A partir desta segunda-feira, 1 de julho, entra em vigor na Suíça a nova lei penal sobre crimes sexuais, incluindo uma nova definição de violação baseada no princípio "não significa não". Até hoje, apenas a penetração vaginal não consentida de uma mulher por um homem era classificada como violação. Mas a controversa revisão, aprovada no Parlamento no verão passado, traz uma reforma significativa ao alargar os crimes de violação e coação sexual.
A nova definição de violação que entra hoje em vigor na Suíça baseia-se no critério da recusa. A partir de agora, um “não” é um “não" e qualquer penetração não consentida no corpo, seja oral, vaginal ou anal, de um homem ou de uma mulher será considerada violação.
Desde que a vítima tenha deixado claro ao agressor, por palavras ou gestos, que não quer ter relações sexuais e o agressor tenha intencionalmente ignorado esse desejo, explica em comunicado o Gabinete para a Promoção da Igualdade e a Prevenção da Violência (BPEV, na sigla em francês).
"Para que o agressor cometa uma violação, basta que a vítima diga não e não mude de ideias", explica a professora de Direito Penal da Universidade de Lausanne, Camille Perrier Depeursinge, ao jornal Le Temps.
"Para que o agressor cometa uma violação, basta que a vítima diga não e não mude de ideias", explica a professora de Direito Penal da Universidade de Lausanne, Camille Perrier Depeursinge, ao jornal Le Temps.
Ao contrário do que acontecia antes, em que só eram considerados crimes de violação ou de coação sexual se o autor obrigasse a vítima, mediante ameaça ou violência, a praticar atos de natureza sexual, e se a vítima tivesse mostrado alguma resistência.
A nova legislação salvaguarda também a possibilidade de a vítima encontrar-se em estado de choque, incapaz de exprimir a sua recusa ou de se defender, neste caso também será considerado como um "não" e o agressor terá de responder por violação ou coação sexual caso se tenha aproveitado do estado de choque da vítima.
O ato de stealthing também será punível
O stealthing ou ato de retirar discretamente o preservativo, durante uma relação sexual consentida, ou de não o utilizar sem o conhecimento do parceiro também passa a ser punível. A partir desta segunda-feira, 1 de julho, também a "pornografia de vingança" ou a divulgação de conteúdos sexuais não públicos sem o consentimento do parceiro também é proibida.
As organizações feministas suíças e de Direitos Humanos, como a Amnistia Suíça, congratulam-se do avanço necessário e histórico que põe fim a uma definição desatualizada de violação no país e que representa um passo em frente na proteção das vítimas.
Cyrielle Huguenot, responsável pelos direitos das mulheres na Amnistia Suíça, defende que "o princípio do consentimento deve ser consagrado na lei e na mente das pessoas". A porta-voz da Amnistia Internacional explica que "para que a importância do consentimento sexual seja reconhecida e praticada
por todos no quotidiano, é necessário continuar a concentrar os esforços
de prevenção na mensagem "Só um sim é um sim". Deve ficar claro que as
relações sexuais requerem consentimento mútuo", sublinha num comunicado de imprensa.
Com a introdução da nova lei penal sobre crimes sexuais, a organização estima que o número de queixas apresentadas às autoridades venha a aumentar. De acordo com um inquérito representativo realizado pela gfs.bern em 2019, 22 por cento das mulheres com mais de 16 anos na Suíça tinham sido sujeitas a atos sexuais durante a sua vida, embora apenas 8 por cento delas tenham apresentado queixa.
"A maioria permanece na sombra", de acordo com a Amnistia Suíça, apelando a que a nova lei seja acompanhada de outras medidas, tais como a avaliação, a formação da polícia e do Ministério Público ou prevenção e sensibilização em "larga escala", para "garantir que mais atos sejam denunciados e que os agressores sejam realmente responsabilizados", afirma Huguenot.