A Ordem dos Advogados de Moçambique (OAM) afirmou hoje que anular as eleições é "uma das equações que deve estar em cima da mesa" do diálogo que a instituição defende para travar a violência.
"O que estamos a dizer é que não há dados fidedignos, não há dados que nos possam levar a uma decisão que traga justiça eleitoral. Então, anular eleições é também uma das equações que deve estar em cima da mesa, naturalmente, nestas negociações", afirmou o bastonário da OAM, em conferência de imprensa, esta manhã, em Maputo.
Na ocasião, a bastonário apelou ao Presidente da República, Filipe Nyusi, para iniciar um "diálogo genuíno" com todos, incluindo com o candidato presidencial Venâncio Mondlane, assumindo a disponibilidade da OAM para mediar o processo.
"Quando foi da divulgação dos resultados, a própria Comissão Nacional de Eleições [CNE] assumiu que havia divergência de números, uma divergência gritante. Então, naquele momento, até podia ter sido a própria CNE a dizer, olha, não há condições para se avançar, portanto, os dados que estão aqui, que estamos a analisar, não são fiéis e como tal devemos repetir as eleições (...). Empurrou com a barriga para o Conselho Constitucional [CC]", acusou Carlos Martins.
Acrescentou que o próprio CC já notificou a CNE, na terça-feira, "para serem clarificadas estas mesmas irregularidades" levantadas por aquele órgão eleitoral.
"Assim como devem estar em cima da mesa outras soluções, como a própria constituição da CNE, a forma como nós olhamos para o próprio CC, se no futuro vale a pena continuarmos com este tipo de entidades. Se não vale a pena profissionalizarmos de outra forma os órgãos de gestão eleitoral, porque não podemos estar ciclicamente a viver em conflito, isso não podemos. E é isso que temos estado a viver desde 1994, todas as eleições terminaram em conflito", sublinhou.
Recordou que a população moçambicana já ultrapassa os 35 milhões, uma "sociedade muito jovem" de "quase 80%" nascidos entre os anos 2000 a 2005, que votaram nestas eleições gerais.
"O tipo de exigências de uma sociedade como essa é diferente. E mesmo o diálogo deve ser diferente. É o que estamos a dizer. Porque dantes negociávamos com uma força, que era a Renamo [Resistência Nacional Moçambicana, então com um braço armado]. Hoje não. (...) É importante que todas as forças vivas sejam chamadas. Nós não queremos banho de sangue em Moçambique", disse ainda Carlos Martins.
O anúncio pela Comissão Nacional de Eleições (CNE) de Moçambique a 24 de outubro, em que atribuiu a vitória a Daniel Chapo, apoiado pela Frente de Libertação de Moçambique (Frelimo, partido no poder desde 1975) na eleição a Presidente da República, com 70,67% dos votos, espoletou protestos populares, após um apelo do candidato presidencial Venâncio Mondlane.
Segundo a CNE, Venâncio Mondlane ficou em segundo lugar, com 20,32%, mas este afirmou não reconhecer estes resultados, que ainda têm de ser validados e proclamados pelo Conselho Constitucional.
Após protestos nas ruas que paralisaram o país, Mondlane convocou novamente a população para uma paralisação geral de sete dias, desde 31 de outubro, com protestos nacionais que têm degenerado em violência e intervenção da polícia, e uma manifestação concentrada em Maputo convocada para esta quinta-feira.
O ministro da Defesa Nacional de Moçambique, Cristóvão Chume, reconheceu terça-feira sinais de "intenção firme e credível de alterar" a ordem constitucional, avisando que, se o escalar da violência continuar, as Forças Armadas serão chamadas a "proteger" o Estado.
"Se o escalar da violência continuar não se coloca outra alternativa se não mudarmos as posições das forças no terreno e colocarmos as Forças Armadas a proteger aquilo que são os fins do Estado", disse o ministro, assumindo que neste momento os militares estão no terreno apenas no apoio às restantes forças de segurança e à população.