Mortos e feridos em novas explosões no Líbano. Agora foram walkie-talkies

por Graça Andrade Ramos - RTP
Explosões no Líbano Houssam Shbaro - Anadolu via AFP

Registaram-se esta quarta-feira uma série de novas explosões no Líbano. Desta vez, de walkie-talkies. Ocorreram nos arredores de Beirute e no sul e leste do país.

Pelas 18h00 GMT (19h00 em Lisboa), o número de mortos havia subido de nove para 14 e o de feridos de 300 para mais de 450, de acordo com o ministério da Saúde libanês.

A maioria dos ferimentos registaram-se na zona do estômago e nas mãos, acrescentou a mesma fonte.

Foram ativadas pelo menos 30 ambulâncias da Cruz Vermelha Libanesa, "em resposta a múltiplas explosões em diversas áreas", com outros veículos de socorro em prontidão.

O ocorrido assemelha-se às explosões esta terça-feira, no Líbano e na Síria, de pagers usados pelo Hezbollah para coordenação entre os seus elementos.

Milhares destes aparelhos recém-adquiridos pela organização estariam armadilhados. O Hezbollah ordenou que os remanescentes fossem postos de lado.

As explosões dos pagers resultaram em pelo menos 12 mortos, incluindo duas crianças, assim como em 2.800 feridos.
Desliguem os telemóveis
Além dos arredores da capital libanesa, esta quarta-feira registaram-se igualmente explosões no sul e leste do Líbano, segundo a agência de notícias estatal libanesa e fontes próximas do grupo xiita, citadas pela agência France Presse (AFP).

De acordo com a AFP, pelo menos uma explosão em Dahiya, subúrbio a sul de Beirute e um bastião do Hezbollah, ocorreu durante um funeral de vítimas dos ataques do dia precendente.

O caos ficou instalado, com a população a desconfiar de quem estivesse a usar telemóveis ou outros aparelhos. 

Jornalistas da BBC afirmaram ter sido parados diversas vezes por pessoas a pedirem-lhes para deixarem de usar os telemóveis.

O exército libanês terá encontrado também um engenho explosivo numa ambulância perto do Hospital da Universidade Americana, que retirou e detonou de forma segura. 

Poderia ser um walkie-talkie, já que as equipas de emergência também os usam. Dezenas de médicos libaneses, que igualmente usam pagers, terão entretanto deixado de lado os seus aparelhos. O clima de medo é generalizado.

A Agência Nacional de Notícias do Líbano referiu que, em dois incidentes explodiram também sistemas de painéis solares, provocando dois focos de incêndios prontamente extinguidos.
Ponto de mira virado para Israel
Israel foi acusado pelo Hezbollah e pelo Governo libanês, de estar por trás da alegada operação de sabotagem de terça-feira e deverá ser igualmente responsabilizado por esta nova série de explosões nos meios de comunicação da guerrilha libanesa.

Telavive apenas comentou que acompanha a situação no país vizinho e não assumiu responsabilidade pelas explosões.

Alguns analistas duvidam da culpa de Israel e refletem que este tipo de sabotagem de comunicações, eventualmente por parte da Mossad, o serviço secreto israelita, seria mais eficaz se Israel estivesse a preparar uma grande ofensiva militar contra o Hezbollah. 

Não há contudo sinal dela, pelo que a procura de explicações deverá ser mais abrangente, concluem, uma vez que, agora, a guerrilha libenesa irá simplesmente procurar outros meios de comunicação.


A origem dos aparelhos deverá ser um dos focos a investigar.

A firma de Taiwan Gold Apollo afirmou esta quarta-feira, que os pagers usados pelo Hezbollah e que explodiram haviam sido fabricados pela empresa BAC Consulting., baseada em Budapeste, tendo sido apenas licenciada a sua marca.

Em resposta, o governo do primeiro-ministro húngaro, Viktor Orban, rejeitou que os pagers envolvidos estivessem estado alguma vez na Hungria.

"As autoridades húngaras estabeleceram que a empresa em questão é uma intermediária-comercial, que não detém nenhuma fábrica ou outro local de operações da Hungria", referiu na rede Facebook o porta-voz do executivo, Zoltan Kovacs, acrescentando que o país está a "colaborar" nas investigações.

O Irão condenou entretanto os ataques de terça e de quarta-feira, numa publicação do porta-voz do governo iraniano, Fatemeh Mohajerani, na rede social X.
ONU quer investigação
O secretário-geral da ONU, António Guterres, já veio criticar o ataque, dizendo que "objetos do quotidiano não devem ser transformados em armas".

Volker Turk, Alto Comissário das Nações Unidas para os Direitos Humanos, apelou a uma investigação independente às ocorrências na Síria e no Líbano.

"Deve realizar-se uma investigação independente, completa e transparente às circunstâncias destas explosões em massa e aqueles que ordenaram e realizaram uma tal ataque devem ser responsabilizados", referiu o Alto Comissário.

O ataque simultâneo a milhares de indivíduos, sem se saber quem empunhava ou guardava os aparelhos nem a sua localização, viola a lei internacional de direitos humanos e possivelmente a lei humanitária internacional, explicou Turk, em comunicado.

A nova vaga de explosões esta quarta-feira alarmou ainda mais António Guterres. De acordo com o seu porta-voz, em comunicado, "o secretário-geral apela a todos os atores envolvidos a exercerem a máxima contenção para evitar qualquer nova escalada".

Horas antes, sobre as explosões dos pagers, António Guterres considerava que estas indicavam "um risco grave de uma escalada dramática no Líbano". "A lógica de fazer estes aparelhos explodirem é fazê-lo como um ataque preventivo, antes de uma operação militar em larga escala", afirmou o secretário-geral da ONU.

O comunicado de Stéphane Dujarric pediu mais tarde às partes "para renovarem o compromisso de cumprir a resolução 1701 do Conselho das Nações Unidas", referindo ao acordo que pôs fim em 2006 à guerra entre Israel e o Hezbollah.
O Conselho de Segurança da ONU marcou uma reunião de emergência esta sexta-feira, para analisar a vaga de explosões.
Pagers em vez de telemóveis
O Hezbollah abandonou o uso de telemóveis como forma de comunicação entre os seus elementos, por serem demasiado fáceis de detetar. Há cinco meses substituiu-os pelos pagers e outros meios de comunicação, que agora estão a explodir em série.

Em fevereiro deste ano, os combatentes do grupo foram proibidos de levarem consigo telemóveis, quando estivessem em missão.

Os mais altos responsáveis do Hezbollah deixaram igualmente de levar os seus telemóveis para as suas reuniões, com receio das localizações serem interceptadas pela Mossad.

O líder da guerrilha libanesa, Hassan Nasrallah, ordenou aos seus operacionais num discurso televisivo, no início do ano, que destruíssem ou enterrassem os seus telemóveis e que fossem usados os pagers, aparelhos muito mais difíceis de detetar. Um alerta eventualmente demasiado público.

com agências
PUB