A Arménia e o Azerbaijão acusam-se mutuamente de terem quebrado uma “trégua humanitária” apenas poucas horas depois de ter entrado em vigor na disputada região de Nagorno-Karabakh. Esta região montanhosa a sul do Cáucaso está no centro do conflito entre a Arménia e o Azerbaijão, tendo sido intensificado em finais de setembro com avanços armados por parte dos dois Estados na tentativa de incorporarem esta região nas respetivas fronteiras
No entanto, a porta-voz do Ministério da Defesa arménio, Shushan Stepanyan, anunciou na rede social Twitter que o Azerbaijão quebrou o acordo apenas quatro minutos após a entrada em vigor: "O inimigo disparou artilharia na direção Norte entre as 00h04 e as 02h45 [21h04 e 23h45 de sábado em Lisboa] e lançou rockets em direção ao Sul entre as 02h20 e as 02h45 [23h20 e 23h45 de sábado em Portugal continental]". O Ministério da Defesa disse ainda que tomarão todas as “medidas necessárias” par chegar a um cessar-fogo e formas de o aplicar “no terreno”.
Mais tarde, o Azerbaijão também acusou a Arménia de quebrar a trégua. “O inimigo disparou nas proximidades da cidade de Jabrail, bem como nas aldeias desta região, usando morteiros e artilharia”, disse o Ministério da Defesa de Azerbaijão, acrescentando que o exército “tomou medidas de retaliação adequadas”. “Há vítimas e feridos de ambos os lados”, disseram as autoridades em Nagorno-Karabakh.
No sábado, o Azerbaijão já tinha acusado a Arménia de atacar Ganja, a sua segunda maior cidade, com um míssil balístico que matou pelo menos 13 civis e feriu 50 outros. Cerca de 20 prédios residenciais ficaram destruídos e as autoridades passaram horas a procurar vítimas e sobreviventes entre os escombros. Ganja já tinha sido atingida no passado domingo por um míssil, que matou dez pessoas e fez mais de 30 feridos.
"O lançamento destes mísseis contra localidades densamente povoadas mostra a mentalidade imoral e esquizofrénica da liderança político-militar da Arménia", escreveu Hikmat Hajiyev, conselheiro do Presidente do Azerbaijão, na rede social Twitter. Hajiyev frisou que a cidade de Ganja está longe da zona de conflito, pelo que o ataque, que qualificou como "crime de guerra", não respondeu a qualquer necessidade militar. “O Azerbaijão dará sua resposta e fará exclusivamente no campo de batalha”, anunciou Hajiyev.
Por sua vez, o Ministério da Defesa da Arménia negou o ataque em Ganja, embora os separatistas arménios em Nagorno-Karabakh tenham divulgado um comunicado listando as supostas instalações militares “legítimas” na cidade, sem assumirem responsabilidades pelo ataque.
O que está em causa no conflito?
Nagorno-Karabakh, uma região montanhosa a sul do Cáucaso, pertence ao Azerbaijão, mas está sob controlo de forças étnicas apoiadas pela Arménia desde que foi acordado um cessar-fogo em 1994 que encerrou uma guerra de seis anos pelo território.
Apesar do cessar-fogo, o impasse prevaleceu e voltou a entrar em escalada em setembro, com avanços armados por parte dos dois Estados na tentativa de incorporarem esta região nas respetivas fronteiras. Os últimos combates envolvem artilharia pesada, rockets e drones, tendo já provocado a morte de mais de 700 pessoas e a fuga de muitas outras, naquele que é já considerado o pior conflito desde o final da guerra, há 26 anos.
O novo surto de violência que dura há três semanas mina os esforços internacionais para acalmar as hostilidades entre os arménios cristãos e os azeris muçulmanos, envolvendo potências regionais como a Rússia e a Turquia. A Turquia, principal aliado do Azerbaijão, é acusada de interferir naquele conflito, assim como a Rússia, que fornece os arsenais dos dois lados. Drones e rockets fornecidos pela Turquia deram aos militares de Azerbaijão uma vantagem no campo de batalha, ajudando-os a superar as forças arménias que dependem, maioritariamente, de armas obsoletas da era soviética.
O Ministério dos Negócios Estrangeiros do Azerbaijão anunciou que a decisão da nova “trégua humanitária” foi baseada em declarações dos presidentes dos EUA, França e Rússia, que formam o grupo de Minsk, criado em 1991 para mediar o conflito de Nagorno-Karabakh.
O Azerbaijão insiste que tem o direito de reclamar as suas terras depois de os esforços do grupo de Minsk não terem conseguido qualquer progresso passadas três décadas. Desta forma, Baku tem pressionado para que o seu aliado, a Turquia, assuma um papel de destaque nas futuras negociações de paz.
Também o presidente francês, Emmanuel Macron, saudou o novo acordo e sublinhou que deve ser estritamente respeitado por ambas as partes. “Este cessar-fogo deve ser incondicional e estritamente observado por ambas as partes”, disse o gabinete do presidente em comunicado. “A França estará muito atenta a isso e permanecerá comprometida para que as hostilidades cessem permanentemente e que discussões honestas possam começar rapidamente”, acrescentou.
c/agências