País vota no domingo segunda volta das legislativas sob fantasma de conflitos

por Lusa

A República Centro-Africana (RCA) prepara-se para realizar este domingo a segunda volta das eleições legislativas, continuando imersa num ambiente volátil que se segue a uma primeira volta marcada por uma fraca participação devido ao conflito armado.

Na primeira volta, realizada em 27 de dezembro de 2020, o chefe de Estado cessante, Faustin Archange Touadéra, foi reeleito com 53,1% dos votos expressos, sendo que a legalidade e legitimidade dos resultados ainda hoje é contestada.

O escrutínio, conturbado e após uma ofensiva rebelde lançada dias antes, permitiu que o regime de Touadéra se fortalecesse, recuperando terreno aos grupos armados presentes em dois terços do território desde o início de uma sangrenta guerra civil, em 2013.

O conflito continua, apesar da presença de 12.500 soldados de uma missão de manutenção da paz das Nações Unidas, embora a sua intensidade seja agora mais reduzida.

Em 17 de dezembro, seis dos grupos armados rebeldes que ocupam dois terços da RCA aliaram-se na Coligação de Patriotas para a Mudança (CPC), tendo, em 19 de dezembro, oito dias antes das eleições presidenciais e legislativas, anunciado uma ofensiva para impedir a reeleição de Touadéra.

Junto da agência France-Presse (AFP), o seu porta-voz, Serge Bozanga, afirmou que no domingo "não haverá eleições nas áreas sob o controlo do CPC", prevendo-se uma situação semelhante à de 27 de dezembro, quando um elevado número de mesas de voto permaneceram encerradas devido à insegurança.

O porta-voz da missão das Nações Unidas no país, a Minusca, o tenente-coronel Abdoul-Aziz Fall, afirmou que "a situação permanece muito volátil" e que "bastam alguns tiros para criar o pânico".

Ainda assim, o porta-voz da Minusca assinalou que os grupos armados "estão numa dinâmica de retirada para áreas remotas".

O responsável pela comunicação do Governo da RCA, Ange-Maxime Kazagui, assegurou que o executivo vai "reforçar fortemente" os lugares de "alto risco" ou de "difícil acesso".

A eleição de apenas 22 deputados na primeira volta de 27 de dezembro deixa em aberto as nomeações dos restantes lugares que compõem os 140 assentos da Assembleia Nacional da RCA.

O Tribunal Constitucional exigiu que pelo menos 71 deputados sejam eleitos antes de 02 de maio, uma condição dificultada pelo conflito que atingiu a primeira ronda e que impossibilitou que dezenas de círculos eleitorais acolhessem os votos da população centro-africana. Com isto, apenas 49 círculos eleitorais vão agora disputar a segunda volta.

Nos outros 69 círculos eleitorais, onde a votação foi impedida ou cancelada por irregularidades pelo Tribunal Constitucional, uma primeira volta será reorganizada no domingo e, eventualmente, uma segunda volta, à posteriori.

O investigador Hans de Marie Heungoup, do International Crisis Group, assinalou que "a Minusca e o Tribunal Constitucional queriam concentrar-se nos 49 círculos eleitorais" onde a votação deveria seguir, mas o executivo "considerou que era capaz de organizar a primeira e segunda voltas em todo o país".

Em 27 de dezembro, dia das eleições presidenciais e legislativas, dois em cada três eleitores recenseados não puderam votar.

A reeleição na primeira volta do Presidente, Faustin Archange Touadéra, com 53,16% dos votos, foi validada em 18 de janeiro pelo Tribunal Constitucional, que rejeitou recursos dos opositores que alegavam "fraude eleitoral generalizada".

Touadéra tinha sido declarado reeleito em 04 de janeiro após uma votação que foi contestada pela oposição e na qual apenas um em cada dois eleitores recenseados teve a oportunidade de votar por causa da insegurança fora da capital, Bangui.

O tribunal validou a taxa de participação eleitoral em 35,25%, muito abaixo dos 76,31% anunciados provisoriamente pela comissão eleitoral em 04 de janeiro.

A RCA caiu no caos e na violência em 2013, após o derrube do então chefe de Estado, François Bozizé, por grupos armados reunidos na Séléka, o que suscitou a reação de outras milícias, agrupadas numa coligação anti-Balaka.

Desde então, o território centro-africano tem sido palco de confrontos comunitários entre estes grupos, que obrigaram quase um quarto dos 4,7 milhões de habitantes da RCA a abandonarem as suas casas.

Portugal tem atualmente na RCA 243 militares, dos quais 188 integram a Minusca e 55 participam na missão de treino da União Europeia (EUTM), liderada por Portugal, pelo brigadeiro general Neves de Abreu, até setembro de 2021.

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