Centenas de milhares de habitantes de Hong Kong voltaram este domingo a preencher as ruas da cidade em protesto contra a lei de extradição. O Executivo local suspendeu na véspera o diploma, mas a população da Região Administrativa Especial quer garantias de que este nunca veja a luz do dia. Entre os ativistas, fala-se de “terror de detenções”.
O objetivo desta terceira vaga de contestação é manter aceso o lume da pressão sobre a chefe do Executivo local, Carrie Lam, figura largamente conotada com as autoridades de Pequim.
Fátima Marques Faria, José Luís Carvalho - RTP
Lam suspendeu no sábado o projeto de lei que abre caminho a extradições para a China, a raiz de manifestações que dão voz a receios de eventuais atropelos dos Direitos Humanos às mãos da justiça continental. Um gesto insuficiente para aplacar a ira nas ruas. Exige-se, nos protestos deste domingo, que a lei caia em definitivo por terra. Mas não só.
Pede-se mesmo a demissão da governante e um pedido oficial de desculpas pela violência.Ao abrigo da fórmula “um país, dois sistemas”, Hong Kong, antiga colónia britânica, vive sob um estatuto especial, desde logo a nível judicial. Quadro que deverá esgotar-se em 2047.
Outro dos alvos dos protestos é a própria polícia. A repressão exercida na passada quarta-feira, naquele que foi já retratado como o pior episódio de violência política em Hong Kong desde o regresso à soberania chinesa, em 1997, assume, para os manifestantes, a forma de um trauma: entre os ativistas, invoca-se um “terror de detenções”.
“Polícia de Hong Kong, tu deves proteger-nos, não alvejar-nos”, lia-se numa faixa empunhada este domingo, segundo a reportagem da France Presse.
Há quatro dias, ficaram feridas 80 pessoas, incluindo 22 agentes das forças de segurança. No sábado, um homem perdeu a vida ao cair do telhado de um centro comercial da cidade, onde exibia uma faixa: “Retirem por completo a lei de extradição chinesa. Não somos amotinados. Libertem os estudantes e os feridos”.
Ouvido pela AFP, o ativista da Frente de Direitos Humanos Cívicos Jimmy Sham descreveu o projeto de lei como “uma faca” que “quase atingiu o coração” da população de Hong Kong. “Agora o Governo diz que não o forçará mais, mas recusa-se também a abandoná-lo”, insistiu.
“Lacaios de forças estrangeiras”
A publicação estatal chinesa Diário do Povo escreve este domingo que Carrie Lam conta com o “firme apoio” do Governo de Pequim. E condena os ativistas, chamando-os de “lacaios” ao serviço de interesses estrangeiros.
“Algumas pessoas em Hong Kong têm dependido de estrangeiros ou dos jovens para se promoverem, servindo como os peões ou os lacaios de forças estrangeiras anti-China”, comenta o jornal.
Para acrescentar: “Isto conta com a oposição absoluta de todo o povo chinês, incluindo a vasta maioria dos compatriotas de Hong Kong”.
De Londres saiu um misto de aplauso às autoridades da Região Administrativa Especial e incentivo aos manifestantes. No Twitter, o ministro britânico dos Negócios Estrangeiros, Jeremy Hunt, saudou o Executivo de Hong Kong por “observar as preocupações dos corajosos cidadãos que se ergueram pelos seus direitos humanos”.
Well done HK Government for heeding concerns of the brave citizens who have stood up for their human rights. Safeguarding the rights and freedoms in the Sino-British Joint Declaration is the best future for HK and Britain stands behind this legally-binding agreement.
— Jeremy Hunt (@Jeremy_Hunt) 15 de junho de 2019
No sábado, ao anunciar a suspensão sine die das controversas emendas legislativas, a chefe do Executivo local apelou a “uma nova oportunidade” e disse lamentar a violência. Mas não foi ao ponto de um pedido de desculpas.
Lam reiterou que a nova lei de extradição é fundamental para impedir que Hong Kong se converta num santuário para criminosos.
c/ agências