Líderes da União Europeia discutem investimento reforçado em defesa e garantias à Ucrânia

por Cristina Sambado - RTP
Jonas Roosens - ANP via AFP

Os líderes dos 27 países da União Europeia e Volodymyr Zelensky reúnem-se esta quinta-feira, em Bruxelas, para uma cimeira extraordinária sobre a Ucrânia, destinada a reforçar a defesa europeia, após a contenda entre Donald Trump e o presidente ucraniano na Casa Branca.

Duas semanas após o terceiro aniversário da guerra na Ucrânia, causada pela invasão russa, e quando existem tensões entre a Administração norte-americana e a liderança ucraniana, os chefes de Governo e de Estado da União Europeia vão tentar um alcançar um consenso sobre as primeiras medidas para tornar a Europa mais soberana, autónoma e equipada na área da defesa e da segurança.

No encontro, os líderes da União Europeia vão comprometer-se a “acelerar a mobilização dos instrumentos e financiamentos necessários” para tornar o bloco comunitário “mais forte e mais capaz no domínio da segurança e da defesa, contribuindo positivamente para a segurança global e transatlântica e complementando a NATO (Organização do Tratado do Atlântico Norte)”.

Na carta-convite enviada aos líderes da União Europeia, o presidente do Conselho Europeu, António Costa, disse esperar “as primeiras decisões a curto prazo”, o que passa por acordar politicamente gastar mais com defesa, individualmente e em conjunto.

Num contexto geopolítico totalmente alterado pela posição do presidente dos Estados Unidos, a Comissão Europeia apresentou um plano para “Rearmar a Europa”, com o objetivo de mobilizar cerca de 800 mil milhões de euros.Entre as possibilidades mencionadas está a possibilidade de os Estados-Membros aumentarem significativamente as suas despesas militares sem que isso seja tido em conta no seu défice”.

A Europa está a enfrentar um perigo claro e imediato numa escala que nenhum de nós experimentou na sua vida adulta”, afirmou Ursula von der Leyen numa carta dirigida aos líderes dos 27.

A Comissão Europeia - o órgão executivo da União - também apresentou propostas que, segundo Ursula von der Leyen, poderiam mobilizar até 800 mil milhões de euros para a defesa europeia, incluindo um plano para obter até 150 mil milhões de euros para emprestar aos governos da UE.
"Rearmar a Europa"
Em causa está o plano "Rearmar a Europa", assente em cinco vertentes: um novo instrumento ao nível da União Europeia para circunstâncias extraordinárias (como o que foi criado para assistência financeira aos países em empréstimos a condições favoráveis durante a covid-19 para evitar o desemprego), a ativação da cláusula de salvaguarda nacional das regras orçamentais para evitar procedimentos por défice excessivo (para aumento da despesa pública com defesa, num máximo de 1,5 por cento por ano), a reafetação de verbas de outros fundos (como da Coesão), verbas do Banco Europeu de Investimento e ainda capital privado.Entre 2021 e 2024, a despesa total dos Estados-membros com a defesa aumentou mais de 30 por cento, ascendendo a um montante estimado de 326 mil milhões de euros, o equivalente a cerca de 1,9 por cento do Produto Interno Bruto (PIB) da União Europeia.

Na carta-convite enviada aos chefes de Governo e de Estado da União, o presidente do Conselho Europeu, António Costa, afirmou existir “uma nova dinâmica, que deverá conduzir a uma paz global, justa e duradoura” na Ucrânia.

A reunião de alto nível desta quinta-feira visa discutir as contribuições europeias para as garantias de segurança necessárias à Ucrânia, focando-se em tornar o país mais forte na mesa de negociações com vista ao fim do conflito causado pela invasão da Rússia.

Os 27 querem agora reforçar esse apoio e começar a analisar mais apoios monetários para a defesa militar do país.

Na missiva enviada aos líderes, o presidente do Conselho Europeu disse ainda esperar “as primeiras decisões a curto prazo”, o que passa por acordar politicamente gastar mais com defesa, individualmente e em conjunto.
Presidente ucraniano presente na reunião
O presidente ucraniano, Volodymyr Zelensky, junta-se aos líderes dos 27 países da União Europeia na cimeira em Bruxelas. No entanto, a demonstração de solidariedade pode ser prejudicada pela recusa da Hungria em subscrever uma declaração de apoio a Kiev.

No que respeita à Ucrânia, quase todos os líderes da União Europeia estão empenhados em tranquilizar Zelensky, para que este possa continuar a contar com o apoio de Bruxelas, depois do seu confronto com Trump na Sala Oval, na semana passada, que levou a Casa Branca a decidir suspender a ajuda militar à Ucrânia.

No entanto, os 27 ainda não conseguiram chegar a acordo sobre uma proposta da responsável pela diplomacia da União Europeia, Kaja Kallas, para estabelecer um valor para a ajuda militar que irão prometer à Ucrânia este ano.

O objetivo será um compromisso de fornecer pelo menos 30 mil milhões de euros este ano, tal como fez em 2024.Desde o início da guerra em fevereiro de 2022, a União Europeia e os seus Estados-membros disponibilizaram quase 135 mil milhões de euros em apoio à Ucrânia, incluindo cerca de 49 mil milhões de euros para as forças armadas ucranianas, tendo ainda avançado com 16 pacotes de sanções contra a Rússia.

