Países Baixos guinam à direita. Anti-islamita e eurocético Geert Wilders vence eleições

por Graça Andrade Ramos - RTP
Geert Wilders reage ao anúncio da sondagem à boca das urnas que lhe deu a vitória nas eleições legislativas dos Países Baixos Yves Herman - Reuters

O Partido da Liberdade, PVV, de Geert Wilders, anti-islamita e anti-europeísta, venceu as eleições legislativas nos Países Baixos, de acordo com sondagens à boca das urnas da Ipsos para a televisão nacional NOS.

Deverá obter 35 dos 150 lugares na câmara baixa do Parlamento, mais do dobro do que obteve em 2021. Embora longe da maioria, os resultados colocam-no muito à frente das restantes forças.

É uma reviravolta dramática nas expetativas e o impacto deverá sentir-se até Bruxelas.

"Esta sondagem à boca das urnas é histórica. É a maior mudança de sempre a que assistimos nos Países Baixos", reagiu o cientista político, Tom van der Meer, à NOS.

Wilders quer banir do país as mesquitas e deixar a União Europeia. "Os eleitores estão fartos", defendeu. O PVV prometeu nomeadamente um referendo sobre a adesão dos Países Baixos à União Europeia.
"Pode não ser o que outros partidos na Europa ou em outros países procuram, mas, isto é democracia", frisou durante a tarde o político, de 60 anos, depois de votar.

Os primeiros indícios do que se preparava surgiram apenas terça-feira à tarde, quando algumas sondagens indicaram Wilders como vencedor, lançando o caos numas eleições que já se anunciavam renhidas. 

Até então, o PVV estacionava em quarto lugar nas intenções de voto, atrás da aliança dos verdes e socialistas liderados por Frans Timmerman e ainda mais longe dos favoritos VVD e CSN, liberais-conservadores e centristas, respetivamente.

A inversão das indicações das sondagens não se limita a Wilders. Também Timmermans tem razões para festejar, ao ver a sua forçar tornar-se a segunda mais votada, devendo conseguir 25 ou 26 lugares, um salto bem acima dos anteriores 17.

A maior desilusão será a de Dilan Yesilgöz, sucessora do anterior primeiro-ministro Mark Rutte à frente do VVD, projetada para conseguir somente 23 ou 24 lugares, contra os anteriores 34. Já Pieter Omtzigt, do recém formado CSN, deverá ficar com 20 deputados.

Os resultados finais deverão ser conhecidos apenas amanhã. As negociações para um futuro executivo holandês deverão contudo começar já esta noite. Poderão demorar semanas ou meses.
Celebração ao som de Rocky
Entre os mais surpreendidos com os resultados estarão o próprio Wilders e os restantes líderes do PVV. Só há três dias é que reservaram uma sede para a noite eleitoral, devido a indicações de mudanças positivas para si nas intenções de voto.

Foi com um sorriso gigante e ao som da banda sonora de Rocky, que Wilders entrou num café na zona costeira do país. "Os eleitores falaram esta noite e disseram que estão fartos", afirmou.

"Vamos garantir que os eleitores holandeses vão voltar a ter a primazia", acrescentou, num chavão clássico dos seus discursos, acrescentando que o seu partido vai trabalhar para deter o "tsunami de asilo" migrante, pôr mais dinheiro nos bolsos das pessoas e incrementar a segurança.

Wilders sabe contudo que dificilmente poderá tornar-se primeiro-ministro. Precisa de se aliar a outros partidos para governar e nenhum dos restantes mais votados admitiu-se prestar-se a isso, bem pelo contrário.

A segunda prioridade da reação de Wilders à perspetiva da vitória foi mostrar-se conciliador, dizendo que agora é tempo de unir esforços e encontrar soluções para os problemas que sejam "conformes à Constituição" do país.
Uma geringonça à holandesa
O politólogo van der Meer considerou que três aspetos pordem explicar a vitória inesperada de Wilders, um veterano da política holandesa até agora arredado para as franjas das preferências de voto, e que pode vir inverter de forma dramática o rumo europeísta adotado pelos Países Baixos sob Rutte nos últimos 13 anos.

"Primeiro, tivemos um executivo de centro na última década", analisou Meer. "Os eleitores foram sobretudo para os flancos em reação a isso".

"Em segundo lugar, a migração foi um tema central na campanha e os eleitores lembram-se logo do PVV quando pensam nessa questão", lembrou.

"E por último, a líder do VVD, Yesilgöz, abriu a porta ao PVV enquanto parceiro de coligação. Nos Países Baixos, as pessoas têm procurado por um partido que seja mais franco do que o VVD mas que possa governar. Agora, abriu-se a porta ao PVV, encontraram-na", rematou.

Dilan Yesilgöz já recuou na sua promessa de se aliar a Wilders em Haia, mas poderá ser tarde. Ela própria defendeu no seu programa um maior controlo da imigração, por considerar que o país não tem condições de acolher com qualidade tantos pedidos de asilo, de trabalho ou de estudo.

O VVD não comunga contudo das ideias de Wilders que quer, além de banir mesquitas, banir o Corão e o uso de lenços islâmicos nos edifícios governamentais. Também não quer o "Nexit" defendido pelo eurocético ferranho e defende a continuidade dos laços próximos com Bruxelas.

Por isso, a questão agora é saber de que forma irão reagir os restantes partidos e que alianças e cedências estarão dispostos a fazer, seja para se juntarem à extrema-direita de forma a formar governo seja para se aliarem entre si em acordos parlamentares para travarem as políticas de Wilders ou mesmo para formar um governo alternativo com maioria de deputados.

Os líderes dos outros três principais partidos garantiram anteriormente que não participarão numa coligação liderada pelo PVV. Uma maioria parlamentar contudo só poderá ser obtida por uma aliança entre pelo menos quatro partidos.
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