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Matéria negra do universo parece estar a enfraquecer e cientistas estão intrigados

por Mariana Ribeiro Soares - RTP
Telescópio James Web - NASA via Reuters

Descobertas recentes indicam que a matéria negra - a força misteriosa que impulsiona a expansão do universo - parece estar a enfraquecer, o que está a intrigar a comunidade científica. A descoberta pode implicar uma mudança de paradigma na nossa compreensão do universo, sugerindo que em vez de um "big freeze", o universo poderá terminar com um big bang reverso - um "big crunch".

A matéria negra pode ser descrita como o tecido do universo, sendo estimada em cerca de 70% do cosmos. É toda a mancha que compõe o universo, para além dos planetas, luas, estrelas, galáxias, sendo por isso a força misteriosa responsável pela expansão do cosmos.

Esta matéria foi descoberta no final da década de 1990, quando os astrónomos usaram explosões distantes de supernovas para investigar como a taxa de expansão cósmica mudou ao longo do tempo.

A expectativa era que após o Big Bang, que criou o Universo, a sua expansão desaceleraria sob a força da gravidade. Mas, em vez disso, os cientistas descobriram que a expansão estava a acelerar, impulsionada por alguma força desconhecida que os cientistas chamaram de matéria negra.

Esta matéria foi assumida como uma força constante, o que, de acordo com a comunidade científica, significaria que o universo continuaria a expandir-se ad aeternum, chegando a um ponto em que tudo estaria tão distante que nem a luz poderia preencher o vazio entre as galáxias – um cenário a que deram o nome de “big freeze”.

No entanto, descobertas recentes ameaçam deitar por terra esta teoria. Estudos da equipa do Instrumento Espectroscópico da Matéria Negra (DESI), no Observatório Nacional Kitt Peak, no Arizona, sugerem que a matéria negra pode, afinal, não ser constante e está mesmo a enfraquecer.

O ano passado, quando investigadores do DESI encontraram indícios de que a força exercida pela matéria negra tinha mudado ao longo do tempo, muitos cientistas pensaram que era uma falha nos dados. No entanto, um ano depois, os dados parecem confirmar as suspeitas. Os resultados mostram que a matéria negra atingiu um pico de força há milhares de milhões de anos e agora está cerca de 10% mais fraca.

Isto significa que se a matéria negra continuar a diminuir até ao ponto em que se torna negativa, o fim do universo será num cenário semelhante a um big bang reverso, designado por “big crunch”.

“O que estamos a descobrir é que, sim, há algo a afastar as galáxias umas das outras, mas não é constante. Está a desacelerar”, disse o professor Carlos Frenk, cosmólogo da Universidade de Durham, no Reino Unido, e membro da colaboração Desi, citado pelo Guardian.

"A evidência é mais forte agora do que era antes", disse à BBC o professor Seshadri Nadathur, da Universidade de Portsmouth. "Também realizamos muitos testes adicionais em comparação ao primeiro ano, e eles deixaram-nos confiantes de que os resultados não são motivados por algum efeito desconhecido nos dados que não consideramos", disse.
Comunidade científica intrigada e dividida
O caso está a intrigar a comunidade científica. Se for realmente verdade, a descoberta poderá ser uma das maiores no mundo da astronomia e derrubaria o modelo cosmológico padrão dos astrónomos. Muitos deles mudaram, nos últimos meses, de opinião, passando de uma posição de ceticismo para apoiar a descoberta.

“Olhei para os dados de forma cuidadosa. Para mim, este é um resultado robusto. Estamos a testemunhar a derrube do velho paradigma e o surgimento de um novo paradigma”, disse Frenk.

"A matéria negra parece ser ainda mais estranha do que pensávamos", disse a professora Catherine Heymans, da Universidade de Edimburgo, à BBC.

"Em 2024, os dados eram novos, ninguém tinha a certeza sobre eles e as pessoas achavam que era preciso fazer mais estudos. Mas agora há mais dados e muito escrutínio por parte da comunidade científica, então, embora ainda haja uma possibilidade de que a ‘falha’ desapareça, também há a possibilidade de que estamos a aproximar-nos de uma descoberta realmente significativa", disse.

Outros permanecem mais cautelosos e dizem que é preciso mais dados. “A minha conclusão desta análise é que os cálculos ainda não fornecem evidências decisivas sobre a evolução da matéria negra. Eles podem mostrar à medida que DESI reúne mais dados”, disse George Efstathiou, professor na Universidade de Cambridge.

“É um momento dramático”, disse à BBC o professor Ofer Lahav, astrónomo da University College London e colaborador de DESI, considerando que “podemos estar a testemunhar uma mudança de paradigma na nossa compreensão do universo”.

“É justo dizer que não temos ideia do que seja a matéria negra ou energia negra”, disse o professor ao Guardian. “Mas vocês também podem olhar para isto de forma mais positiva. Durante 20 anos, ficamos presos à matéria negra. Agora, os físicos têm novas perguntas”, asseverou.
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