Parlamento da Turquia aprova adesão da Suécia à NATO

por Graça Andrade Ramos - RTP
Recep Tayyip Erdogan, presidente da Turquia Yves Herman - Reuters

Depois da candidatura sueca ter sido aprovada em dezembro de 2023, pela Comissão dos Negócios Estrangeiros do parlamento turco, o voto dos deputados esta terça-feira estava praticamente dado como garantido. Espera-se que o presidente Recep Tayyip Erdogan ratifique a decisão ainda esta semana.

A adesão foi aprovada por uma maioria esmagadora. Os deputados votaram 287-55 favoravelmente a candidatura da nação nórdica. O partido AK, do presidente, os seus aliados nacionalistas do MHP e o principal partido da oposição, CHP, votaram todos a favor da adesão, com os votos contra a serem expressos pelos partidos nacionalista, islamita e de esquerda, na oposição.

Falta agora apenas a anuência da Hungria para a Suécia se tornar o 32º membro da Organização do Tratado do Atlântico Norte, NATO na sigla em língua inglesa.

O primeiro-ministro sueco, Ulf Kristersson, reagiu ao voto, sublinhando que o país está "a um passo" de se tornar membro pleno da NATO.

"Hoje ficamos um passo mais perto de nos torb«narmos um membro pleno da NATO", escreveu Kristersson na rede X. "Positivo que a Grande Assembleia Geral da Turquia tenha votado a favor da adesão da Suécia à NATO".
Quase dois anos de impasse
O processo de aceitação por parte da Turquia foi moroso e complicado, com a votação desta terça-feira a ser antecedida por quatro horas de debate sobre as cedências e conquistas de Ancara, depois de 20 meses de hesitação e de exigências para com Estocolmo e com os Aliados.

O maior pretexto para as reticências turcas começou por ser o acolhimento dado pela Suécia a membros do Partido dos Trabalhadores do Curdistão, PKK, que centra há décadas a resistência curda ao domínio turco e que o governo da Turquia considera terroristas.

Já em dezembro e depois de alguns compromissos suecos quanto à questão curda, incluindo a adoção de legislação anti-terrorista mais rigorosa e outras medidas securitárias, o presidente Recep Tayyip Erdogan acrescentou às suas condições a aprovação "simultânea", por parte do Congresso dos Estados Unidos, da venda de aviões caça F-16 para modernizar a Força Aérea da Turquia.

Exigência ainda por cumprir, mas aparentemente garantida mediante luz verde parlamentar à adesão sueca e ratificação que poderá ser assinada por Erdogan ainda esta semana.

O presidente norte-americano, Joe Biden, terá deixado esta certeza ao homólogo turco e a negociação final terá sido o principal assunto na agenda do secretário de estado Antony Blinken durante a sua visita a Istambul, no início do ano.
Vantagem: Turquia
Como membro da NATO com fortes laços com Moscovo, a Turquia tem gozado de uma posição previlegiada para negociar com ambos os blocos, incluindo quanto a armamento e tem negociado com destreza a sua aprovação à Suécia.

Como parte das negociações conseguiu por exemplo que, além da Suécia, também a Finlândia, o Canadá e os Países Baixos relaxassem as suas políticas quanto à exportação de armas turcas, algo que de alguma forma poderá vir a beneficiar Moscovo na guerra na Ucrânia.

Ancara tem lucrado duplamente com este conflito, ao manter e até alargar o comércio com a Rússia ao mesmo tempo que abastece Kiev com drones e outro material militar.

Erdogan é ainda um dos únicos líderes da NATO a manter conversas regulares com o seu homólogo russo, Vladimir Putin, tanto por telefone como presenciais. 

De acordo com a imprensa turca, Putin poderá mesmo visitar a Turquia no próximo mês, quando a guerra na Ucrânia estiver a entrar no seu terceiro ano.
Órban, a pedra no sapato
Com a aprovação da candidatura sueca por parte da Turquia em sessão plenária, a Hungria permanece como único obstáculo à adesão do país nórdico à Aliança Atlântica.

Esta terça-feira, Budapeste convidou o primeiro-ministro sueco, Ulf Kristersson, para uma reunião de forma a "discutir" a entrada. O convite foi divulgado na rede X numa publicação do primeiro-ministro húngaro, Viktor Órban.

Questionado pelos jornalistas, o ministro sueco dos Negócios Estrangeiros respondeu contudo sucintamente. "Não vejo razão para negociar no dia de hoje", disse Tobias Billström, lembrando que a Hungria "concedeu à Suécia o estatuto de convidado, durante a cimeira de Madrid, o ano passado", com vista a uma adesão futura, sem colocar reservas.

O responsável pela diplomacia sueca afirmou ainda estar pronto a "discussões", sublinhando os "númerosos pontos em comum" e a "cooperação militar" entre os dois países.

A imprensa pró-Órban tomou as dores do líder e insurgiu-se contra uma Suécia "que exige um pacto de sangue sem fazer qualquer gesto de conciliação".

O revés não deverá alterar significativamente a estratégia da Hungria, que tem seguido a batuta turca neste dossier. Espera-se agora que não demore a seguir-lhe o exemplo, acolhendo a Suécia, de acordo com o artigo 10 do Tratado, o qual estipula que os membros têm liberdade para convidar outros Estados a integrar a organização, sob consenso e sob necessidade de ratificação de cada Estado-membro.

O líder nacionalista húngaro foi acusado de usar a candidatura sueca para chantagear a União Europeia em dossiers controversos e de fazer o jogo de Vladimir Putin na divisão do bloco ocidental.

Viktor Órban prometeu não ser o último a aceitar a Suécia mas esperou demasiado. O partido socialista MSZP, principal da oposição húngara, apelou já ao primeiro-ministro para "por fim a esta brincadeira insensata, que prejudica consideravelmente a imagem da Hungria", exigindo a convocação de um plenário extraordinário da Assembleia húngara para proceder à votação.
Tensão crescente
A Suécia apresentou a sua candidatura à NATO em simultâneo com a Finlândia, em reposta à invasão da Ucrânia pela Rússia, há cerca de dois anos. A Finlândia foi admitida no passado mês de abril como 31º estado membro.

A entrada da Finlândia duplicou a área fronteiriça da Aliança Atlântica com a Rússia, e reforçou as defesas das três pequenas nações do Báltico, Estónia, Letónia e Lituânia, que aderiram à NATO depois do colapso da União Soviética.Também foi considerada mais uma provocação por Moscovo.

As tensões entre o bloco russo e o bloco ocidental têm vindo a agravar-se, com o Kremlin a acusar a NATO de violar acordos para se manter longe das suas fronteiras e os Aliados a apontarem o dedo à estratégia musculada russa. 

Tanto a Finlândia como a Suécia, ambos países neutrais durante décadas, alteraram a sua posição oficial após a invasão russa da Ucrânia, como forma de dissuasão quanto a uma eventual política expansionista vinda do leste.

A Ucrânia é igualmente candidata a entrar na NATO, contudo a sua pretensão coloca múltiplos problemas e reticências a outros países membros. A Eslováquia, pelo seu primeiro-ministro Robert Fico, anunciou nos últimos dias o seu veto à candidatura, para "evitar a III guerra Mundial".
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