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"Queremos ouvir o povo da Catalunha". Puigdemont volta a Barcelona e desaparece após discurso

por Cristina Sambado - RTP
"Há sete anos que nos perseguem por querermos ouvir a voz do povo da Catalunha" Alberto Estevez - EPA

O rosto do independentismo e antigo presidente do governo autonómico catalão Carles Puigdemont regressou esta quinta-feira a Barcelona, ao cabo de quase sete anos a viver no estrangeiro para fugir à justiça do país. Arriscou assim a detenção. "Há sete anos que nos perseguem por querermos ouvir a voz do povo da Catalunha", clamou, antes de voltar a rumar a parte incerta.

"Há sete anos que nos perseguem por querermos ouvir a voz do povo da Catalunha. Há anos que começou uma repressão muito dura", afirmou esta manhã Puigdemont perante uma concentração de centenas de pessoas convocada pelo partido a que pertence, o Juntos pela Catalunha.

"Transformaram o facto de sermos catalães em algo suspeito", prosseguiu.
Para o independentista catalão, "Apesar dos esforços, que nos quiseram prejudicar muito, hoje vim aqui para vos recordar que continuamos aqui porque não temos o direito de renunciar".

"O direito à autodeterminação pertence ao povo, é um direito coletivo. Não nos deixemos confundir, a realização de um referendo não é nem nunca será um crime. Há sete anos, 2,3 milhões de pessoas votaram", acentuou. Durante o seu discurso, Carles Puigdemont gritou "Viva la Catalunya libre!" [Viva a Catalunha livre] enquanto subia a um palco montado em frente a um arco triunfal, sob os aplausos de "presidente, presidente!" da multidão.

Segundo Carles Puigdemont a vitória do referendo de 2017 resultou numa "repressão feroz": "Não nos interessa estar num país onde as leis de amnistia não amnistiam".

Puigdemont reapareceu em Barcelona perante uma multidão. Os Mossos d'Esquadra foram destacados às 6h00 desta quinta-feira para o Parlamento da Catalunha, no âmbito do dispositivo para blindar o acesso ao hemiciclo para a investidura de Salvador Illa como presidente da Generalitat, com o apoio esperado da ERC e do Comuns, com os quais os socialistas atingiriam 68 deputados, apenas a maioria.

"Vim hoje para vos lembrar que ainda estamos aqui", afirmou, em catalão, perante milhares de apoiantes.

Eleito deputado nas eleições catalãs de 12 de maio, Puigdemont anunciou na quarta-feira que pretendia estar na sessão parlamentar convocada para votar a investidura do socialista Salvador Illa como presidente do governo autonómico catalão.

Puigdemont, que protagonizou a declaração unilateral de independência da Catalunha de outubro de 2017, continua a ser alvo de um mandado de detenção em território espanhol e admitiu, num vídeo que divulgou nas redes sociais, que arrisca ser detido com este regresso a Espanha.

Barcelona preparou-se para o esperado regresso do ex-líder separatista catalão do exílio autoimposto.

Na quarta-feira, Puigdemont anunciou que tinha começado a sua "viagem de regresso do exílio", dizendo que continuava empenhado em participar na sessão de quinta-feira do Parlamento catalão para jurar o novo líder da região após as eleições de maio, em que o partido de Puigdemont ficou em segundo lugar.


"O facto de, para o fazer, me arriscar a uma detenção arbitrária e ilegal é a prova da anomalia democrática que temos o dever de denunciar e combater", afirmou num vídeo publicado nas redes sociais.

O político, de 61 anos, fugiu para a Bélgica há sete anos, depois de uma tentativa de secessão falhada, e tem vivido no exílio desde então. Agora, é provável que seja detido devido a um mandado de prisão pendente por alegado desvio de fundos, o que ele nega.
Parlamento inicia investidura sem Puigdemont
O Parlamento catalão iniciou entretanto o plenário de investidura do novo governo autonómico, como previsto, mas desconhecendo-se onde se encontra o deputado independentista Carles Puigdemont.Puigdemont falou durante alguns minutos aos apoiantes que estavam numa praça nas imediações do parlamento catalão, desceu depois do palco instalado no local e caminhou a seguir alguns metros, rodeado por dirigentes do seu partido e centenas de outras pessoas, que levavam cartazes e bandeiras independentistas.


Eleito deputado nas eleições catalãs de 12 de maio, Puigdemont parecia dirigir-se para a entrada do Parque da Cidadela, onde está localizado o edifício do parlamento catalão, onde às 10h00 locais (09h00 em Lisboa) arrancou a sessão de investidura do socialista Salvador Illa como novo presidente do governo regional (conhecido como Generalitat).

O acesso ao parlamento foi blindado e controlado por uma barreira policial desde a madrugada, mas Puigdemont não chegou a este local, onde poderia ser detido.
Ana Romeu, correspondente da RTP em Espanha

O dirigente separatista desapareceu, aparentemente, entre a multidão de apoiantes.
A polémica lei da amnistia
O Parlamento espanhol aprovou uma lei de amnistia em maio, perdoando os envolvidos na tentativa falhada de secessão de 2017, mas o Supremo Tribunal manteve os mandados de prisão para Puigdemont e dois outros que também foram acusados de desvio de fundos, decidindo que a lei de amnistia não se aplica a eles.

Muito criticada pela oposição, a lei de amnistia está no centro de numerosos debates jurídicos e, a 1 de julho, o Supremo Tribunal decidiu que só se aplicava a alguns dos delitos de que é acusado o líder independentista, que voltou a denunciar na quarta-feira "a atitude rebelde de alguns juízes do Supremo Tribunal". Carles Puigdemont continua a ser alvo de um mandado de captura, apesar da lei de amnistia negociada por Pedro Sánchez em troca do apoio de Junts ao seu governo, e poderá ser preso.
 
As consequências do regresso de Carles Puigdemont - que o partido de extrema-direita Vox, qualificando-o de "golpista", prometeu esperar "à porta do Parlamento" - ainda não são claras, mas poderão alterar o processo de investidura de Salvador Illa, nomeadamente se este for detido e colocado em prisão preventiva.

O secretário-geral de Junts per Catalunya, Jordi Turull, anunciou que, nesse caso, pediria a suspensão da sessão de investidura.

Longe destas considerações, Salvador Illa concentrou a sua atenção, nos últimos dias, na defesa do acordo que deverá fazer dele o primeiro presidente do executivo catalão que não provém das fileiras de um partido nacionalista, desde 2010.

O acordo, assinado com a ERC e um pequeno partido de extrema-esquerda, já está a ser alvo de fortes críticas.

Para obter o apoio da ERC, os socialistas tiveram de fazer uma promessa há muito esperada pelo movimento pró-independência: o controlo total dos impostos cobrados na região, à semelhança do que já acontece no País Basco.

A medida, que ainda tem de ser aprovada pelo Parlamento de Madrid, já está na mira da oposição, mas também de algumas figuras do Partido Socialista, como Alfonso Guerra, antigo braço direito de Felipe Gonzalez, que denunciou um "caminho para um sistema federal e para a independência da Catalunha".

"Não sei quantos golpes de Estado já tivemos, quantas vezes destruímos Espanha", ironizou Pedro Sánchez. "Mas hoje, a Espanha e a Catalunha estão mais fortes e mais unidas", vangloriou-se.

c/ agências
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