As Nações Unidas expressam indignação perante o ataque a uma coluna humanitária na Síria e alertam que, se tiver sido intencional, representa um crime de guerra. Pelo menos 18 camiões, na coluna de 31 veículos, foram atingidos. Morreram 12 trabalhadores humanitários e condutores.
"A nossa indignação perante este ataque é enorme. A coluna era fruto de um longo processo de autorizações e preparativos para assistir civis isolados", disse o enviado da ONU para a Síria, Staffan de Mistura.
O comandante das operações humanitárias da ONU, Stephen O’Brien, pediu uma investigação ao incidente. "Deixem-me ser claro: se se descobrir que este ataque cruel tinha como alvo deliberado a equipa humanitária, isso representaria um crime de guerra", disse.
O Observatório Sírio dos Direitos Humanos avança que pelo menos 18 camiões, na coluna de 31 veículos, foram atingidos pelo ataque, causando a morte de 12 trabalhadores humanitários e condutores. As Nações Unidas não confirmam o número de vítimas.
Este é o primeiro grande ataque após o fim das tréguas de uma semana declaradas pelos Estados Unidos e pela Rússia.
O cessar-fogo falhou, não só porque foi violado várias vezes mas também porque não foi possível entregar em segurança, como pretendido, a ajuda humanitária da ONU a várias cidades e vilas cercadas.
O camião de auxílio para Alepo, no norte do país, ficou retido vários dias entre as fronteiras da Turquia e da Síria, sem poder avançar por falta de autorizações e de condições de segurança.
Armazém atingido
O’Brien indicou que relatos iniciais apontam para "muitas pessoas" mortas ou gravemente feridas, incluindo voluntários da Crescente Vermelho. Um armazém do Crescente Vermelho foi também atingido, havendo relatos de uma clínica ter sofrido danos, segundo o comandante das operações humanitárias da ONU.
O ministro francês dos Negócios Estrangeiros, Jean-Marc Ayrault, condenou firmemente o ataque, dizendo que este sublinhava a "urgência de cessar as hostilidades na Síria". Os Estados Unidos manifestaram ultraje com o ataque e reforçaram que o destino da coluna humanitária era conhecido do regime Sírio e do seu aliado, a Rússia.
"A notificação da coluna - que planeava chegar a 78 mil pessoas - tinha sido dada a todas as partes do conflito e a coluna estava claramente assinalada como humanitária", disse O’Brien.
"Não pode haver explicação ou desculpa, não há razão ou racionalização para abrir guerra sobre corajosos e altruístas trabalhadores humanitários que tentavam chegar até aos seus concidadãos, que precisam desesperadamente de assistência".
Washington acusa Moscovo
O exército sírio tinha anunciado o fim do cessar-fogo, mediado pelos Estados Unidos e Rússia, acusando os rebeldes de mais de 300 violações e de não cumprirem "um único elemento" do acordo EUA-Rússia.
Daniel Pessoa e Costa, Guilherme Brízido - RTP
Os EUA responsabilizaram já a Federação Russa pelo ataque a uma coluna humanitária na Síria e exigiram que Moscovo demonstrasse "rapidamente e de forma significativa" se continua comprometida com o acordo de cessar-fogo no país árabe.
Europa preocupada
O encontro dos ministros dos Negócios Estrangeiros da União Europeia, que aconteceu esta segunda-feira em Nova Iorque, foi marcado por "muita preocupação" com o final do cessar-fogo na Síria.
"Há muita preocupação, mas ninguém está a deitar a toalha ao chão. Todos aguardamos, com confiança, os resultados do encontro do Conselho de Segurança de quarta-feira", disse à Lusa o ministro português dos Negócios Estrangeiros, Augusto Santos Silva.
Estados Unidos, Rússia e outros protagonistas do processo na Síria reúnem-se esta terça-feira em Nova Iorque para discutir a crise no país. Na quarta-feira, o Conselho de Segurança das ONU reúne-se com a mesma intenção, depois de o exército sírio ter decretado o fim do cessar-fogo.
"Para que o processo de diálogo seja retomado é necessário que exista um mínimo de confiança entre as partes. Tentámos perceber de que forma é que a União Europeia pode contribuir para o retomar desse diálogo", explicou Santos Silva.
Segurança para a missão humanitária
O final do cessar-fogo foi decretado precisamente no dia em que o comboio de ajuda humanitária foi atingido pelos bombardeamentos aéreos perto de Urm al-Kubra, oeste da província síria de Alepo.
Santos Silva lembrou que a União Europeia "tem a liderança da ajuda humanitária no país e do processo de reconstrução", dois objetivos que se encontram comprometidos neste momento.
"Tem de haver condições de segurança para cumprir o dever de ajuda humanitária. Os acontecimentos de hoje põem isso em causa. Também estão limitados os esforços de reconstrução enquanto o conflito ainda decorre", explicou o ministro.
O anúncio de segunda-feira deixa antever um reacendimento do conflito generalizado que desde março de 2011 já provocou mais de 300 mil mortos e devastou a Síria. Augusto Santos Silva acredita, no entanto, que o diálogo entre as partes será retomado esta semana e que isso se vai traduzir em desenvolvimentos positivos.
"Seria muito difícil imaginar o fim desta semana ministerial da Assembleia Geral da ONU sem que acontecessem avanços a este nível. Ninguém perdoaria a comunidade internacional se isso não acontecesse", concluiu.
c/ Lusa