Em entrevista ao Telejornal, o ministro dos Negócios Estrangeiros revelou esta terça-feira que o embaixador português na capital russa foi chamado para consultas a Lisboa, que continua sem expulsar nenhum diplomata russo, ficando fora de um movimento diplomático de que fizeram parte outros 26 países, incluindo o Reino Unido, Espanha, França e Estados Unidos. Augusto Santos Silva explica que Portugal “usa da prudência” no plano bilateral de forma a “defender os interesses nacionais”.
Augusto Santos Silva traça "planos distintos" na ação da política externa de Lisboa perante a Rússia. Enquanto membro da NATO, o país subscreveu "todas as decisões que a aliança até agora tomou" e, enquanto Estado-membro da União Europeia, subscreveu a decisão do Conselho Europeu, que chamou o embaixador da União Europeia em Moscovo para consultas.
À margem das instituições multilaterais, Portugal "usa da prudência de forma a defender os interesses nacionais" no plano das relações bilaterais com Moscovo, refere o chefe da diplomacia portuguesa. Questionado sobre que interesses concretos são esses, o ministro destaca que este é um assunto em que o país é soberano e ainda a "lógica de não-confrontação há que caracteriza muito a nossa política externa".
"Concertação da posições"
Augusto Santos Silva destacou ainda os interesses "diretos e indiretos" de Portugal noutras latitudes, para além da pertença à União Europeia e à Aliança Atlântica.
"O nosso interesse é de prosseguirmos a nossa política externa e mantermos as pontes de contacto com todas as regiões do mundo, que nos caracteriza e valoriza a nossa inserção global. Somos uma nação europeia, atlântica, e somos também uma nação global que tem uma capacidade própria de falar com todas as regiões do mundo", referiu o ministro.
Santos Silva não vê nesta decisão traços de falta de solidariedade para com países aliados desde há vários séculos. "No plano bilateral, conduzimos a nossa própria política externa, que é solidária com o Reino Unido, com os Estados Unidos, mas que também tem interesses próprios", assevera.
Nesta entrevista à RTP, o ministro refere que não vê divergências e pressões entre os países sobre que posição tomar em relação à Rússia, mas antes uma "concertação de posições".
"Como em tudo na vida há diferentes opiniões, também aqui haverá. Nem todas as políticas externas têm a prudência da política externa portuguesa, nem todas as políticas externas têm uma vocação global da política externa portuguesa. Eu não falo pelos outros, falo pelo meu país. Enquanto estado-membro de organizações internacionais, Portugal contribui sempre para as decisões. Enquanto Estado soberano, adequa as medidas que toma", sublinha.
Resposta portuguesa pode ser alterada
O ministro refere, no entanto, que o processo agora iniciado é "dinâmico" e que muita coisa poderá ser alterada, inclusive a dimensão da resposta portuguesa. Até ao momento, mais de 140 diplomatas russos foram expulsos de 26 países, entre eles os Estados Unidos, França e Espanha. Só Washington decidiu expulsar 60 representantes e encerrar um consulado em território norte-americano.
Augusto Santos Silva refere que, para já, a decisão portuguesa foi a de chamar o embaixador para consulta, mas admite que a posição portuguesa possa mudar "como a de todos" os restantantes países.
"Uns tomaram como ponto de partida uma decisão de expulsão, noutros casos foi a chamada para consulta do embaixador. (...) Nenhuma medida do ponto de vista político-diplomático pode ser tida hoje como estando de fora", reitera o ministro.
Responsabilidade "absoluta"
No entanto, apesar da firmeza necessária na resposta a Moscovo, Santos Silva destaca que é necessário manter o diálogo político. "Este é um processo que ainda está provavelmente no seu início. É preciso evitar qualquer lógica de escalada", ressalva o ministro.
E não obstante uma posição mais cautelosa por parte da diplomacia portuguesa, Augusto Santos Silva não mostra ter dúvidas sobre as ligações da Rússia ao ataque de 4 de março em Salsbury, no sul de Inglaterra, contra o ex-espião russo Sergei Skripal.
Na visão do ministro, "tudo leva a crer" que a responsabilidade da Federação Russa "seja absoluta" neste incidente que está na origem do imbróglio político e institucional entre Moscovo e o Ocidente.
O chefe da diplomacia portuguesa considera ainda que faltam "explicações plausíveis" por parte das autoridades russas, destacando que está em causa o uso de armas químicas em território europeu pela primeira vez "desde a II Guerra Mundial".
"Esperamos que não haja uma escalada. (...) Uma escalada não é a melhor maneira de resolver ester problema, que é muito sério", reforça o ministro.