JD Vance vê a Europa "à beira da paz" mas exige que aliados sigam "a direção certa"
JD Vance, o vice-presidente dos Estados Unidos que aos 39 anos já deu a volta completa ao bilhar da política da maior democracia do mundo ao chamar a Donald Trump "o Hitler americano" e aceitar depois ser o vice no segundo mandato do milionário que fundou o movimento MAGA (Fazer a América Grande de Novo – numa tradução livre de Make America Great Again), veio anunciar esta quinta-feira que "estamos às portas da paz na Europa". Sem outros argumentos ou explicações, na abertura da CPAC, o terceiro homem da Administração, se considerarmos o papel crucial de Elon Musk, exige mais investimento em defesa pelos europeus e pede aos aliados para que sigam "a direção certa" com base em "valores partilhados".
Essa suspeita, se não estava já confirmada com o reatamento dos contactos entre a Casa Branca e o Kremlin em escassas semanas de Administração Trump, tornou-se clara ontem quando o presidente norte-americano, rasgando em definitivo o memorando de ajuda sustentado pelo anterior presidente Biden, chamou ao presidente ucraniano “um ditador” que deveria mexer-se se não queria arriscar perder o seu país.
A tarde desta quarta-feira terá sido o culminar de uma reviravolta na política americana para a Ucrânia que não terá volta-atrás. Uma retórica que se soma ao encontro na Arábia Saudita entre os chefes das diplomacias russa e americana, Sergei Lavrov e Marco Rubio.
Volodymyr Zelensky está refém por um lado da ajuda americana e por outro da incapacidade europeia, pelo que não pôde responder e segurar a sua posição após esta investida violenta dos lados de Washington, agora dominada por um inquilino que no decorrer da eleição Biden-Trump lhe pediu ajuda para investigar os negócios do clã Biden na Ucrânia e ouviu uma nega do outro lado do telefone. Trump vive numa “bolha de desinformação” foi o argumento possível do presidente ucraniano.
Esta quinta-feira, na abertura da grande reunião dos conservadores americanos, JD Vance voltou a defender as conversações entre a administração Trump e Vladimir Putin questionando “como é que vamos acabar com a guerra se não falarmos com a Rússia?”.
“Acredito realmente que estamos à beira da paz na Europa pela primeira vez em três anos”, antecipou durante o seu discurso em Maryland, arredores de Washington, em defesa das negociações que estão em marcha sem a participação de Zelensky ou da União Europeia.
Evitando mais detalhes, JD Vance exaltou Trump como “um negociador eficaz [que] não deixa nada fora da mesa” das negociações para declarar que acredita realmente “que estamos à beira da paz na Europa pela primeira vez em três anos”.
O vice-presidente de Trump esclareceu em casa o que já deixara claro na sua participação na cimeira sobre defesa em Munique, na Alemanha, a semana passada: a Europa deve afastar-se e deixar os americanos tratarem da questão do conflito na Ucrânia.
Num discurso muito duro para os parceiros europeus, mormente da União Europeia, JD Vance foi duro, alguns comentadores adjectivariam mesmo a sua intervenção de grosseira ou indelicada, ao acusar o Velho Continente de estar a enveredar por um caminho errado. Estenderia a crítica às políticas de imigração, lamentando que os detratores da ideia de fronteiras abertas estivessem a ser silenciados.
Esta tarde teria em Maryland uma ovação de pé pelo discurso que veio entregar aos europeus depois de o momento ser lembrado pelo moderador Mercedes Schlapp.
Vance disse que Trump, exigindo que os aliados da NATO paguem mais pela defesa comum, não deixa de querer uma aliança forte com a Europa: “Mas eu acho realmente que a solidez dessa aliança vai depender de levarmos as nossas sociedades na direção certa”, acrescentaria.
Como referia esta tarde, para a Nova Administração Trump a imigração ilegal não é apenas um problema dos americanos, é também o maior problema da Europa, vincou.
Há aqui uma indisfarçável vontade de intervir nas políticas do Velho Continente, onde Elon Musk faz claramente a sua parte, desde logo no apoio manifesto ao partido de extrema-direira AfD para as eleições alemãs deste fim de semana, e já hoje o vice-presidente lançou-se numa diatribe contra a Roménia face à decisão de Bucareste de cancelar as eleições de dezembro passado, assunto que já abordara em Munique.
A questão tem a ver com a decisão do Tribunal Constitucional da Roménia de anular as eleições antes de uma segunda volta, após documentos de segurança desclassificados apontarem suspeitas de interferência russa – prontamente negada por Moscovo – a favor do crítico de extrema-direita da NATO, Calin Georgescu.
“O que tento dizer aos nossos amigos europeus é que a amizade se baseia em valores partilhados”, apontou hoje JD Vance, acrescentando que “não temos valores partilhados se cancelarmos eleições porque não gostamos do resultado, e isso aconteceu na Roménia, se temos tanto medo do nosso próprio povo que o silenciamos e o calamos”.
Esquecendo o facto de também Donald Trump, por não concordar com os resultados das Presidenciais de 2020, ganhas pelo democrata Joe Biden, ter incitado um movimento de fervorosos apoiantes no que culminaria na invasão do Capitólio a 6 de janeiro de 2021, JD Vance propugna agora que que Estados Unidos e Europa tenham “valores partilhados; vamos defender a democracia; vamos ter liberdade de expressão, não só nos Estados Unidos, mas em todo o mundo ocidental. Esse é o caminho para alianças fortes na Europa”.
Elon Musk, que vem fazendo esta cruzada pela extrema-direira também na Roménia, alinhou esta quinta-feira com o vice-presidente no ataque ao juiz chefe do tribunal que anulou a segunda volta, dizendo que “é um tirano, não um juiz”.