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Portugal na zona de queda dos restos do foguetão chinês

por Nuno Patrício - RTP
Foto: Reuters

Continuam as preocupações sobre onde vai cair o que sobrar do primeiro estágio do foguete de Longa Marcha chinês que foi lançado a 29 de abril. A reentrada deste enorme e pesado pedaço de foguetena atmosfera deve dar-se até 9 de maio. E Portugal é um dos locais onde estes detritos espaciais podem cair.

Com cerca de 20 toneladas esta parte do foguete chinês Longa Marcha CZ-5B é um dos maiores pedaços de detrito espacial a cair na Terra.

Este segmento fazia parte do corpo principal do foguete chinês e serviu para lançar o primeiro módulo da nova estação espacial da China.

Uma reentrada não controlada
Todos os dias reentram na atmosfera terrestre pequenos pedaços de lixo espacial. Material que tem ficado em órbita terrestre desde o início da exploração do espaço. Mas se os pequenos pedaços, ao caírem, provocam fricção na atmosfera terrestre e acabam por ser incinerados e/ou desintegrados, os maiores podem conseguir ultrapassar essa barreira natural e chegar cá abaixo.

No caso do primeiro estágio chinês a questão complica-se, pois trata-se de um componente com mais de 30 metros de comprimento, cinco de largura e com depósitos de combustível com revestimentos reforçados. E e precisamente estes enormes depósitos que podem cair em zonas habitáveis e provocar estragos significativos.

Uma questão delicada e que está a ser monitorizada por vários organismos ligados à segurança aeronáutica e defesa.

Ao início desta sexta-feira os restos dos estágio principal chinês encontrava-se a cerca de 180 quilómetros de altitude, a viajar a uma velocidade de mais de 28 mil quilómetros hora.

Créditos: Orbit.ing-now

"Temos esperança de que vá cair num lugar onde não fará mal a ninguém", comentou o secretário de Defesa dos Estados Unidos, Lloyd Austin. "Esperançosamente no oceano, ou num lugar assim."

Por ser uma reentrada não controlada, oposta à utilizada pela SpaceX nos primeiros estágios dos foguetes Falcon 9, é imprevisível saber quando e onde este “monstro de ferro” vai cair.

Contudo sabe-se a órbita que ocupa e a que altitude se encontra.

A zona assinalada a azul é a região onde orbita o CZ-5B, bem como a zona onde poderá cair | Infografia: Sara Piteira - RTP

Os vários especialistas que estão a seguir o trajeto do CZ-5B apontam para a queda deste detrito espacial entre as primeiras a duas da manha deste sábado e as 20h00 de segunda-feira (hora de Lisboa). No entanto, tais projeções são sempre altamente incertas.
Reincidência chinesa
Esta não é a primeira vez que a China lança este tipo de foguete. Algo idêntico gerou críticas quando em maio de 2020, data da estreia do modelo em causa (CZ-5B), foi lançado e também este colocou o impulsionador central numa órbita descontrolada e que posteriormente reentrou na Terra.

Os destroços acabaram por cair em zonas habitáveis na região da Costa do Marfim. Felizmente, não houve relatos de feridos ou mortes causadas pelos impactos.

Créditos: China-underground.com/DR

Mas este problema não está restrito à China e não é tão invulgar que restos e peças de foguetes falhem ao regressar à Terra.

Créditos: Direitos Reservados

Exemplo disso mesmo aconteceu com o segundo estágio do Falcon 9, da SpaceX, em que após falha nos sistemas fez uma reentrada descontrolada, tendo parte do veículo (tanque de pressão) caido numa fazenda no estado de Washington.

Créditos: Direitos Reservados

Contudo a preocupação com o CZ-5B é maior porque o tamanho do núcleo deste foguete é cerca de sete vezes maior do que o segundo estágio do Falcon 9.

Jonathan McDowell, astrofísico do Harvard-Smithsonian Center for Astrophysics refere num artigo cientifico que “Os dois lançamentos do CZ-5B deixaram o estágio primário em órbita para uma reentrada descontrolada. São mais de 20 toneladas. Tem sido uma prática padrão nos últimos 30 anos, para todas as entidades que colocam carga no espaço, de não deixar objetos tão grandes - ou mesmo metade deste - em órbita sem garantir a sua reentrada controlada.

Esta escolha de design, em 2021, é inaceitável e prejudica a grande conquista da China no lançamento de Tianhe”, acrescentou McDowell.Lixo espacial ilegal?
Os detritos espaciais ou lixo espacial surge como resultado de mais de seis décadas de voos espaciais. Proveniente principalmente de restos de foguetes, este lixo também é composto por destroços provocados por explosões ou colisões de cerca de 8950 satélites em órbita desde 1957.

De acordo com a ESA estima-se que existam em órbita mais de 900 mil detritos com mais de um centímetro. Muito embora pareça insignificante qualquer impacto com um satélite em funcionamento pode provocar danos e, potencialmente, pôr fim à missão em questão.
Créditos ESA/DR

"A destruição de satélites individuais ou a perda permanente de órbitas específicas devido ao crescimento descontrolado de detritos teria um efeito devastador nas atividades económicas da Europa no espaço, no valor direto de mais de 8 mil milhões de euros, afetando gravemente a economia global”, pode ler-se no site da ESA.

Atualmente, existe a preocupação por parte dos operadores de satélites deste tipo de problema e os gastos que envolvem a segurança deste tipo de equipamento ronda anualmente os 14 milhões de euros, em manobras de desvio de impacto contra detritos.

A juntar a isto os próximos anos prometem oferecer-nos mais um "enorme" conjunto de novos lançamentos com milhares de pequenos satélites, apelidada já de Space 4.0.

Uma situação vai gerar várias centenas de milhares de avisos de colisão por semana, algo incomportável para os operadores de megaconstelações.

Tecnicamente não existe nenhuma lei que proíba os pedaços de foguete de caírem na superfície terrestre. Mas existem regras que determinam quem é o responsável quando se trata de danos ou ferimentos causados por lixo espacial.

De acordo com Christopher Johnson, o consultor de legislação espacial da Secure World Foundation , há dois artigos importantes que explicam isso: o Tratado do Espaço Exterior de 1967 e a Convenção de Responsabilidade Espacial de 1972 . O Tratado do Espaço Exterior define o que os jogadores internacionais estão legalmente autorizados a fazer no espaço, e a Convenção de Responsabilidade detalha quem é responsável por objetos espaciais que causam danos ou danos.

“A responsabilidade por danos não é a constatação de que o Estado de alguma forma violou a lei, mas apenas que é responsável pelos danos resultantes”, diz Johnson, “e que agora existe um dever vinculativo de pagar indemnização por esses danos para esse Estado”.

Muitos dos países lançadores - incluindo os EUA, grande parte da Europa e China - aceitaram os termos da Convenção de Responsabilidade.

Isto significa que, hipoteticamente, se parte deste foguete chinês causasse danos em um dos países assinados na Convenção de Responsabilidade, esse país poderia escolher invocá-lo e responsabilizar a China financeiramente. Tudo isso é teórico. Na realidade, não é tão simples.

Resumindo, há uma série de razões pelas quais um país poderá invocar a Convenção de Responsabilidade contra um inimigo (ou aliado), mas no cerne da questão, citar a Convenção de Responsabilidade é um jogo de poder.
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