O ministro da Economia e Finanças moçambicano, Max Tonela, diz à Lusa que a falta de desfecho no julgamento das dívidas ocultas em Maputo não pode condicionar a aceitação de empréstimos para reformas necessárias no país.
"Nós estamos a fazer reformas que são necessárias para melhorar o quadro macroeconómico do país e também criar condições para uma melhor capacidade do setor privado fazer negócios e investimentos em Moçambique, criar condições para que nós possamos ter uma melhor capacidade de mobilização de financiamentos para a Economia, que incluiu financiamento ao setor privado", disse Tonela, em entrevista à Lusa na Embaixada de Moçambique em Washington.
De acordo com o governante, os fatores que justificam essas reformas "não têm nada a ver" com o facto de ainda não haver um desfecho para o julgamento das dívidas ocultas em Maputo, nem para as contestações em Londres.
O Fundo Monetário Internacional (FMI) anunciou no mês passado que chegou a acordo com Moçambique para a aplicação de um Programa de Financiamento Ampliado (PFA) até 2025, desembolsando ajuda financeira pela primeira vez desde o escândalo das dívidas ocultas.
"A equipa do FMI chegou a acordo técnico com as autoridades de Moçambique para um programa de três anos apoiado por um PFA no montante de 470 milhões de dólares [428 milhões de euros]", anunciou o líder da equipa do FMI no país, Alvaro Piris.
Esta é a primeira vez que o Fundo financia Moçambique desde a divulgação do chamado escândalo das dívidas ocultas, em 2016, embora tendo-se registado ajudas financeiras pontuais no seguimento de catástrofes específicas, como a pandemia de covid-19 ou os ciclones Kenneth e Idai, em 2019.
O FMI foi um dos vários parceiros internacionais que suspendeu a ajuda financeira na sequência da divulgação de empréstimos de empresas públicas que não tinham sido anunciados nem ao parlamento nem aos doadores internacionais, um processo conhecido como escândalo das dívidas ocultas e que envolveu vários governantes do executivo então liderado por Armando Guebuza e no qual o atual Presidente era ministro da Defesa, a área em que operavam as empresas públicas que contratualizaram os empréstimos escondidos.
Tonela encontra-se na capital norte-americana para participar nos Encontros de Primavera do FMI e Banco Mundial, afirmando que em todos os encontros teve a "oportunidade de reiterar o caminho que o seu Governo pretende prosseguir para realizar reformas que visam dinamizar a economia moçambicana, corrigir distorções e também aprimorar a capacidade de gestão".
Entre os vários encontros que teve durante a semana, o ministro destacou as reuniões com representantes do Governo norte-americano, sobretudo do Departamento do Tesouro e Departamento de Estado.
"Notamos com satisfação que recebemos respostas bastante positivas, um feedback bastante positivo em todos esses encontros, assim como mostraram disponibilidade em trabalhar com o Governo na busca de recursos adicionais para o financiamento dos nosso programas de desenvolvimento", detalhou o governante.
De acordo com o moçambicano, as reformas que o seu executivo está a desenvolver estão orientadas para promover e melhorar a boa governação, quer global do Estado, quer corporativa, para atrair investimentos internos e estrangeiros, mas também para levar a dívida para "níveis mais sustentáveis".
Questionado sobre o que é que mudou para não voltar a acontecer um escândalo como o de 2016, das dívidas ocultas, Max Tonela afirmou que foi adotado, entre outros, um conjunto de mudanças no quadro regulatório que permite um melhor controlo e monitorização de questões como conflitos de interesse de prestadores de serviço ao Estado, assim como foi intensificado o combate ao branqueamento de capitais.
"Mudou a perspetiva de termos no nosso processo de `governance` mecanismos de balanceamento e contra balanceamento, para permitir que todas as decisões desta natureza, que gerem endividamento, passem pelos processos de pareceres das entidades, como a Procuradoria-Geral da República, por exemplo, antes da sua aprovação ou implementação", acrescentou.
Num balanço da edição deste ano dos Encontros de Primavera do FMI e Banco Mundial, o ministro moçambicano frisou que o seu foco foi encontrar formas de mobilizar recursos para o país.
"Recursos para permitir que o Estado possa fazer face a desafios causados por vários fatores, alguns externos, como os efeitos das mudanças climáticas, que têm resultado no incremento da regularidade e intensidade dos ciclones que têm destruído infraestruturas, causado mortes e representam uma pressão adicional sobre o orçamento do Estado", disse, acrescentando que gerir e mobilizar recursos para enfrentar a ação terrorista em Cabo Delgado foi também um dos seus focos.