicídios por provas insuficientes, de acordo com a ONU, que refere ainda que os números têm permanecido praticamente inalterados ao longo da última década.

No ano passado, o número mais alto de femicídios praticados por membros da família das vítimas foi registado no continente asiático, com 17.800 mortes. No entanto, segundo o relatório, é na África que as mulheres e raparigas estão em maior risco de serem assassinadas por familiares.

Nesse continente, a taxa de homicídios baseados no género em ambiente doméstico fixou-se em 2,5 por cada 100 mil pessoas do sexo feminino. Número muito superior ao do continente americano (1,4), Oceânia (1,2), Ásia (0,8) e Europa (0,6).

Ainda segundo a ONU, em 2020 a pandemia de covid-19 coincidiu com um significativo aumento dos femicídios na América do Norte e no Sul da Europa. E, em 25 países desses dois continentes, aumentou também o número de mortes provocadas por outros familiares que não os maridos ou companheiros das vítimas. Em 2021, dos 45 mil femicídios cometidos por familiares das vítimas, 17.800 acontecerem na Ásia, 17.200 na África, 7.500 na América, 2.500 na Europa e 300 na Oceânia.

“Nenhuma mulher ou criança deveria recear pela sua vida por serem quem são. Para travar todas as formas de assassinatos relacionados com o género feminino, necessitamos de contar cada vítima, em todo o lado, e compreender melhor os riscos e causas dos femicídios”, defendeu Ghada Waly, diretora executiva do gabinete da ONU para as Drogas e Crime.

Apenas assim “podemos desenvolver mais e melhores medidas de prevenção e respostas a nível de justiça criminal”, acrescentou, citada pelo Guardian.

Já Bárbara Jiménez-Santiago, advogada dos Direitos Humanos e coordenadora de uma ONG pelos direitos das mulheres, defende que as estatísticas passem a incluir também o número de mortes que resultam de outras formas de violência, como, por exemplo, casos de suicídio após uma violação.

Ativistas e especialistas defendem que a resposta ao problema do femícidio deve passar por mais legislação e políticas contra as causas da violência baseada no género, assim como pelo investimento dos Governos em serviços públicos que digam respeito a essa área.

Há, também, que ultrapassar a forte discriminação contra mulheres e raparigas em vários países do mundo, incluindo aqueles onde se pratica mutilação genital, que permitem violações dentro do casamento ou que dão a hipótese ao homem de casar com uma mulher que tenha violado para evitar cumprir pena.

“Os assassínios relacionados com género e outras formas de violência contra mulheres e raparigas não são inevitáveis. Mas podem e devem ser prevenidos, através de uma intervenção atempada e de parcerias como as que ajudaram a produzir este relatório”, lê-se no documento da ONU.
PUB