Químicos persistentes usam vida marinha para chegar aos locais mais remotos

por RTP
Reuters

Um novo tipo de químicos resistentes está a afetar ecossistemas e milhões de pessoas em todo o mundo. Químicos criados pelo ser humano que não se degradam no meio ambiente, resistindo e viajando pelos sítios mais remotos.

Um dos exemplos mais demonstrativos vem das Ilhas Faroé, onde um estudo de 2005 encontrou níveis preocupantes de químicos no leite materno de várias mulheres do arquipélago. Muitos destes químicos já tinham sido encontrados noutros países, o que levantou uma questão: como estavam a chegar a pontos remotos do globo.

No caso das mulheres das Ilhas Faroé, os químicos chegaram através de baleias, que fazem parte da dieta dos locais. Estes químicos são conhecidos como bifenilpoliclorado (ou PCB, na sigla em inglês) e fazem de um grupo ainda mais vasto chamados poluentes orgânicos persistentes.

Criados pelo homem, têm viajado pelos oceanos, não se degradam no meio-ambiente e afetam até as comunidades mais remotas. Estes componentes chegam ao mar e através dos animais fazem grandes distâncias, sendo aumentadas quando passam de presa para predador, alcançando níveis maiores em animais também maiores.

É por isso que muitos especialistas avisam que não será boa ideia consumir carne de predadores marinhos maiores, caso da baleia ou do atum, sendo muito mais benéfico comer sardinhas ou anchovas.

Nos Inuit, tribo que vive no Canadá Ártico, também foram encontrados níveis preocupantes destes químicos, sabendo-se que a dieta desta comunidade consiste na caça de vários peixes e mamíferos marinhos como a morsa e o narval.

Dois exemplos que mostram o efeito a grande dimensão em pessoas, vida selvagem, cadeias alimentares e ecossistemas.

O bifenilpoliclorado foi criado nos anos 20 do século passado e foi desenvolvido para ser usado em fluídos frios e retardantes de chamas em máquinas, eletrodomésticos, tintas e outros materiais de construção. Estes químicos mostraram-se resistentes ao calor e são estáveis, tendo vários usos.

No entanto, vários anos depois da sua criação, a estabilidade mostrou que estes eram componentes que não se degradavam facilmente e que permaneciam no ambiente por muito tempo. Nos anos 70 registou um declínio no uso, quando começaram a ser registados problemas de saúde (fertilidade, problemas de desenvolvimento neurológico ou QI reduzido em crianças) e vários países baniram o seu uso.

Hoje, estes químicos são encontrados em aterros sanitários, selados ao público, em equipamento elétrico velho e edifícios pré-fabricados antes dos anos 80. Mas, neste momento, a maior fonte destes químicos é a comida que compramos todos os dias.

Em 2004, muitos destes químicos foram banidos num tratado assinado Estocolmo. E muitos outros, ao longo dos anos, foram adicionados à lista. Mais de 185 países já assinaram o tratado, prometendo implementar mais medidas. Mesmo assim, a poluição continua.

Para além de banidos, muitos outros componentes estão a ser eliminados. O tratado de Estocolmo quer o bifenilpoliclorado eliminado de equipamentos até 2025 e todos os componentes eliminados até 2028. No entanto, o documento não está a ter o efeito que se previa. Apenas 17 por cento do total destes componentes foi eliminado, com 83 por cento ainda por eliminar.

A incineração é o método mais eficaz, ou seja, incineração a altas temperaturas, um processo de grande logística e muito caro. No entanto, caso não haja eliminação efetiva destes químicos, estes irão parar ao meio ambiente.

Apesar de ainda não haver registos graves de bifenilpolicloredo nos oceanos, acredita-se que a destruição de edifícios e materiais levarão a maiores quantidades dos químicos a chegar aos mares.

As alterações climáticas também têm um papel importante neste processo, já que aceleram o movimento destes químicos em todo o planeta. Com mais calor, os poluentes orgânicos persistentes vão evaporar-se mais facilmente para a atmosfera.

E as más notícias continuam. Para além do bifenilpoliclorado (os PCB), um outro grupo de químicos usados em várias indústrias nos dias de hoje, os PFA, ou fluorosurfactante, conhecidos como os “químicos de sempre”, podem ser os novos PCB a perpetuar-se da mesma maneira pelo planeta.

O fluorosurfactante faz com que produtos se tornem à prova de água e resistentes a nódoas. A sua composição de ligações carbono-fluor significa que não se degrada no meio ambiente e que se acumula nos solos e lençóis freáticos, afetando a saúde humana.
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