O plano "Rearmar a Europa" prevê que cada Estado-membro contribua de acordo com a dimensão da sua economia, no meio de queixas dos Estados nórdicos e bálticos e dos Países Baixos de que alguns países maiores, como a França, a Itália e a Espanha, não estão a fazer o suficiente.

Paris, Roma e Madrid rejeitam essas acusações, argumentando que as estimativas públicas não refletem o verdadeiro valor da sua ajuda militar à Ucrânia.

No entanto, não é claro se o texto sobre a Ucrânia será aprovado por todos os 27 líderes, devido à ameaça de veto do primeiro-ministro húngaro, Viktor Orbán, um dos principais aliados de Trump e que também mantém laços de amizade com o Kremlin.

Numa carta enviada ao presidente do Conselho Europeu, António Costa no sábado, Orbán afirmou que existem “diferenças estratégicas na nossa abordagem à Ucrânia que não podem ser ultrapassadas”.
Zelensky apoia visão de Macron
O presidente ucraniano, Volodymyr Zelensky, deu na quarta-feira o seu apoio à "visão clara" do homólogo francês, Emmanuel Macron, para uma paz na Ucrânia com garantias de segurança "fortes e de longo prazo".

Num discurso a partir do Eliseu, o chefe de Estado francês defendeu na quarta-feira que "o caminho para a paz não pode passar pelo abandono da Ucrânia", e que a paz "não pode ser construída a qualquer preço e sob o comando russo, e não pode ser a capitulação da Ucrânia".

Zelensky recorreu mais tarde às redes sociais para agradecer a Macron "pela sua visão clara e pelos esforços conjuntos para alcançar a paz".

"A paz tem de ser real e não apenas uma palavra - não pode significar a capitulação ou o colapso da Ucrânia. Tem de ser justa, fiável e duradoura, e só pode ser alcançada através de garantias de segurança fortes e de longo prazo - para a Ucrânia, a Europa e o mundo inteiro", frisou o presidente ucraniano na rede social X.


"Apreciamos profundamente a liderança e os esforços de todos os que apoiam a Ucrânia e reforçam as capacidades de defesa da Europa. Aguardamos com expetativa a oportunidade de trabalhar em conjunto nos próximos dias para dar passos em direção à paz", acrescentou.

A Administração de Donald Trump, que tomou a iniciativa de negociar diretamente com a Rússia uma solução para o conflito iniciado com a invasão russa da Ucrânia há três anos, tem defendido que constitui garantia de segurança suficiente a assinatura de um acordo-quadro entre Washington e Kiev abrindo a porta à exploração de minerais ucranianos por empresas norte-americanas.

Washington tem escalado a pressão sobre Zelensky para assinar o acordo de exploração de minerais como primeiro passo para um cessar-fogo, mas Kiev considera serem necessárias mais garantias de segurança e uma visão de longo prazo para a cessação de hostilidades.

Num contexto de aproximação entre Moscovo e Washington, que suspendeu a ajuda militar a Kiev, Macron referiu no discurso que irá reunir em Paris, na próxima semana, os chefes de Estado-Maior dos países dispostos a garantir a futura paz na Ucrânia.
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"Perante este mundo de perigos, seria uma loucura permanecer espetador", acrescentou o chefe de Estado francês.

Para Macron, a paz na Ucrânia "implicará também, talvez, o envio de forças europeias", que "não iriam combater hoje, não iriam combater na linha da frente, mas estariam lá, pelo contrário, assim que a paz fosse assinada, para garantir o seu pleno respeito".

A ameaça russa está aí e afeta-nos", sem "conhecer fronteiras", acrescentou Macron.

Macron anunciou ainda "investimentos adicionais" na defesa europeia sem aumentar os impostos.

"Os Estados-membros poderão aumentar as suas despesas militares sem que isso seja tido em conta no seu défice", acrescentou.

Referindo-se a "acontecimentos históricos em curso que estão a virar a ordem mundial de pernas para o ar", o presidente francês falou da "situação internacional e das suas consequências" para a França e para a Europa.

"Os Estados Unidos, nosso aliado, mudaram a sua posição sobre esta guerra, apoiam menos a Ucrânia e estão a lançar dúvidas sobre o que vai acontecer a seguir", sublinhou Macron, acrescentando que a Europa está "a entrar numa nova era", em que a segurança e a prosperidade são incertas.

Macron, anunciou ainda que quer "abrir o debate estratégico" sobre a proteção da Europa pelas armas nucleares francesas com os aliados dispostos a garantir a paz futura na Ucrânia e a proteção do continente europeu.

"Respondendo ao apelo histórico do futuro chanceler alemão [Friedrich Merz], decidi abrir o debate estratégico sobre a proteção dos nossos aliados no continente europeu pela nossa capacidade de dissuasão", declarou o Presidente francês.

A França é a única potência nuclear da União Europeia e o chefe de Estado francês afirmou recentemente estar pronto para um "diálogo estratégico" para que os países europeus deixem de estar dependentes da dissuasão norte-americana para fazer face às ameaças da Rússia, que continua a apostar no rearmamento, e proteger o continente europeu, que lida desde fevereiro de 2022 com a invasão russa na Ucrânia.

c/ agências
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