A empresária angolana Isabel dos Santos está constituída arguida por suspeitas de má gestão e desvio de fundos no decurso da sua passagem pela petrolífera estatal Sonangol, anunciou esta quarta-feira a Procuradoria-Geral da República de Angola.
O anúncio partiu do procurador-geral angolano, Hélder Pitta Grós, em conferência de imprensa na capital daquele país africano.
Segundo o procurador-geral, o processo de inquérito, instaurado após uma denúncia do presidente do conselho de administração da Sonangol, Carlos Saturnino, foi já convertido em processo-crime. E Isabel dos Santos não é a única arguida.
Sarju Raikundalia, ex-administrador financeiro da Sonangol, Mário Leite da Silva, gestor de Isabel dos Santos e presidente do Conselho de Administração do BFA, Paula Oliveira, amiga de Isabel dos Santos e administradora da NOS e Nuno Ribeiro da Cunha são igualmente arguidos no processo. Estão todas ausentes de território angolano, assinalou Hélder Pitta Grós.Isabel dos Santos diz-se vítima de um ataque
político e considera as alegações de que é alvo “completamente
infundadas”. Promete “lutar nos tribunais internacionais”.
O inquérito à gestão de Isabel dos Santos na petrolífera estatal angolana, que decorreu de junho de 2016 a novembro de 2017, foi aberto após o sucessor, Carlos Saturnino, levantar suspeitas relativas a “transferências monetárias irregulares ordenadas pela anterior administração da Sonangol e outros procedimentos incorretos”.
“Neste momento, a preocupação é notificar e fazer com que venham voluntariamente à justiça”, vincou o procurador-geral angolano, acenando em seguida com a possibilidade de vir a recorrer a instrumentos legais como mandados de captura internacionais.
Pitta Grós disse ainda que Isabel dos Santos nunca manifestou diretamente interesse em colaborar com as autoridades angolanas: “Na prática nada aconteceu, por isso não podemos confirmar que ela esteja disposta ou não a negociar, o quê, em que termos, era necessário que fosse mais explicita caso seja a sua vontade”.
Pouco antes destas declarações, a agência Lusa noticiara que Pitta Grós iria reunir-se na quinta-feira com a procuradora-geral portuguesa, Lucília Gago, em Lisboa. Uma informação posteriormente confirmada à RTP pelo gabinete de imprensa da Procuraradoria-Geral da República. O encontro terá lugar às 15h00.
Já esta quarta-feira o primeiro-ministro, António Costa, pronunciou-se pela primeira vez sobre o caso Luanda Leaks e o envolvimento da filha do ex-Presidente angolano José Eduardo dos Santos com o tecido empresarial e o sistema financeiro portugueses.
“Aquilo que nos compete fazer é colaborar totalmente com as autoridades angolanas, como temos vindo a fazer”, começou afirmar Costa. “Espero que este caso permita à justiça angolana tratar aquilo que tem a tratar e às empresas portuguesas continuar a desenvolver a sua atividade dentro do maior quadro de estabilidade que seja possível”, completou.
Luanda Leaks. O que está em causa?
No domingo, o Consórcio Internacional de Jornalismo destapou um acervo de mais de 715 mil ficheiros, sob o título Luanda Leaks. Os dados postos a descoberto mostram alegados esquemas financeiros de Isabel dos Santos e do marido, Sindika Dokolo, que lhes terão permitido apoderarem-se de verbas do erário público de Angola – com recurso a offshores.Isabel dos Santos abandonou entretanto o Eurobic. A
saída foi comunicada ao Banco de Portugal. Em comunicado, o banco diz
que a decisão irá concretizar-se o mais brevemente possível,
acrescentando que a acionista renunciou em definitivo ao exercício de
direitos de voto.
A empresária terá montado um esquema de ocultação tendo em vista o desvio de mais do equivalente a 90 milhões de euros para uma empresa sediada no Dubai e que tinha como única acionista declarada a portuguesa Paula Oliveira, amiga de Isabel dos Santos e administradora da NOS.
Os ficheiros envolvem também os nomes do advogado pessoal de Isabel dos Santos, o português Jorge Brito Pereira - sócio da Uría Menéndez, o escritório de Proença de Carvalho -, o presidente do conselho de administração da Efacec, Mário Leite da Silva - CEO da Fidequity, empresa com sede em Lisboa detida por Isabel dos Santos e o seu marido -, e Sarju Raikundalia, ex-administrador financeiro da Sonangol.
Os documentos indicam que Isabel dos Santos e Sindika Dokolo detêm participações acionistas em empresas e bens, como imobiliários, em diferentes países, nomeadamente Angola, Portugal, Reino Unido, Dubai e Mónaco.
c/ Lusa