Observação da matéria escura pelo Euclid conta com participação lusa

por Nuno Patrício - RTP
ESA

É já no próximo sábado que o telescópio espacial da Agência Espacial Europeia Euclid (Euclides, em português) vai partir para explorar o Universo escuro. Uma missão que contou, nos últimos 11 anos, com a participação de 30 investigadores portugueses de várias instituições, coordenados pelo Instituto de Astrofísica e Ciências do Espaço (IA) e da Faculdade de Ciências da Universidade de Lisboa (Ciências ULisboa).

O fito é criar o maior e mais preciso mapa tridimensional do Universo já produzido ao longo de dez mil milhões de anos cósmicos. Uma missão que só o telescópio Euclid pode realizar e que vai fornecer à comunidade astrofísica uma outra visão.

Quando olhamos para cima, são os pontos brilhantes, como as estrelas e os planetas, na sua grande maioria, que se destacam no escuro firmamento noturno. Mas isso não significa que o que não vemos não exista.

Noventa e cinco por cento do Universo parece ser composto por uma desconhecida "matéria escura" e "energia escura". Matéria essa que afeta o movimento e a distribuição de fontes visíveis, mas não emite nem absorve qualquer luz. Os cientistas ainda não sabem o que essas entidades realmente são.

Compreender a sua natureza é, portanto, um dos desafios mais fascinantes da cosmologia e da física fundamental atualmente. E é precisamente aqui que entra o Euclid.

O telescópio espacial Euclid recebeu o nome do matemático grego Euclides de Alexandria, que viveu por volta de 300 aC e é tido como fundador da geometria. Como a densidade da matéria e da energia está ligada à geometria do universo, a missão foi nomeada em sua homenagem.

O telescópio irá investigar como o Universo se expandiu e como a estrutura em grande escala está distribuída no espaço e no tempo, revelando mais sobre o papel da gravidade e a natureza da energia e da matéria escuras.

Uma missão que tem a duração de seis anos. Mais de um terço do céu – uma área quase 100 vezes superior à área observada pelo telescópio espacial Hubble em quase três décadas – será escrutinado pelo novo telescópio.
Créditos: ESA
Mão portuguesa 
Nos últimos 11 anos, Portugal, através do Instituto de Astrofísica e Ciências do Espaço e da Faculdade de Ciências da Universidade de Lisboa, contribuiu de forma essencial para o planeamento da missão do telescópio espacial Euclid.

A participação portuguesa nesta missão é coordenada pelo IA Ciências ULisboa e conta atualmente com 30 cientistas de diferentes instituições, sendo financiada pela Portugal Space e por projetos da Fundação para a Ciência e Tecnologia (FCT), contratos de Investigador FCT e contratos de professor universitário com financiamento do Ministério da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior.

O plano de observações da missão espacial Euclid é liderado pelo IA. Este grupo é responsável por produzir o calendário de mapeamento do céu com as cerca de 50 mil observações do telescópio, definindo qual a região do céu que este irá observar em cada momento no calendário dos mais de seis anos de duração da missão.

Importa ainda referir que no âmbito da colaboração Euclid - que envolve mais de 2.700 cientistas - João Dinis, investigador do IA Ciências ULisboa, foi reconhecido com o Euclid Special Talent And Recognition (STAR) Prize, na categoria Senior Award.

Os investigadores do IA participaram também na escolha e validação de três regiões escuras do céu para as observações profundas do Euclid.


Um décimo do tempo de observação total será utilizado para analisar a fundo estas três regiões especiais, esperando-se encontrar objetos extremamente ténues escondidos nessas janelas escuras do passado cósmico.

O IA coordena os grupos científicos que irão utilizar os dados obtidos com este telescópio para outros objetivos além do foco da missão.O IA participa ainda na coordenação de projetos no domínio das lentes gravitacionais, física teórica e aglomerados de galáxias.

Agora, a menos de uma semana do lançamento, as expetativas desta equipa nacional são "naturalmente" altas e expectantes com os resultados que se vão obter nesta missão.

A primeira divulgação de imagens deverá ocorrer em novembro de 2023, embora algumas imagens pontuais possam ser divulgadas antes.

Relativamente aos primeiros dados científicos, estes são esperados em dezembro de 2024 e as publicações científicas em novembro de 2025.

O Euclides foi projetado para abordar algumas das questões mais importantes da cosmologia:

  • Qual é a estrutura e a história da teia cósmica?
  • Qual é a natureza da matéria escura?
  • Como a expansão do Universo mudou ao longo do tempo?
  • Qual é a natureza da energia escura?
  • Nossa compreensão da gravidade é completa?
Nave espacial e instrumentos
O telescópio Euclid tem aproximadamente 4,7 metros de altura e 3,7 metros de diâmetro e consiste em dois componentes principais: o módulo de serviço e o módulo de carga útil.

O módulo de carga compreende um telescópio de 1,2 m de diâmetro e dois instrumentos científicos: uma câmara de comprimento de onda visível (o instrumento VISible, VIS) e uma câmara/espectrómetro de infravermelho próximo (o Near-Infrared Spectrometer and Photometer, NISP).

O módulo de serviço contém os sistemas de satélite: geração e distribuição de energia elétrica, controlo de atitude, eletrónica de processamento de dados, propulsão, telecomando e telemetria e controlo térmico.

O Euclid vai tirar fotos em luz infravermelha e óptica; estas imagens acabarão por cobrir mais de um terço do céu extragaláctico fora da Via Láctea e retratar biliões de alvos cósmicos a uma distância em que a luz levou até dez mil milhões de anos para chegar até nós.

O Plano Cosmic Vision 2015-2025 da ESA foi concebido para nos dar uma nova compreensão e novas visões do Universo. Créditos: ESA

A qualidade da imagem do Euclid será pelo menos quatro vezes mais nítida do que a obtida por pesquisas terrestres do céu.

Além disso, o Euclid realizará espetroscopia no infravermelho próximo de centenas de milhões de galáxias e estrelas no mesmo céu. Isso permitirá que os cientistas investiguem as propriedades químicas e cinemáticas de muitos alvos em detalhes.

Criará ainda um grande arquivo de dados únicos, sem precedentes em volume para uma missão espacial, permitindo a pesquisa em todas as disciplinas da astronomia.

A massa do Euclid em órbita será de duas toneladas (incluindo 800 quilos de módulo de carga útil, um módulo de serviço de 850 quilos, 40 quilos de massa de equilíbrio e 210 quilos de propelente).

Assista através da ESA Web TV ou da ESA Youtube livestream ao lançamento do Falcon 9 que transportará o telescópio Euclid até órbita terrestre.


Viagem e órbita
O lançamento do Euclid está programado para sábado, às 16h12, hora de Portugal continental, em Cabo Canaveral, Flórida, Estados Unidos, através do lançador Falcon 9, da Space X.

A órbita operacional será um halo em torno de um ponto conhecido como ponto 2 (L2) de Lagrange Sol-Terra, a uma distância média de 1,5 milhões de quilómetros além da órbita da Terra.


Este local especial acompanha o ritmo da Terra enquanto orbitamos o Sol (e também hospeda os telescópios espaciais Gaia e Webb da ESA).
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