Ismail Haniyeh, o líder político do movimento palestiniano Hamas, morreu na madrugada desta quarta-feira na sequência de um ataque, em Teerão, atribuído a Israel. O antigo primeiro-ministro palestiniano tinha 62 anos e vivia exilado, há vários anos, no Catar. É amplo o coro de vozes que já condenou a morte Haniyeh, considerado um dos mais moderados, aumentando os receios que o assassinato do chefe do gabinete político do Hamas possa fazer alastrar o conflito no Médio Oriente.
Haniyeh foi ativista estudantil na Universidade Islâmica de Gaza e começou a carreira política alinhando-se estreitamente com o fundador do Hamas, o sheikh Ahmed Yassin. Juntou-se ao grupo paramilitar durante a Primeira Intifada e foi preso durante três anos, em 1989, quando Israel reprimiu a primeira revolta palestiniana. Libertado em 1992, foi exilado numa região isolada entre Israel e o Líbano, juntamente com outros líderes do Hamas.
Foi detido várias vezes por participar na Primeira Intifada em Israel antes de deixar definitivamente Gaza, tornando-se um importante líder do Hamas durante os anos de atividade. Considerado um chefe pragmático e moderado, Haniyeh viveu no exílio dividindo o tempo entre a Turquia e o Catar.Já em 2004, foi nomeado membro da secreta equipa de “liderança coletiva”, depois de o xeque Ahmed Yassin e Abdel Aziz Rantisi, os dois anteriores líderes do Hamas, terem sido mortos por Israel.
Era então uma figura já bem conhecida e foi eleito primeiro-ministro palestiniano em 2006, após uma vitória surpreendente do Hamas nas eleições parlamentares, tendo conquistado mais visibilidade e atenção internacional desde então.
Onze anos depois, sucedeu a Khalid Mashael como chefe político do Hamas e, logo depois, foi declarado terrorista procurado pelos Estados Unidos. Na altura, a Administração norte-americana de Donald Trump pretendia cortar o acesso deste a recursos financeiros internacionais.
Muçulmano sunita, Haniyeh teve um papel importante na construção da capacidade de combate do Hamas, em parte cultivando laços com o Irão xiita, que não esconde o apoio ao grupo. Durante a década em que Haniyeh foi o principal líder do Hamas em Gaza, Israel acusou o grupo de ajudar a desviar ajuda humanitária para a ala militar do movimento paramilitar.
Apesar da retórica mais dura em público, Haniyeh era visto por muitos diplomatas como um moderado em comparação com os membros mais radicais do grupo apoiado pelo Irão dentro de Gaza.
Mediações para cessar-fogo em Gaza
E quando escalou o conflito no Médio Oriente, com o ataque de combatentes do Hamas em território israelita a 7 de outubro do ano passado, Ismail Haniyeh destacou-se como negociador do Hamas e desempenhou um papel fundamental nas negociações internacionais.
Apesar de ter mantido boas relações com os líderes de várias fações palestinianas, incluindo rivais do Hamas, Haniyeh enfrentou críticas internas dentro do grupo paramilitar. Nos últimos meses, viajou em missões diplomáticas para o Irão e para a Turquia, encontrando-se com os presidentes turco e iraniano. As autoridades israelitas responsabilizaram-no várias vezes pelo fracasso das negociações de paz e pela libertação de reféns, no conflito israelo-palestiniano.
A liderança de Haniyeh foi, além disso, posta em causa por alguns membros do Hamas, que criticaram a falta de ligação entre as suas ações e a realidade no terreno na guerra entre Israel e o Hamas.
A notícia da morte de Ismail Haniyeh surge após o Estado hebraico ter confirmado que as suas forças mataram o chefe militar do Hezbollah Fuad Shukr, um dos elementos mais próximos líder do movimento xiita libanês, Hassan Nasrallah. Esta não foi a primeira vez que a residência do líder do Hamas foi alvo de ataque.
Desde o início do conflito no Médio Oriente, Ismail Haniyeh e a sua família foram várias vezes alvos. Em abril deste ano, a polícia israelita deteve uma das suas irmãs por suspeita de ter ligações com membros do movimento paramilitar. No mesmo mês, três dos filhos e quatro netos de Haniyeh foram mortos em ataques aéreos.
Na altura, o Exército de Israel alegou que os filhos em “militares do Hamas” e que, por isso, foram “eliminados”. Em reação, o chefe político do Hamas relatou à imprensa que soube do ataque que os vitimou enquanto visitava palestinianos feridos que tinham sido transferidos para o Catar.
Agradecendo pela “honra que me foi concedida pelo martírio dos meus filhos e netos”, Haniyeh garantiu que isso não afetava o posicionamento do Hamas nas negociações com Israel sobre um cessar-fogo em Gaza.
“O inimigo tem ilusões se pensa que atacar os meus filhos, no auge das negociações e antes de enviarmos a resposta, levará o Hamas a mudar o seu posicionamento”, disse, na altura, à Al Jazeera. “O sangue dos meus filhos não é mais valioso do que o sangue do nosso povo”.No passado mês de maio, o procurador-geral do Tribunal Penal Internacional decretou a sua detenção por crimes de guerra cometidos durante o conflito.
Ismail Haniyeh, que vivia no Catar, estava no Irão para assistir à tomada de posse do novo presidente e ia encontrar-se com o líder da República Islâmica do Irão, quando foi morto na noite de terça-feira.
Segundo alguns especialistas, a morte de Haniyeh pode ser um golpe significativo no Hamas numa altura em que as tensões estão a aumentar no Médio Oriente, crescendo os receios sobre o futuro das negociações entre Israel e o Hamas.