Líbia. Vítimas das inundações enterradas em valas comuns

por Graça Andrade Ramos - RTP
Um homem olha para um corpo estendido numa rua da cidade de Derna, dias após cheias catastróficas para a cidade Esam Omran Al-Fetori - Reuters

Estão confirmadas 5.100 vítimas mortais só na cidade de Derna, na Líbia, depois das cheias de domingo passado, mas o número poderá ascender às 20.000, admitiu um responsável local. Com tal volume de corpos, o chefe-adjunto dos programas dos Médicos Sem Fronteiras (MSF) para a Líbia afirmou que a grande prioridade é gerir a questão dos cadáveres, para evitar epidemias.

"Há uma grande necessidade de sacos para cadáveres mas também de cuidar dos feridos", disse Matthieu Chantrelle num comunicado dos MSF emitido a partir de Tobruk, 160 quilómetros a leste de Derna, a cidade mais afetada pelas cheias, 1.260 quilómetros também a leste de Tripoli.

Até quinta-feira à noite, pelo menos 3.000 corpos haviam sido já enterrados em valas comuns, avançou o ministro da Saúde líbio, Othman Abduljaleel, com outros 2.000 ainda a ser processados. A maioria das vítimas está a ser enterrada nos arredores de Derna, com outras transferidas para cidade e localidade vizinhas.

As equipas de socorro continuam a efetuar buscas, tanto nos edifícios destruídos pelas águas como no mar frente à cidade, para onde terão sido arrastados muitos corpos, acrescentou o ministro.

Os mortos incluem pelo menos 84 egipcios, já trasladados para o seu país de origem, na quarta-feira. As cheias vitimaram igualmente dezenas de migrantes sudaneses.

Chantrelle referiu que os MSF estão em "contacto permanente" com o Crescente Vermelho líbio, a principal entidade de assistência humanitária de momento em Derna. A organização conta ir apoiar já esta quinta-feira os esforços de ajuda humanitária e cuidados com os sobreviventes, levando consigo 400 sacos para cadáveres e 450 `kits` médicos.

O responsável dos MSF para a Líbia salientou também ser urgente o envio de abrigos, de artigos alimentares e de outros bens de primeira necessidade, sobretudo de higiene.
Catástrofe
A Líbia foi atingida dia 10 de setembro pela tempestade Daniel, com duas cidades, Al Bayda e Darna, a sofrerem os maiores estragos. Al Bayda registou 414 mililitros de precipitação e Derna 100mm, muito acima da chuva habitual para a região neste mês, que não exede habitualmente os 1.5 mm.

Enquanto Al Bayda sofreu a perda do fornecimento de eletricidade e de comunicações, Derna foi especialmente afetada ´devido ao rebentamento de duas barragens construídas ao longo do wadi (um vale estreito e árido, percorrido por um curso de água), que termina na cidade.

A súbita libertação de milhares de litros de água devido à destruição das barragens fez transbordar o rio, arrastando lama e destroços. Derna ficou literalmente dividida a meio pelas águas, que destruíram ainda estradas, pontes e bairros inteiros.

A falta de avisos à população terá também sido uma falha crucial das autoridades.
Cuidados de saúde fragilizados
Os acessos à região estão especialmente difíceis. Apesar disso, voluntários das cidades de Misrata, de Tripoli e de Benghazi, andam pelas ruas de Derna a distribuir roupas e alimentos a quem perdeu tudo nas cheias.

O chefe-adjunto dos programas dos Médicos Sem Fronteiras (MSF) para a Líbia afirmou que, assim que a delegação da MSF conseguir percorrer por estrada os cerca de 160 quilómetros que separam Tobruk de Derna, e após entregar a ajuda humanitária, irá ajudar a avaliar a situação nos hospitais de campanha locais entretanto instalados, bem como as necessidades médicas, para poder lançar a operação o mais rapidamente possível.

"As informações e observações feitas pela equipa dos MSF indicam que a solidariedade local está já mobilizada, como é habitual neste tipo de desastres.

Dada a escala deste desastre, os MSF estimam que as estruturas médicas tenham sofrido danos e que esteja a ser necessário repor o acesso a cuidados de saúde para quem permanece no local e para as pessoas que foram forçadas a deslocar-se devido às inundações, calculadas em cerca de 30.000", afirmou Chantrelle.

com Lusa
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