ONU alerta para "carnificina climática" se o financiamento para a adaptação não aumentar

por Mariana Ribeiro Soares - RTP
O financiamento internacional atual para os países em desenvolvimento está entre cinco a dez vezes abaixo do necessário Stephane Mahe - Reuters

O secretário-geral das Nações Unidas, António Guterres, alertou que é necessário um aumento dramático no financiamento para a adaptação climática para salvar milhões de vidas da “carnificina climática”. Um relatório divulgado esta quinta-feira revela que o financiamento internacional atual para os países em desenvolvimento está entre cinco a dez vezes abaixo do necessário.

Um relatório do Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente (PNUMA), divulgado esta quinta-feira, conclui que o mundo não está a contribuir com dinheiro suficiente para ajudar os países em desenvolvimento a adaptarem-se aos impactos cada vez mais alarmantes das alterações climáticas.

O relatório constata que os países estão a aumentar a implementação de planos de adaptação climáticos, estratégias, leis e políticas. No entanto, o esforço não está a acompanhar o mesmo ritmo dos riscos climáticos.

“Sim, mais de 80 por cento dos países têm pelo menos um instrumento nacional de planeamento de adaptação em vigor. Mas o financiamento para transformar o planeamento em ação não está a seguir o mesmo ritmo”, alertou Inger Andersen, diretora executiva do PNUMA.

De acordo com o relatório, o financiamento internacional atual para os países em desenvolvimento está entre cinco a dez vezes abaixo do necessário. O relatório avança que as necessidades anuais estimadas para a adaptação rondam os 160 e 340 mil milhões de dólares até 2030 e os 315 e 565 mil milhões até 2050.

O apoio à adaptação hoje é de menos de um décimo desse valor. As pessoas e as comunidades mais vulneráveis estão a pagar o preço [desse subfinanciamento] e isso é inaceitável”, disse Guterres, que alertou para uma “carnificina climática”.

O relatório do PNUMA deixa claro que o mundo está falhar em proteger as pessoas dos impactos da crise climática. Precisamos de um aumento global do investimento em adaptação para salvar milhões de vidas da carnificina climática”, apelou.
“Duros golpes para as próximas gerações”
As nações mais ricas forneceram 29 mil milhões de dólares para a adaptação climática em 2020 – um aumento de apenas quatro por cento em relação a 2019. Os países desenvolvidos prometeram na Conferência das Nações Unidas sobre Mudança do Clima (COP26), no ano passado, aumentar esse valor para 40 mil milhões de dólares até 2025.

“As alterações climáticas estão a desferir golpe após golpe na humanidade, como vimos ao longo de 2022”, disse Inger Andersen, citada no relatório.

Andersen deu o exemplo das inundações catastróficas e dos incêndios cada vez mais assoladores que temos vindo a observar em várias partes do mundo e sublinha que “estes são os tipos de impactos climáticos que estamos a sofrer a apenas 1,1°C acima das temperaturas pré-industriais”. Andersen alerta que o mundo está a caminhar para temperaturas muito mais altas, podendo aumentar 2,8°C no final do século se se mantiverem as políticas atuais.

Se não quisermos passar as próximas décadas no modo de resposta de emergência, a lidar com desastre após desastre, precisamos de estar à frente no jogo. Os intervalos de temperatura que estamos a analisar nas próximas décadas transformarão os impactos climáticos que estamos a observar agora em duros golpes para as próximas gerações”, alerta a diretora do PNUMA.

António Guterres sublinhou que “também devemos reconhecer que, em muitos lugares, é tarde demais para adaptação” e sugere que a COP27, que tem início este domingo, “deve fornecer um roteiro claro e com um prazo determinado para fechar a lacuna financeira para lidar com perdas e danos”. “Este será um teste decisivo para o sucesso da COP27”, rematou.
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