É considerada a maior deportação de pessoas de volta ao Níger, num contexto em que a União Europeia tem aumentado os esforços para reduzir as travessias no Mediterrâneo. Mais de 600 nigerinos foram obrigados a sair da Líbia, numa jornada "perigosa e traumatizante" pelo deserto do Saara.
“As pessoas deportadas eram provenientes das regiões de Tillabéri, Tahoua, Maradi, Diffa, Niamey e Dosso. Entre eles estavam 63 menores e quatro pessoas chegaram doentes”, denunciou a organização Alarm Phone Sahara, acrescentando que “todos os seus pertences, incluindo telemóveis e dinheiro, foram confiscados pelas forças líbias”.
“Isto é algo novo. Houve uma expulsão de 400 pessoas em julho passado, mas este é o maior número até o momento”, afirmou Azizou Chehou, da organização Alarm Phone Sahara.
Os cidadãos exilados esperam agora ser transferidos para a cidade Agadez dentro de alguns dias, uma vez que pequena cidade de Dirkou, com cerca de 15 mil habitantes, tem um centro de trânsito gerido pela Organização Internacional para as Migrações, mas só tem cerca de 30 lugares e já está lotado. Devido à falta de lugares suficientes nas estruturas de alojamento da ONU, muitos migrantes não têm outra escolha senão viver fora, nos arredores de Dirkou, numa situação extremamente precária.
“A Alarme Phone Sahara apela ao fim das deportações da Líbia, ao respeito pela livre circulação e aos direitos humanos de todas as pessoas em movimento e ao fim dos acordos anti-migração da União Europeia com os países do Magrebe”, lê-se na publicação da organização.
En 2025, les expulsions de #Libye vers le #Niger se poursuivront. La plupart des personnes concernées étaient auparavant dans des centres de rétention en Libye.
— Alarmephone Sahara (@AlarmephoneS) January 6, 2025
Dans la nuit du 3 au 4 janvier, 613 Nigériens, dont des mineurs, sont arrivés dans la ville désertique de #Dirkou pic.twitter.com/8kuct9DXRn
Estas deportações acontecem numa altura em que alguns países da União Europeia são acusados de fechar os olhos aos abusos e violações sistemáticas dos Direitos Humanos contra migrantes na Líbia, enquanto se concentram em conter a migração para a Europa. A Itália, por exemplo, assinou acordos com a Tunísia e a Líbia para limitar as travessias do Mediterrâneo e dados do Ministério italiano do Interior indicam que chegaram 66.317 pessoas ao país em 2024, o que é menos de metade do número registaado em 2023.
“Esta é a política de fronteiras da Europa exposta, terceirizando a expulsão em massa e a morte para a Líbia, onde o deserto se torna um cemitério”, sublinhou David Yambio, porta-voz da organização sem fins lucrativos Refugiados na Líbia, citado pelo Guardian.
“Líderes como [Viktor] Orbán, [Giorgia] Meloni ou [Donald] Trump aplaudem esta crueldade eficiente. Não é acidente; é o plano. A UE paga para apagar migrantes, para tornar o sofrimento invisível e para lavar as mãos enquanto outros fazem o trabalho sujo”, acrescentou.
O caminho da Líbia para o Níger através do deserto do Saara não foi fácil, adiantou Yambio, que explicou que as 613 pessoas tiveram de passar por uma experiência muito “perigosa e traumatizante” para fazer essa viagem para sair da Líbia.
“O inverno no deserto é muito frio e com os migrantes amontoados como sardinhas, lutas para encontrar os lugares mais confortáveis podem acontecer e as pessoas podem cair do camião magoando-se. As pessoas chegarão [a Agadez] num estado muito lamentável”, disse também Chehou, da APS.
A Líbia é tradicionalmente atrativa para muitos trabalhadores, com migrantes do Níger, Mali e Chade indo para as regiões do sul a fim de encontrar empregos na agricultura, construção e comércio. Muitos outros viajam para a Líbia para economizar dinheiro antes de seguirem para a costa, onde embarcam em barcos de contrabandistas com destino à Europa.
A agência da ONU para refugiados, o ACNUR, espera que mais grupos de migrantes cheguem da Líbia e prepara-se, por isso, para “apoiar a OIM, particularmente na identificação e apoio a indivíduos que possam precisar de proteção internacional".