Irakli Khobadidzé, o primeiro-ministro da Geórgia, afirmou esta segunda-feira que "não haverá negociações" com a oposição, quando os protestos de rua entraram no quinto dia consecutivo.
Esta segunda-feira, num esforço para acalmar os ânimos, o primeiro-ministro garantiu que o seu Governo fará "o máximo de esforços" para integrar o país na União Europeia, rejeitando contudo o que chamou uma "chantagem vergonhosa e ofensiva" que denunciou como "obstáculo significativo à nossa integração europeia". A integração na UE é um objetivo inscrito na Constituição desta ex-República soviética, no Cáucaso, a que o Governo não pode fugir. Em dezembro de 2023, a Geórgia obteve oficialmente o estatuto de candidata à adesão, mas Bruxelas congelou depois o processo, acusando o executivo georgiano de graves recuos democráticos.
O Governo do partido Sonho Georgiano, no poder desde 2012 e vencedor das eleições de 26 de outubro com 53 por cento dos votos, num escrutínio alegadamente desvirtuado, é acusado pela oposição de deriva autoritária prorrussa e anti europeia.
Quarta-feira passada, o executivo anunciou a suspensão por quatro anos do processo de adesão à UE, dando origem aos protestos.
Na intervenção desta segunda-feira, Khobadidzé voltou a denunciar uma alegada intervenção externa na crise. O primeiro-ministro afirmou que as manifestações estão a ser financiadas "a partir do estrangeiro".
Seja como for, "não haverá revolução na Geórgia", advertiu.
Mas os sinais sociais contradizem-no.
Protestos alastram
Foram desencadeadas hoje várias greves, em solidariedade com as manifestações, afetando escolas, instituições públicas e empresas, reportaram os media. "Um ato simbólico de resistência", explicou um professor envolvido na iniciativa.
A presidente Salomé Zourabichvili, que detém poderes limitados mas que alimenta o braço de ferro entre o executivo e os protestos, afirmou de manhã que a mobilização não abrandou, comentando o bloqueio, domingo, dos acessos ao maior porto da Geórgia no Mar Negro, e mais uma noite de confrontos na noite anterior.
"Mais uma noite impressionante durante a qual os georgianos defenderam firmemente a sua Constituição e a sua escolha europeia", escreveu Zourabichvili na rede social X. Khobadidzé rejeitou, domingo, a exigência de repetição das eleições legislativas de outubro, como exigiam Salomé Zourabichvili e a oposição. Hoje, afirmou que "não haverã negociações", num recado aos manifestantes.
Desde quinta-feira foram interpeladas 224 pessoas, de acordo com números oficiais. Um dos líderes da oposição terá sido detido.
Desde o início dos protestos, que não se têm confinado às ruas da capital e que alastraram a diversas cidades georgianas, ficaram feridas mais de 100 pessoas, entre manifestantes, jornalistas e duas dezenas de polícias.
As forças de segurança têm enfrentado a multidão com granadas de gás lacrimogénio e canhões de água. Muitos dos feridos apresentam graves dificuldades oculares e respiratórias após serem atingidos e correm rumores de que a polícia estará a utilizar agentes químicos proibidos para neutralizar os manifestantes.
Estes apontam o dedo à violência usada pelas forças da ordem. "Eles estão enervados, espancam-nos, molham-nos", mas "estamos-nos nas tintas", declarou uma manifestante, de 18 anos, à Agência France Press.
Kremlin faz ameaças veladas
Enquanto a presidente da Comissão Europeia, Ursula von der Leyen, e Berlim anunciaram que as portas da UE se mantêm "abertas", as três nações do Báltico, a Lituânia, a Letónia e a Estónia, anunciaram nas últimas horas sanções contra personalidades georgianas que acusam de ter violado os direitos humanos durante os protestos.
Os georgianos não se limitam a defender a via europeia, entoam igualmente palavras de ordem contra Moscovo. O trauma sofrido com a invasão russa de 2008, após um movimento pró-democracia e no decurso de uma guerra muito breve, mantem-se na memória de muitos.
A ameaça de uma repetição, na senda do sucedido na Ucrânia em 2022, já foi equacionada pelo Kremlin. O ex-presidente, Dmitri Medvedev, avisou contra uma "tentativa de revolução" que, tal como na Ucrânia, "pode acabar mal".
Em maio de 2024, um controverso projeto de lei sobre "agentes estrangeiros", decalcado da legislação russa, foi apoiado por 84 deputados contra 30, desafiando as manifestações que levaram centenas de milhares de pessoas às ruas de Tbilissi e levando a advertências por parte de Washington contra uma "deriva russa".
Um projeto-lei semelhante havia sido chumbado em março de 2023.