Crianças não-acompanhadas que chegam ao Reino Unido em pequenas embarcações, através do Canal da Mancha, têm sido alojadas em estabelecimentos prisionais, de acordo com a Human for Rights Network, avança o jornal britânico The Guardian.
Cada vez mais crianças vulneráveis que chegam ao país, em pequenas embarcações e sem acompanhamento, estão a ser colocadas numa prisão para adultos, onde estão maioritariamente detidos estrangeiros e um número significativo de criminosos sexuais, constata o grupo de defesa de Direitos Humanos.
A maioria dos menores não-acompanhados é de origem sudanesa ou sul-sudanesa que chegaram ao Reino Unido, através da Líbia, depois de terem sido vítimas de tráfico ou alguma forma de exploração na maior parte dos casos, segundo o The Guardian.
O grupo de defesa de Direitos Humanos apelou este fim de semana para que o Ministério britânico do Interior abrisse uma investigação sobre o assunto e libertasse imediatamente qualquer criança que esteja alojada numa prisão para adultos no Reino Unido.
Sabe-se, de acordo com a última inspeção de Elmley, que apesar de a prisão "já não estar designada para manter condenados por crimes sexuais", ainda lá continuam 70 prisioneiros. Recentemente foram tornados públicos pormenores sobre um pedófilo detido em Elmey, depois de ter sido condenado por 14 crimes sexuais e considerado culpado de abusar de duas crianças.
"Estas crianças estão fechadas nas suas celas, sem saber a quem pedir ajuda, impedidas de aceder adequadamente a aconselhamento jurídico e de contestar a decisão arbitrária tomada sobre a sua idade pelos funcionários dos serviços de imigração à chegada ao Reino Unido”, denunciou Maddie Harris, da Human for Rights Network.
"Profundamente prejudicadas"
As crianças que foram enviadas para prisões de adultos são as mais “profundamente prejudicadas”, de acordo com a porta-voz do grupo humanitário que já trabalha com mais de mil crianças em conflito de idade.
“São crianças que procuram segurança e que, em vez disso, se encontram numa prisão de adultos, sem essa proteção e expostas a grandes danos", acrescentou.
Estão detidas porque foram acusadas de delitos de imigração ao abrigo da Lei da Nacionalidade e das Fronteiras, que entrou em vigor no ano passado e que introduziu delitos mais severos com o objetivo de dissuadir a entrada ilegal no Reino Unido.
"É errado criminalizar estas crianças e perigoso enviá-las para prisões de homens adultos", afirmou Anita Hurrell, responsável pelo projeto de apoio a crianças migrantes na instituição de caridade Coram.
"Sistema de asilo falhado"
Os advogados têm vindo a alertar para o aumento do número de casos nos tribunais britânicos cujo desfecho é a colocação de crianças – menores de 18 anos – em estabelecimentos prisionais. O Reino Unido tem enfrentado grandes desafios na gestão da imigração ilegal no país: o número de pedidos de asilo em atraso aumentou exponencialmente para mais de 175 mil, o que representa mais 44% do que no ano passado, e as despesas do Governo duplicaram.
Agora, depois de outras medidas polémicas levadas a cabo pelo Governo britânico, a detenção de menores é considerada, pelos críticos, como a mais recente faceta de um sistema de asilo falhado.
Uma vez que a detenção de centenas de menores requerentes de asilo se prende com o facto de o Ministério britânico do Interior os considerar adultos, de acordo com informações obtidas pelo semanário The Observer, estes estão a ser erradamente tratados.
A idade como barreira deliberada"A avaliação da idade transformou-se no mais monstruoso dos dispositivos processuais", afirmou Syd Bolton, codiretor da Equal Justice For Migrant Children.
A maioria das crianças que foram enviadas para a prisão HMP Elmley, em Kent, foram declaradas adultas pelo Ministério do Interior, com base numa avaliação que os especialistas consideram “superficial e arbitrária”, efetuada pelos funcionários poucas horas depois de terem chegado ao país.
Muitas das decisões do Ministério do Interior já foram anuladas, depois de as autoridades locais ou de especialistas independentes terem avançado com avaliações pormenorizadas.
Mais de metade dos requerentes de asilo não acompanhados, que são submetidos a avaliações de idade pelo Ministério britânico do Interior quando chegam ao país, é mais tarde confirmada como sendo menores de idade.
Esta prática é uma "barreira deliberada ao acesso à proteção de asilo e à negação do acesso dos jovens requerentes de asilo aos serviços para crianças. É um instrumento importante do Ministério do Interior para desacreditar um pedido de asilo", segundo Syd Bolton, da Equal Justice For Migrant ChildrenDe acordo com um porta-voz do Governo britânico "a avaliação da idade é um processo difícil mas vital para identificar crianças genuínas e impedir o abuso do sistema. Temos de evitar que os adultos se apresentem como crianças ou que as crianças sejam indevidamente tratadas como adultos - ambos os casos representam sérios riscos de proteção".
Acrescentando que, “para proteger ainda mais as crianças, estamos a reforçar o processo de verificação da idade, recorrendo a medidas científicas como os raios X." A errada classificação das crianças como adultos não lhes oferece a proteção necessária e deixa-as expostas a vários perigos. De acordo com a última inspeção da prisão de Elmley, um em cada quatro reclusos afirmou sentir-se inseguro na prisão.
"As crianças são sempre profundamente afetadas pelo tempo que passaram na prisão no Reino Unido, exprimindo claramente que não conseguem dormir, que não compreendem por que razão foram detidas e que têm dificuldade em falar do tempo que lá passaram", explica Maddie Harris, da Human for Rights Network.
De acordo com Anita Hurrel, da Coram, "Deve ficar claro que nenhum adulto ou criança deve ser criminalizado por chegar ao Reino Unido para pedir asilo, um crime que viola claramente a convenção sobre refugiados".Muitas crianças não acompanhadas continuam a ser colocadas em prisões de adultos, apesar de uma recente decisão judicial referida por Hurrel, segundo a qual os menores não acompanhados deveriam ser acolhidos e “mantidos em segurança” pelos municípios.
c/The Guardian
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