O presidente dos Estados Unidos anunciou segunda-feira planos para efetuar reformas urgentes no Supremo Tribunal, dominado pelos conservadores. A iniciativa de longo prazo surge numa altura em que Joe Biden procura dar o seu cunho pessoal aos últimos seis meses de mandato, depois de ter desistido da corrida às presidenciais que disputava com Donald Trump.
"Tenho um grande respeito pelas nossas instituições e pela separação de poderes estabelecida na nossa Constituição", declarou Biden em Austin, Texas. "Mas o que está a acontecer agora não é consistente com a doutrina da separação de poderes."
Entre as intenções de Biden está a de pedir uma emenda constitucional para anular a recente decisão do Supremo Tribunal que apoia as reivindicações de imunidade presidencial de Donald Trump, acusado de diversos crimes.
O atual presidente pretende ainda limitar o número de mandatos dos nove juízes do Supremo, que atualmente exercem funções vitalícias, a 18 anos, com novos juízes nomeados de dois em dois anos.
Isto "reduziria o risco de uma única presidência impor uma influência indevida sobre as gerações futuras", lê-se numa nota da Casa Branca. Neste momento, a maioria dos juízes é conservadora, o que culminou na decisão polémica de reverter o direito constitucional ao aborto em toda a nação.
Referindo-se a esse caso, o presidente vincou que, "nos últimos anos, as opiniões extremas que o Supremo Tribunal emitiu minaram princípios e protecções dos direitos civis há muito estabelecidos".
Joe Biden apela também à adoção de um código de ética vinculativo, semelhante ao que se aplica aos juízes federais, na sequência de uma série de escândalos."Esta nação foi fundada com base num princípio simples mas profundo: ninguém está acima da lei. Nem o presidente dos Estados Unidos, nem um juiz do Supremo Tribunal dos Estados Unidos. Ninguém", tinha já declarado o presidente num artigo de opinião publicado segunda-feira.
"O que está a acontecer atualmente não é normal e mina a confiança do público nas decisões do Tribunal, incluindo as que têm um impacto nas liberdades individuais. Encontramo-nos agora numa situação de rutura", vincou.
Assim sendo, Biden pede uma emenda apelidada de "No One Is Above the Law Amendment" ("Ninguém Está Acima da Lei"), segundo a qual a Constituição "não confere qualquer imunidade de acusação criminal federal, julgamento, condenação ou sentença em virtude de se ter servido anteriormente como presidente".
"Partilho a convicção dos nossos fundadores de que o presidente deve responder perante a lei", disse.
"Partilho a convicção dos nossos fundadores de que o presidente deve responder perante a lei", disse.
A Casa Branca afirmou entretanto que Joe Biden e a vice-presidente Kamala Harris, provável candidata democrata após a desistência do presidente, estão "ansiosos por trabalhar com o Congresso nestes planos".
Escândalos no Supremo
Donald Trump veio já criticar o apelo de Biden para reformas, dizendo na Fox News que "ele quer desesperadamente" atacar a imunidade presidencial, mas que "não há maneira de eliminar a imunidade de um presidente".
Dos nove juízes do Supremo, seis são conservadores e três deles foram nomeados durante o mandato de Donald Trump. O tribunal tem sido abalado por escândalos de ética em torno de alguns dos seus juízes ultraconservadores.
O juiz Clarence Thomas admitiu recentemente que dois períodos de férias de luxo em 2019 foram pagos por um doador republicano bilionário.
Outro dos membros, de 76 anos, ignorou os apelos para se retirar de casos relacionados com as eleições presidenciais de 2020, depois de a sua mulher ter estado envolvida na campanha para manter Trump no poder, apesar da sua derrota eleitoral frente a Joe Biden.
Este ano, o Supremo Tribunal reduziu significativamente o poder das agências federais e decidiu parcialmente a favor dos pedidos de imunidade do candidato republicano Donald Trump.
Propostas com "quase zero" hipóteses de avançarem
As sondagens de opinião têm revelado uma crescente perda de confiança do público no Supremo, mas, ainda assim, os esforços do atual presidente para reformar a instituição parecem destinados a fracassar.
Para que as reformas propostas por Biden avançassem, o Congresso teria de as aprovar, o que se prevê difícil antes do fim do seu mandato, já que os republicanos controlam a Câmara dos Representantes e os democratas têm uma escassa maioria no Senado.
A emenda constitucional sobre a imunidade exigiria, por sua vez, um processo mais complicado envolvendo todos os Estados, o que aparenta ser quase impossível de ser bem-sucedido.
Steven Schwinn, professor de Direito na Universidade de Illinois, explicou à AFP que Biden tem "quase zero" hipóteses de aprovar o projeto de lei, mas que provavelmente está a tentar "sensibilizar o público" e "apresentar o Supremo Tribunal como uma questão eleitoral".
O presidente da Câmara dos Representantes, Mike Johnson, reagiu dizendo que as propostas de Biden não vão avançar - pelo menos se os republicanos mantiverem o controlo dessa entidade após as eleições.
"É revelador que os democratas queiram mudar o sistema que tem guiado a nossa nação desde a sua fundação simplesmente porque discordam de algumas das decisões recentes do tribunal", afirmou Johnson. "Esta jogada perigosa da Administração Biden-Harris está morta na chegada à Câmara".
c/ agências