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"Não se encontrou nada". Marcelo aceita escala em Lisboa de navio associado a armas para Israel

por Carlos Santos Neves - RTP
“Não se encontrou nada relacionado com armas”, salientou Marcelo Rebelo de Sousa Nuno Veiga - Lusa

“Não se encontrou nada relacionado com armas”. O presidente da República corroborou assim, este domingo, os argumentos invocados pelo Governo para ter permitido a escala, no Porto de Lisboa, de um porta-contentores associado a um alegado esquema irregular de transporte de armamento para Israel. Uma passagem contestada pelo movimento BDS - Boicote, Desinvestimento, Sanções e questionada pelos grupos parlamentares de Bloco de Esquerda e PCP.

“Acabei de falar com o senhor ministro de Estado e dos Negócios Estrangeiros, que tinha tentado falar comigo durante a cerimónia militar, até para me falar de um comunicado que estava para sair ou tinha acabado de sair e o que se passa é que foi pesquisado tudo em pormenor e não se encontrou nada relacionado com armamento naquilo que foi descarregado em Lisboa, não houve carregamento em Lisboa”, começou por assinalar Marcelo Rebelo de Sousa, em Vila Viçosa, à margem do encerramento das comemorações dos 50 anos do Estado-Maior-General das Forças Armadas.

“Há sim algum trânsito, mas é para os Estados Unidos, não é para Israel”, prosseguiu.Segundo o chefe de Estado, Paulo Rangel “também explicou que o mesmo navio parou em vários portos, nomeadamente espanhóis, Barcelona e Valência, e Casablanca, em Marrocos”.

Questionado sobre o alegado envolvimento do porta-contentores em causa - NYSTED MAERSK – num “esquema dissimulado de abastecimento de material militar norte-americano a Israel”, como denunciaram o movimento BDS e o Bloco de Esquerda, Marcelo desvalorizou.
O navio foi fotografado na noite de sábado pelo repórter de imagem da RTP António Antunes.

“Isso não se sabe. Sabe-se que ele, para cá, carregou o que não era armamento e foi isso que o Governo me explicou. Agora, o que vai fazer daqui a três dias, a dez dias, a um ano ou dois anos ou três anos, no âmbito da atividade da empresa, isso Portugal, na altura devida, se encontrar razões para estar preocupado e considerar que é censurável, pode então tomar medidas”, rematou o presidente.
BE e PCP questionam
O porta-contentores com pavilhão de Hong Kong fez, este fim de semana, uma escala no Porto de Lisboa depois de ter largado de Casablanca, em Marrocos, na última quarta-feira. O destino do navio seria inicialmente Algeciras, mas o Estado espanhol terá proibido o uso deste porto. Abandonou entretanto a capital portuguesa.

O Bloco de Esquerda pediu esclarecimentos urgentes ao Governo sobre este caso, lembrando que Portugal sufragou uma resolução das Nações Unidas a defender a interrupção do fornecimento de armas e munições usadas pela máquina de guerra Israel contra civis.

Argumentos reforçados no sábado, em entrevista à RTP3, pelo líder parlamentar do partido, Fabian Figueiredo: “O Governo está errado. O Estado espanhol não autorizou que este navio atraque em Algeciras porque ele tem estado envolvido no transporte ilegal de armamento dos Estados Unidos para Israel”.
Em pergunta ao Ministério dos Negócios Estrangeiros, submetida ao Parlamento, o Bloco cita uma nota informativa enviada ao Governo português pelo BDS sobre a utilização do Porto de Lisboa pelo NYSTED MAERSK.

“Este navio é um dos envolvidos num esquema dissimulado de abastecimento de material militar norte-americano a Israel que, durante meses, transportou cargas ilegais desta natureza para o porto espanhol de Algeciras, onde o armamento era descarregado para ser depois levado até Israel noutros navios”, enfatiza o partido, apontando que o porta-contentores tem feito “em permanência a rota Algeciras-Israel”.Na semana passada, ainda segundo o Bloco, o Governo espanhol proibiu a utilização do Porto de Algeciras por outro dos navios “integrados neste esquema, o MAERSK DENVER, vindo dos Estados Unidos da América e agora estacionado em Tânger, Marrocos”.

O navio com escala em Portugal teria “chegada prevista a Algeciras no dia 9 de novembro (plausivelmente para receber a carga do MAERSK DENVER para a reconduzir a Israel)”, mas “foi reorientado também para Tânger”.

