Reino Unido. Projeções apontam para maioria absoluta do Partido Trabalhista

por Graça Andrade Ramos - RTP
Os britânicos votaram dia 4 de julho de 2024 em eleições antecipadas Suzanne Plunkett - Reuters

Cerca de 46 milhões de eleitores britânicos votaram esta quinta-feira um novo Parlamento de 650 deputados e um novo Governo para os próximos cinco anos, em eleições legislativas antecipadas. Há semanas que se previa uma derrota histórica dos conservadores, com as únicas dúvidas a serem sobre a dimensão deste tombo e se o Partido Trabalhista conseguiria ou não maioria absoluta.

As sondagens à boca das urnas, desenvolvidas pela IPSOS UK junto de 133 assembleias de voto de todo o país, indicam que o Partido Trabalhista deverá eleger 410 deputados [mais 209], confirmando expectativas de maioria esmagadora.

O Partido Conservador terá eleito 131 deputados, acima dos 102 estimados, mas perdendo 241 lugares no Parlamento. A confirmar-se, será o seu pior resultado de sempre na história centenária do partido. Terá perdido em bastiões tradicionais, para a extrema direita de Nigel Farage, o campeão de Brexit. 

Em terceiro, e igualmente grandes vencedores da noite, os Liberais Democratas deverão ficar com 61 lugares, mais 53 do que há cinco anos. 

O partido de Nigel Farage, o Reform UK, elegerá por seu lado 13 deputados, num resultado surpreendente para muitos analistas, e o Partido Nacionalista Escocês apenas dez, caindo de 38. Os escoceses preferiram votar nos trabalhistas.

O Plaid Cymru, o partido independentista galês, ficará com quatro deputados e o Partido dos Verdes, dois. Os restantes 19 lugares repartem-se por um pequeno partido ou candidato independente e por partidos da Irlanda do Norte.

Os resultados definitivos de cada círculo eleitoral só deverão ser conhecidos pelas 7h00 de sexta-feira, 5 de julho, altura em que o vencedor - Keir Starmer, o líder trabalhista - deverá ser então confirmado como primeiro-ministro pelo rei Carlos III, no próprio dia, e convidado a formar governo.

O antigo procurador-geral é considerado o grande responsável pela revitalização do Partido Trabalhista, que há apenas cinco anos foi castigado severamente pelos britânicos nas urnas.

Primeiras reações
Starmer recorreu à rede social X para agradecer aos apoiantes e a confiança de quem votou trabalhista. "Muito obrigado", escreveu.


A estrondosa vitória de Starmer, com vantagem de 170 deputados, não superou contudo a registada por Tony Blair em 1997, quando o ex-líder britânico obteve 418 lugares e uma vantagem de 178.

Também o ainda primeiro-ministro, Rishi Sunak, publicou na mesma rede um agradecimento aos apoiantes, momentos antes do anúncio das projeções.


As projeções admitem ainda que Sunak poderá não ser reeleito enquanto deputado, abrindo caminho à sua substituição na liderança do Partido Conservador.

Já o líder dos Liberais Democratas reagiu imediatamente após a publicação das sondagens, assumindo sentir-se "humilde" perante os resultados.

Sir Ed Davey afirmou aos eleitores que "não vos iremos desiludir". "Os Liberais Democratas estão a caminho dos nossos melhores resultados num século".


"Sinto-me humilde perante os milhões de pessoas que ajudaram os Liberais Democratas tanto a afastar os conservadores do poder como a conseguir a mudança de que o nosso país necessita", acrescentou.

Nicola Sturgeon, a ex-primeira-ministra escocesa, reagiu às projeções, considerando que "esta não é uma boa noite para o SNP, com estes números".

"Este é um fim amargo para as espectativas [nacionalistas} do SNP, caso se confirmem estas projeções", acrescentou. "Starmer vai sentir o peso da responsabilidade", vaticinou ainda Sturgeon.
Outras contas
As primeiras análises indicam que os conservadores foram especialmente castigados nos locais onde mais de um terço das casas estão hipotecadas.

