Manifestantes de Hong Kong não desistem do fim da lei de extradição

por Carlos Santos Neves - RTP
O Executivo de Hong Kong suspendeu o diploma que tem motivado sucessivas vagas de protestos, mas a população reclama garantias adicionais Tyrone Siu - Reuters

Centenas de milhares de habitantes de Hong Kong voltaram este domingo a preencher as ruas da cidade em protesto contra a lei de extradição. O Executivo local suspendeu na véspera o diploma, mas a população da Região Administrativa Especial quer garantias de que este nunca veja a luz do dia. Entre os ativistas, fala-se de “terror de detenções”.

“Retirem a lei maléfica”, gritaram manifestantes vestidos de negro, a caminho do Conselho Legislativo de Hong Kong, no centro da cidade – o mesmo percurso traçado há uma semana numa manifestação de proporções históricas que terá juntado um milhão de pessoas.

O objetivo desta terceira vaga de contestação é manter aceso o lume da pressão sobre a chefe do Executivo local, Carrie Lam, figura largamente conotada com as autoridades de Pequim.

Fátima Marques Faria, José Luís Carvalho - RTP

Lam suspendeu no sábado o projeto de lei que abre caminho a extradições para a China, a raiz de manifestações que dão voz a receios de eventuais atropelos dos Direitos Humanos às mãos da justiça continental. Um gesto insuficiente para aplacar a ira nas ruas. Exige-se, nos protestos deste domingo, que a lei caia em definitivo por terra. Mas não só.

Pede-se mesmo a demissão da governante e um pedido oficial de desculpas pela violência.Ao abrigo da fórmula “um país, dois sistemas”, Hong Kong, antiga colónia britânica, vive sob um estatuto especial, desde logo a nível judicial. Quadro que deverá esgotar-se em 2047.


Outro dos alvos dos protestos é a própria polícia. A repressão exercida na passada quarta-feira, naquele que foi já retratado como o pior episódio de violência política em Hong Kong desde o regresso à soberania chinesa, em 1997, assume, para os manifestantes, a forma de um trauma: entre os ativistas, invoca-se um “terror de detenções”.

“Polícia de Hong Kong, tu deves proteger-nos, não alvejar-nos”, lia-se numa faixa empunhada este domingo, segundo a reportagem da France Presse.

Há quatro dias, ficaram feridas 80 pessoas, incluindo 22 agentes das forças de segurança. No sábado, um homem perdeu a vida ao cair do telhado de um centro comercial da cidade, onde exibia uma faixa: “Retirem por completo a lei de extradição chinesa. Não somos amotinados. Libertem os estudantes e os feridos”.

Ouvido pela AFP, o ativista da Frente de Direitos Humanos Cívicos Jimmy Sham descreveu o projeto de lei como “uma faca” que “quase atingiu o coração” da população de Hong Kong. “Agora o Governo diz que não o forçará mais, mas recusa-se também a abandoná-lo”, insistiu.
“Lacaios de forças estrangeiras”
A publicação estatal chinesa Diário do Povo escreve este domingo que Carrie Lam conta com o “firme apoio” do Governo de Pequim. E condena os ativistas, chamando-os de “lacaios” ao serviço de interesses estrangeiros.

“Algumas pessoas em Hong Kong têm dependido de estrangeiros ou dos jovens para se promoverem, servindo como os peões ou os lacaios de forças estrangeiras anti-China”, comenta o jornal.

Para acrescentar: “Isto conta com a oposição absoluta de todo o povo chinês, incluindo a vasta maioria dos compatriotas de Hong Kong”.

De Londres saiu um misto de aplauso às autoridades da Região Administrativa Especial e incentivo aos manifestantes. No Twitter, o ministro britânico dos Negócios Estrangeiros, Jeremy Hunt, saudou o Executivo de Hong Kong por “observar as preocupações dos corajosos cidadãos que se ergueram pelos seus direitos humanos”.


No sábado, ao anunciar a suspensão sine die das controversas emendas legislativas, a chefe do Executivo local apelou a “uma nova oportunidade” e disse lamentar a violência. Mas não foi ao ponto de um pedido de desculpas.

Lam reiterou que a nova lei de extradição é fundamental para impedir que Hong Kong se converta num santuário para criminosos.

c/ agências
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