Mais de duas semanas depois da morte da Mahsa Amini, continuam os protestos no Irão e em outros países contra as leis do Governo iraniano e a repressão que atinge sobretudo as mulheres. E, esta segunda-feira, foi divulgado o relatório preliminar sobre a morte da jovem curda, de 22 anos, que morreu após ser detida pela polícia da moralidade. O documento, agora público, visa "mostrar a determinação da República Islâmica do Irão em ilustrar os factos do incidente".
Segundo o documento, baseado num relatório redigido pela polícia, “devido ao incumprimento da lei islâmica sobre o uso do hijab e à impossibilidade de corrigir o estado do vestuário diante da polícia”, a jovem iraniana foi “transferida para uma sala de conferências do Departamento de Assuntos Sociais e Educação para Mulheres na Polícia de Segurança Pública, na ausência de qualquer abuso verbal, maus-tratos físicos ou coercitivos para receber as formações necessárias”.
Mahsa Amini "perdeu subitamente a consciência" e caiu “no chão após 26 minutos”, de acordo com as conclusões divulgadas.
“As medidas iniciais implementadas por um médico da Polícia de Segurança Pública e serviços de emergência, assim como o encaminhamento imediato para o hospital, não deram resultado”, acabando, posteriormente, por ser “declarada morta apesar de várias tentativas de ressuscitação cardiorrespiratória”.
Investigação em curso
De acordo com a Embaixada iraniana em Portugal, o chefe do Poder Judicial nomeou uma “comissão especial na Organização de Medicina Legal para lidar com este assunto e apresentar um relatório”.
Após o incidente, referem as autoridades no relatório, foram formadas “equipas especiais de investigação para esclarecer todos os factos do mesmo e desmascarar a verdade” – equipa constituídas por elementos do Ministério do Interior, da Procuradoria-Geral de Teerão, do Gabinete de Direitos Civis da Administração de Justiça da Província de Teerão, da Organização de Medicina Legal e ainda da Assembleia Consultiva Islâmica.
“Além disso, uma comissão médica composta pelo vice-ministro do Ministério da Saúde, o vice-presidente da Comissão de Saúde da Assembleia Consultiva Islâmica, o Chefe da Organização de Medicina Legal, o Chefe do Conselho Médico , o representante da Heart Association, o representante da Neurosurgeon Society e o representante da Society of Radiology foram indicados para investigar os prontuários médicos da pessoa e histórico terapêutico”, acrescenta ainda o relatório.
“Uma vez informado, ordenei que se investigasse o incidente e o mantivesse na ordem do dia; e garanto que exigirei respostas dos órgãos responsáveis para que as dimensões da questão sejam esclarecidas”, afirmou no relatório o presidente da República Islâmica do Irão, Ebrahim Raisi.
Para além das equipas médicas, o chefe da Magistratura “ordenou que as autoridades judiciárias realizassem investigações minuciosas e aprofundadas sobre o incidente desde o próprio local onde detida e levada na viatura”.
As autoridades iranianas esclareceram, no dito relatório, que as “alegações” que sugerem maus tratos a Amini e agressões, são “julgamentos prematuros, uma vez que as investigações e inquéritos ainda estão a decorrer”. É, segundo o mesmo, “injustificado e provocador”.
“Considerando que circulam nas redes sociais e na Internet informações falsas e não científicas sobre sangue a sair dos ouvidos, fraturas no craniano e danos em órgãos internos, informamos que não há sinais de lesões na cabeça e face, hematomas em redor dos olhos nem fraturas da base do crânio foram encontrados no exame físico e na autópsia realizada no falecido”, lê-se ainda.
A autópsia ao tronco e abdómen também não revelaram “vestígios de sangramento, esmagamento ou rutura de órgãos internos”.
O que é preciso é “tempo para determinar a causa da morte, o que deve ser feito após a produção dos resultados dos exames e combinados com a autópsia e histórico médico”, que revela que Mahsa Amini teve um tumor cerebral na infância e, desde essa altura, era medicada e seguida pela endocrinologia.
Em tom de conclusão, as autoridades condenam as manifestações, as acusações “falsas” e os atos violentos que se sucederam à morte de Mahsa Amini, a 16 de setembro, garantindo que não se trata de repressão à liberdade de expressão ou direitos humanos.
Os vídeos que mostraram carros de bombeiros, estações de autocarros e bancos queimados. O Governo afirma que os distúrbios, incluindo tiros disparados pela multidão, são da responsabilidade de grupos terroristas. Os manifestantes, por seu lado, acusam a polícia de disparar na multidão.
No Irão, recorde-se, é obrigatório as mulheres cobrirem o cabelo em público. A polícia fiscaliza ainda as mulheres que usam casacos curtos, acima do joelho, calças justas e 'jeans' com buracos (ou rotos), além de roupas coloridas, entre outras regras.