O desempenho dos trabalhistas é por seu lado  mais favorável nos círculos onde uma grande parte da população afirma ter problemas de saúde e onde mais eleitores votaram a favor do Brexit em 2016.

O Partido Trabalhista deverá ter ainda bons resultados na Escócia mas menos importantes no País de Gales, onde está no poder. Um partido necessita de pelo menos 326 deputados para formar um governo maioritário.

Em análise nas próximas horas irá estar também o impacto do voto útil, promovido na rede social X pelos apoiantes dos liberais e dos trabalhistas, sob a hashtag #votetactically, para vencer os tories, como são conhecidos os conservadores.

Uma vez que no Reino Unido os círculos eleitorais são uninominais, implicando que só é eleito o candidato mais votado, o objetivo da iniciativa foi convidar ao voto no candidato mais bem posicionado para afastar o candidato tory, independentemente da própria preferência política do eleitor. 

Responsáveis conservadores denunciaram este "pacto secreto" entre liberais e trabalhistas.

Alegações dos conservadores quanto a uma afluência às urnas superior à de 2019, por parte dos seus simpatizantes, foram relativizadas pela Associação de Administradores Eleitorais, que ao fim da tarde referia níveis gerais de participação semelhantes aos de há cinco anos, quando aquela se cifrou em 67.3 por cento. 

Resta saber se os  trabalhistas, confiantes na vitória, se abstiveram, contribuindo para uma derrota conservadora menos grave do que a esperada.

A distribuição dos 650 lugares parlamentares pelos principais partidos irá refletir um novo cenário partidário, em que os conservadores e o Partido Nacionalista Escocês serão os únicos derrotados.

Os resultados definitivos desta eleição poderão contudo demorar vários dias a serem publicados se houver candidatos a contestar a eleição no seu círculo, algo que se afigura provável, não só em caso de vitória escassa de um conservador mas igualmente devido ao caos registado com o voto postal em mais de cem círculos eleitorais.
O futuro que os espera
Estas hipóteses não deverão mitigar a derrota do Partido Conservador, cuja queda foi histórica mesmo se não atingiu os níveis previstos nas sondagens de campanha que lhe davam cerca de 100 deputados. Há cinco anos, com Boris Johnson, tinham eleito 344.

Esta quinta-feira, os apelos ao voto dos próprios líderes, incluindo o primeiro-ministro Rishi Sunak, limitaram-se a pedir que a maioria Trabalhista não ficasse com um "poder incontestável".

Com o fim inevitável do ciclo conservador, após 14 anos no poder, cinco primeiro-ministros e vários escândalos, o debate que se segue é o da sucessão no partido. A guerra interna deverá ter começado mal foram publicadas as sondagens à boca das urnas.

A crise contudo poderá ser pela sobrevivência. Metade dos eleitores britânicos querem que os conservadores desapareçam da cena política, pelo menos desta vez. Os analistas admitem que a recuperação é apesar de tudo possível, em 2029 ou em 2034.

Para os trabalhistas e para Starmer, o futuro imediato será de festa, mas os próximos meses não se afiguram fáceis. Os britânicos querem recuperar o seu poder de compra, que tem estado em queda vertiginosa, ver revertida a degradação do serviço de saúde pública e resolvida a imigração incontrolada.

A votação presencial desta quinta-feira decorreu de forma serena em todo o país, com o bom tempo a ajudar a sul e alguma chuva a não desanimar os eleitores a norte. Os líderes dos partidos votaram durante a manhã.

Pela primeira vez, os eleitores de Inglaterra, Escócia e País de Gales, tiveram de apresentar um documento de identificação para poderem votar numas eleições legislativas.

Estas foram também as primeiras eleições legislativas em julho no Reino Unido desde 1945 e as primeiras desde a consumação do Brexit.
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