Oposição na Fretilin quer demissão de liderança após derrota "humilhante"

por Lusa

 Opositores internos na Fretilin exigiram hoje a demissão da atual liderança do partido, que responsabilizam pelo que consideram ter sido uma derrota "humilhante" do partido histórico nas legislativas de domingo em Timor-Leste.

"Para todos os quadros da Fretilin, militantes da Fretilin, estes resultados das eleições é a primeira das grandes derrotas que a Fretilin teve na sua vida política. É a única derrota que digo que é humilhante para a Fretilin", disse à Lusa José Agostinho Sequeira, conhecido como "Somotxo", atual deputado da Frente Revolucionária do Timor-Leste Independente (Fretilin) e ex-membro do Comité Central do partido.

"Esta liderança admitiu isso, porque já devia ter pensado em uma nova liderança, como alternativa para a vitória da Fretilin. A liderança atual, Mari e Lú-Olo, já não são alternativas para a vitória da Fretilin. Isto veio provar [que] esta derrota não é da Fretilin, a derrota é da atual liderança", afirmou.

A Fretilin foi o segundo partido mais votado no domingo, com 25,75% dos votos, o pior resultado de sempre da força política, que perdeu quatro das 23 cadeiras que tinha no parlamento, com o Congresso Nacional da Reconstrução Timorense (CNRT) de Xanana Gusmão a obter 41,62% e mais 10 cadeiras do que as atuais 21.

"Somotxo" falava à Lusa à margem de uma reunião de vários elementos do movimento de oposição interna à liderança de Alkatiri e Lú-Olo, que estão a analisar os resultados eleitorais, marcados pela ampla vitória do CNRT de Xanana Gusmão e o pior resultado de sempre da Fretilin.

O deputado foi candidato a presidente do partido no congresso nacional de setembro do ano passado, altura em que fazia parte de um movimento de contestação à liderança do presidente, Francisco Guterres Lú-Olo, e do secretário-geral, Mari Alkatiri.

Entre os participantes no encontro de hoje destacam-se Rui Maria Araújo, primeiro-ministro entre 2015 e 2017, e que fazia parte da lista de "Somotxo", como candidato a secretário-geral, no congresso de 2022.

"Somotxo", Araújo e dois outros participantes, Osório Florindo e Luís Lobato, demitiram-se todos do comité central da Fretilin depois do congresso do ano passado.

No encontro estavam igualmente elementos da equipa da candidatura presidencial de Lere Anan Timur, ex-comandante das Forças de Defesa, na qual um dos adversários de Lú-Olo, sendo atualmente parte da `troika` de liderança.

"As figuras do Mari e do Lú-Olo estão a abusar da nossa paciência, a abusar da paciência dos militantes, estão a abusar também da nossa vontade, da nossa vontade política, estão a abusar de tudo", afirmou "Somotxo".

Motivo pelo qual, vincou, exige "a demissão da atual liderança", a convocatória de um congresso extraordinário e, "através de eleição direta, eleger novo presidente e novo secretário-geral".

O deputado considerou que está em risco o futuro do partido se se mantiver a atual liderança. "Não vamos parar de lutar (...) até conseguirmos que o Mari e Lú-Olo sintam que são obstáculos para a vitória da Fretilin", acrescentou.

"Porque estão a ser insensíveis perante tantas derrotas. E não vamos admitir isso. Estão a brincar, a brincar com este país. Para mim é grave porque também se estão a aproveitar da ignorância dos militantes para continuar a estar no partido", vincou.

Alguns dos participantes no encontro de hoje, ouvidos pela Lusa, sustentam haver crescente oposição interna crescente à liderança que ainda não reagiu à derrota de domingo.

Apesar de insistências da Lusa, o secretário-geral, Mari Alkatiri, disse que só falaria depois de uma reunião da comissão política nacional do partido, remetendo, porém, para declarações suas à Lusa depois de votar.

No domingo Alkatiri disse que o voto era crucial para que a velha geração deixe algo de positivo aos jovens, admitindo que será difícil participar intensamente em futuras campanhas.

É importante, salientou após votar, porque "a velha geração" de 1974/75 tem "de ter consciência de que é necessário deixar algo de positivo, algo de sustentável para este país", disse à Lusa.

"E, quer queiramos, quer não, esta deve ser a nossa última campanha em profundidade. E se não pensarmos assim, significa que na próxima (...) não sei para onde vai este país", afirmou Alkatiri.

Em junho do ano passado, o comité central da Fretilin determinou que a liderança seria escolhida por congresso em vez de eleições diretas, com esta opção rejeitada, na altura, por ser considerada demasiado dispendiosa.

O congresso acabou por votar apenas uma lista única, a do atual presidente e secretário-geral, Lú-Olo e Alkatiri, depois da comissão de verificação ter desqualificado a lista alternativa, de Araújo e "Somotxo".

Um dos argumentos que tem sido usado contra os dois dirigentes é a sua suposta proximidade a Xanana Gusmão -- Rui Araújo foi primeiro-ministro num Governo liderado pelo CNRT -, aspeto que "Somotxo" considera não ser importante.

"Não quero falar de `muito próximo ou muito longe de Xanana. Porque nós temos várias experiências durante os 24 anos de luta. Precisamos de todos os timorenses. Até os autonomistas, que nos traíram, tivemos de os convencer para nos apoiarem, quanto mais a liderança de um partido", afirmou.

"Os partidos atualmente estão distanciados. (...) Se continuarmos assim não vamos ter uma estabilidade política e governativa para desenvolver este país. O importante é a estabilidade, o desenvolvimento deste país", sustentou.

E voltou a responsabilizar Alkatiri por vincar esse distanciamento em vez de procurar a "estabilidade política", que considera ser essencial para o país: "O que é que o Mari está a ganhar com isso? O distanciamento com Xanana, o confronto com o Xanana, o que é que ele está a ganhar com isso? Não está a ganhar nada", afirmou.

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