“Estes factos indiciam fortemente a continuação do envolvimento do NYSTED MAERSK no esquema de abastecimento ilegal de material militar a Israel”."Este navio prevê partir na manhã de amanhã, 10 de novembro, sem efetuar qualquer carga. Em resposta a pedido de esclarecimento, foi-nos reconfirmado que não é transportada qualquer carga militar, armamento ou explosivos", afiançava no sábado o Governo, em comunicado citado pela agência Lusa, apoiando-se no manifesto do porta-contentores.


Por seu turno, em requerimento igualmente submetido à Assembleia da República, o PCP aponta que, “de acordo com organizações internacionais e movimentos de solidariedade com o povo palestino em Portugal, este navio está envolvido no transporte de armas e munições, designadamente com origem nos EUA, para o exército de Israel, tendo, nos últimos meses, realizado cerca de quatro centenas de missões dessa natureza”.

Terá sido aliás essa razão que levou as autoridades do Estado Espanhol a impedir a acostagem do navio em Algeciras, razão próxima para a sua passagem por Lisboa. É sabido que, depois de Lisboa, o navio se dirige para Tânger, prosseguindo a rota para leste em direção a Israel”, referem ainda os comunistas.

“Em comunicado divulgado nesse mesmo dia, o Governo Português justificou a autorização dada para a acostagem do navio com o facto de não transportar qualquer carga militar, armamento ou explosivos. Nesse comunicado descreve-se circunstanciadamente a carga do navio descarregada no porto de Lisboa, somando no total 144 contentores. Acrescenta-se ainda que o navio transporta três contentores com componentes de aviões (peças de asas) com destino aos EUA”, lê-se no requerimento do Partido Comunista.

O esclarecimento prestado pelo Governo, pese embora o seu aparente detalhe, deixa vários problemas sem resposta. Desde logo, a razão pela qual o navio foi impedido de acostar no porto espanhol de Algeciras. Em segundo lugar, a rota subsequente do navio. Se for verdade que o navio se prepara para carregar material militar com destino a Israel, a descarga em Lisboa afigura-se como uma operação indispensável, permitindo libertar o navio para o transporte de armas e munições. Por fim, a origem dos três contentores com material aeronáutico a bordo do navio e alegadamente com destino aos EUA, sendo certo, como o comunicado do Governo reconhece, que o navio esteve no porto de Haifa no dia 25 de outubro”, enumera o PCP.

Entrevistada, na tarde deste domingo, na RTP3, a líder parlamentar comunista, Paula Santos, reforçou a ideia de que o Ministério das Infraestruturas e Habitação não esclareceu todas as dúvidas no comunicado da véspera.
"O comunicado do Governo não esclarece tudo. Faz de facto um detalhe grande do conjunto de mercadorias que são descarregadas em Lisboa, mas relativamente a um navio que tem já um histórico de envolvimento e transporte de armas e de munições para Israel, o Governo português deveria ter sido muito mais cauteloso", observou a deputada do PCP.

"Com esta descarga em Lisboa, a verdade é que liberta espaço para este navio poder ter outro tipo de carga. E bem sabemos, segundo aquilo que tem vindo a ser tornado público, que este navio vai prosseguir para Tânger e o seu destino é até Israel. Portanto, o Governo não tem qualquer garantia de que esta acostagem a Lisboa não tenha sido para facilitar esse carregamento com armamento para Israel", acentuou.
"Nenhuma arma"
A decisão do Governo de PSD e CDS-PP levou a protestos, nas imediações do Porto de Lisboa, por parte de ativistas defensores da causa palestiniana.

O próprio grupo transportador dinamarquês Maersk Denver veio entretanto afiançar que a carga do porta-contentores que atracou no Porto de Lisboa é legal e não inclui armas ou munições.

"A carga em questão está em total conformidade com as leis e regulamentos nacionais e internacionais. A carga a ser transbordada não inclui nenhuma arma ou munição militar", sublinha a Maersk Denver, em nota citada pela agência Lusa.
O grupo dinamarquês confirma, ainda assim, que a carga está a ser transportada em nome dos Estados Unidos, ao abrigo programa de cooperação de segurança com o Estado hebraico.

A Maersk afirma também ter facultado todos os dados nacessários "com bastante antecedência", cumprindo o procedimento estabelecido, acrescentando não tendo recebido qualquer indicação de preocupação por parte das autoridades portuguesas.

"As autoridades portuárias não utilizaram a oportunidade de inspecionar a carga, que permanece disponível para inspeção a qualquer momento", enfatiza.

A empresa adianta ter consultado as autoridades espanholas, tendo em vista apurar as razões que levaram a que a entrada do navio no país fosse vedada.

c/ Lusa
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