Japão em negociações para abrir escritório da NATO

por Cristina Sambado - RTP
Yuichi Yamazaki - Reuters

Tóquio está em negociações para abrir um gabinete de ligação com a NATO, o primeiro do género no continente asiático, revelou o ministro japonês dos Negócios Estrangeiros à CNN. Segundo Yoshimasa Hayashi, a invasão russa à Ucrânia provocou instabilidade a nível mundial.

“Já estamos a discutir, mas ainda não há detalhes”, afirmou Yoshimasa Hayashi numa entrevista exclusiva à CNN.

O MNE japonês deu o exemplo da invasão russa da Ucrânia, em fevereiro de 2022, como um acontecimento com repercussões além das fronteiras da Europa, o que obrigou o Japão a repensar a segurança regional.

A razão pela qual estamos a discutir este assunto é porque com a agressão da Rússia à Ucrânia, o mundo tornou-se mais instável”, frisou.

Para Yoshimasa Hayashi, “o que acontece na Europa de Leste não se limita apenas à Europa de Leste e afeta diretamente a situação no pacífico. Por esse motivo, a cooperação entre a Ásia Oriental e a NATO está a tornar-se cada mais importante”. Roberta Metsola, presidente do Parlamento Europeu, frisou que o Japão não é membro da NATO. No entanto, a Organização do Tratado do Atlântico Norte envia uma mensagem para os parceiros do bloco da Ásia-Pacífico que “estão a envolver-se de uma forma muito estável com a NATO”.

A abertura de um gabinete de ligação da NATO no Japão representa um significativo desenvolvimento para a aliança ocidental, num contexto de aprofundamento das linhas de fratura geopolíticas, e é provável que atrai críticas do Governo de Pequim, que já advertiu contra a sua oposição a esta decisão.

A NATO tem gabinetes de ligações semelhantes noutros países, incluindo na Ucrânia e Áustria.
O gabinete de ligação no Japão permitirá discutir com os parceiros de segurança da NATO, como a Coreia do Sul, Austrália a Nova Zelândia, os desafios geopolíticos, as tecnologias emergentes e disruptivas e as ameaças cibernéticas, revelou a agência Nikkei Asia na passada quarta-feira.

“Quanto aos planos para abrir um gabinete de ligação no Japão, não vamos entrar em pormenores sobre as deliberações em curso entre os aliados da NATO”, afirmou à CNN um porta-voz da Aliança Atlântica, recordando a “cooperação de longa data” entre a organização e o governo nipónico.

A NATO não comenta, para já, as declarações do MNE japonês.
Situação complexa de segurança
A invasão russa da Ucrânia provocou ondas de choque em toda a Europa e levou a Finlândia e a Suécia, países não alinhados, a abandonar a sua neutralidade e a procurar proteção da NATO, tendo a Finlândia aderido formalmente à organização no mês passado.

A guerra na Ucrânia levou ainda a que países como a Coreia do Sul e o Japão se aproximassem dos seus parceiros ocidentais, enquanto apresentavam uma frente unida contra as ameaças sentidas perto das suas fronteiras.

Yoshimasa Hayashi considera que o ambiente de segurança regional é “grave e complexo”, referindo que além do aumento da agressão russa, Tóquio está também a enfrentar uma Coreia do Norte com armas nucleares e uma China em ascensão.

A China tem vindo a aumentar as suas forças navais e aéreas em áreas mais próximas do Japão, enquanto reivindica as ilhas Senkaku, um grupo de ilhas desabitadas e controladas atualmente por Tóquio no Mar da China Oriental, como seu território.

Perante as crescentes fricções, o Japão anunciou recentemente planos para o seu maior reforço militar desde a II Guerra Mundial.

Também as tensões entre Tóquio e Moscovo têm vindo a aumentar nos últimos meses, alimentadas em parte pelos exercícios russos nas águas entre os dois países e pelas patrulhas navais sino-russas no Pacifico ocidental, junto ao Japão.

Em abril, navios de guerra russos realizaram exercícios no Mar do Japão e em março barcos com mísseis russos dispararam mísseis de cruzeiro contra um alvo simulado, nas mesmas águas.

Também em março, após a visita surpresa do primeiro-ministro japonês a Kiev, dois bombardeiros estratégicos russos, com capacidade para transportar armas nucleares, sobrevoaram as águas ao largo da costa japonesa durante mais de sete horas.

Apesar das crescentes tensões regionais, Hayashi afirmou que a potencial abertura de um gabinete da NATO não se destina a países específicos.

Segundo o MNE nipónico, o Japão e outros países continuam a ter de cooperar com a China em questões da maior importância, como as alterações climáticas e a pandemia de covid-19, e que Tóquio pretende manter uma “relação construtiva e estável” com Pequim.
Reação de Pequim

A China já advertiu contra a expansão do alcance da NATO na Ásia e reagiu contra a instalação de um gabinete da Aliança Atlântica no Japão.

“A Ásia é uma terra promissora para a cooperação e um foco de desenvolvimento pacífico. Não deve ser uma plataforma para os que procuram lutas geopolíticas”, afirmou o ministro chinês dos Negócios Estrangeiros, Mao Ning, na passada semana.

Segundo Mao Ning, “o impulso da NATO para leste e a sua interferência nos assuntos Ásia-Pacífico prejudicarão definitivamente a paz e a estabilidade regionais”.

Apesar de Pequim ter alegado imparcialidade na guerra da Ucrânia e não ter conhecimento antecipado das intenções da Rússia, recusou-se a condenar as ações de Moscovo. Em vez disso tem repetido as linhas do Kremlin, culpando a NATO de ter provocado o conflito, o que tem vindo a fragilizar ainda mais as relações com a Europa e os EUA.

No entanto, Hayashi minimizou as preocupações de Pequim ao frisar que a abertura de um gabinete da NATO em Tóquio pudesse inflamar ainda mais as tensões. “Não me parece que seja esse o caso”.

“Não estamos a ofender ninguém, estamos a defender-nos de qualquer tipo de interferência e preocupação e, em alguns casos, de ameaças”, rematou Hayashi.
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