Polónia alerta para escalada de tensão na fronteira com a Bielorrússia
Varsóvia admitiu nas últimas horas que a tensão vivida na fronteira com a Bielorrússia poderá evoluir para uma situação "de natureza armada". Na segunda-feira, as autoridades polacas impediram a entrada de cerca de mil pessoas, mas há até quatro mil migrantes acampados junto a Kuznica, na fronteira leste da Polónia. Vários países europeus acusam Minsk de tentar provocar uma nova crise de refugiados na Europa, na sequência das críticas e sanções de Bruxelas ao regime de Alexander Lukashenko.
A Polónia reforçou a segurança junto à fronteira com a Bielorrússia com o envio de mais militares para a região. Foi a resposta do Governo polaco ao evoluir da situação, depois de centenas de migrantes terem tentado destruir uma barreira de arame farpado na segunda-feira. Uma “primeira tentativa massiva de violar a fronteira”, refere o Governo polaco.
Kuźnica: próba sforsowania polskiej granicy pic.twitter.com/kqCkLPdsiK
— Ministerstwo Obrony Narodowej 🇵🇱 (@MON_GOV_PL) November 8, 2021
Na reação a estes acontecimentos recentes, as autoridades polacas decidiram encerrar a fronteira na zona de Kuznica a partir desta manhã de terça-feira (às 7h00 locais).
Do outro lado, centenas de migrantes continuam acampados à espera da ocasião para atravessar a fronteira. Há pelo menos 800 pessoas no local mais próximo junto à barreira, mas a Guarda Fronteiriça polaca confirmou à agência Reuters que contabilizou um grupo que pode chegar aos quatro mil migrantes em florestas nas redondezas.
“Esperamos que possa haver uma escalada deste tipo de ação na fronteira polaca, num futuro próximo, que poderá ser de natureza armada”, admitiu Piotr Muller, porta-voz do Governo polaco.
Pedro Oliveira Pinto - RTP
Migrantes morrem ao frio
Também a Lituânia, que tem sido procurada pelos migrantes através da fronteira com a Bielorrússia, confirmou na terça-feira que equaciona declarar o estado de emergência na região fronteiriça.
No Twitter, a polícia polaca confirmou que a noite foi calma e sem confrontos, confirmando-se apenas uma ocorrência: uma pedra que foi atirada contra um carro da polícia.
O chefe do departamento de segurança nacional da Polónia, Stanislaw Zaryn, afirma que os migrantes estão sob o controlo e ordens das forças bielorrussas. "A Bielorrússia quer causar um grande incidente, de preferência com disparos de armas e vítimas", acusou o vice-ministro dos Negócios Estrangeiros, Piotr Wawrzyk.
Entretanto, os migrantes permanecem nos locais próximos da fronteira apesar do frio rigoroso e da descida abrupta das temperaturas durante a noite.
De acordo com a BBC, os termómetros desceram abaixo dos 0ºC durante a noite e alguns migrantes morreram devido ao frio. Houve pelo menos oito mortes, refere o jornal The Guardian.
Os migrantes em causa chegam sobretudo de vários países do Médio Oriente devastados por conflitos, incluindo Iraque, Síria e Afeganistão. De acordo com as autoridades europeias, a Bielorrússia facilita-lhes a entrada no país e depois pressiona-os a viajarem para países da União Europeia.
Novas sanções?
Perante o agravar da situação, a Polónia admite mesmo vir a necessitar de ajuda internacional. Para já, o Ministério polaco dos Negócios Estrangeiros refere que ainda não necessita do apoio adicional da Frontex.
Os Embaixadores da União Europeia nas Nações Unidas deverão reunir-se esta terça-feira para discutir a escalada de tensão na região.
Bruxelas acusa o Presidente bielorrusso de orquestrar esta chegada massiva de migrantes às fronteiras da União Europeia. Segundo as autoridades europeias, esta é a forma de retaliação escolhida por Alexander Lukashenko, em resposta às sanções aplicadas pelos 27 devido à repressão brutal na Bielorrússia contra a oposição desde as eleições presidenciais de agosto de 2020.
De recordar que as sanções europeias contra o regime de Lukashenko escalaram sobretudo após a detenção de um jornalista dissidente, Roman Protasevich, que seguia a bordo de um voo da Ryanair em maio último. Na altura, o voo que fazia a ligação entre duas capitais da UE, Atenas e Vilnius, e foi desviado para Minsk.
Na segunda-feira, a presidente da Comissão Europeia, Ursula Von der Leyen, prometeu dar mais apoio à Polónia, Lituânia e Letónia para lidar com a atual situação de emergência.
Por outro lado, as autoridades europeias vão estudar a aplicação de novas sanções contra o regime bielorrusso, incluindo a elaboração de “listas negras” de companhias aéreas de países terceiros que estão a facilitar o transporte de migrantes para território bielorrusso.
“A Bielorrússia tem de parar de colocar em risco a vida das pessoas. A instrumentalização dos migrantes para fins políticos é inaceitável”, afirmou Von der Leyen.
Versões contraditórias
Com efeito, milhares de pessoas encontram-se agora encurraladas nas
zonas florestais entre dois países, expostos às temperaturas rigorosas
características desta altura do ano. Se por um lado, as autoridades bielorrussas pressionam estes migrantes a procurar a União Europeia depois de chegarem a Minsk,
a polícia polaca tem autorização desde outubro para expulsar de
imediato os migrantes que cheguem através desta fronteira e ignorar
pedidos de asilo.
Só este ano, a Polónia registou cerca de 30 mil travessias ilegais da
fronteira, das quais mais de 17 mil ocorreram só em outubro. Muitos
destes migrantes procuram chegar à Alemanha. Desde janeiro, Berlim já
acolheu mais de seis mil refugiados vindos da Bielorrússia através da
Polónia.
“Devemos ajudar o Governo polaco a proteger as suas fronteiras externas.
Na verdade, esta é uma tarefa que cabe à União Europeia cumprir. Apelo
agora a que tomem uma atitude”, acrescentou.
Por seu lado, a Bielorrússia nega todas as acusações. “Todas estas pessoas, incluindo mulheres e crianças, não representam nenhuma ameaça à segurança e não são agressivas”, referiu Anton Bychkovsky, responsável pela gestão fronteiriça no país.
“Esses refugiados uniram-se para organizar um grupo grande o suficiente de forma a evitar a deportação forçada por parte da Polónia, chamando à atenção da comunidade internacional para a falta de respeito pelos Direitos Humanos na Polónia”, acrescentou.
“A indiferença e a atitude desumana por parte das autoridades polacas levaram estes refugiados a darem este passo desesperado”, referiu ainda.
De acordo com a agência France Presse, várias entrevistas nos media polacos com os migrantes contradizem a versão bielorrussa, já que os migrantes garantem que estão a ser forçados por Minsk a tentar atravessar a fronteira com a Polónia.