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"Incomparável". Descoberta em Londres cama funerária em carvalho de alta qualidade da época romana

por Carla Quirino - RTP
Londres. Leito funerário com cerca de 2000 anos terá sido enterrado na sepultura para que o falecido pudesse usá-lo na vida após a morte MOLA - Museu Arqueológico de Londres

A seis metros abaixo do nível do solo moderno de Londres, foi descoberto um leito funerário completo com cerca de dois mil anos produzido em madeira pelos romanos, preservado em lama. Teria sido concebido como um bem funerário para uso na vida após a morte. Descrito como um achado "incomparável" e "excecionalmente importante", o contexto funerário está a ser escavado pelo Museu Arqueológico de Londres. Faz parte de um antigo cemitério romano identificado perto do viaduto de Holborn, no centro da capital britânica.

Ao lado de cinco urnas de carvalho, os arqueólogos do Museu Arqueológico de Londres - MOLA, fizeram uma descoberta “rara” e “excecionalmente importante”: uma cama funerária completa em “madeira de carvalho de alta qualidade”, que representa a primeira descoberta deste género, até agora, em solo britânico.

O mobiliário funerário encontra-se “muito bem preservado, apresenta os pés esculpidos e juntas fixadas com pequenas estacas de madeira” descreve o MOLA.

“Esta é uma peça de marcenaria incrivelmente bem feita. É uma das peças de mobiliário mais sofisticadas recuperadas do tempo dos romanos, na Grã-Bretanha” afirma Michael Marshall, arqueólogo do MOLA.

Cama funerária romana - MOLA

A cama foi desmontada antes de ser colocada na sepultura de um homem adulto que teria entre 20 a 30 anos. “É quase certo que era uma pessoa de alto status”, descreve Marshall.

“O leito foi cuidadosamente desmontado e guardado, quase como se fosse uma mobília para uso na vida que viria a seguir”, isto porque, os romanos acreditavam na vida depois da morte, explica ainda o arqueólogo.

A coordenadora do projeto, Heather Knight, argumenta: “Sabemos que os romanos enterravam os seus mortos à beira das estradas, fora dos centros urbanos. Assim, não foi grande surpresa descobrir sepulturas neste local, que durante o período romano estaria localizado a 170 metros a oeste das muralhas da cidade e próximo à principal estrada romana de Watling Street. No entanto, os níveis de preservação que encontramos – e particularmente a descoberta de uma vasta gama de achados de madeira – realmente surpreenderam-nos”.

Estudadas as peças encontradas, os arqueólogos apresentam a recosntituilão econstituição do leito em madeira - MOLA

Embora a área cemiterial da Londres Romana, em redor deste achado, já estivesse identificada desde 1990, “a cama foi uma surpresa completa, porque nunca vimos nada parecido antes”, vinca Marshall.

A cama pode ter sido usada para transportar o indivíduo até à sepultura. “Não sabíamos que as pessoas eram enterradas neste tipo de leitos funerários romanos. Isso é algo para o qual não há evidências anteriores na Grã-Bretanha”, sublinha.

No mundo romano, existem relatos de indivíduos a serem transportadas em camas durante as procissões fúnebres, assim como também há representações em lápides, mas como os materiais perecíveis não se conservam, não é habitual encontrar-se em sítios arqueológicos.

“Os móveis romanos de madeira só sobrevivem em circunstâncias excepcionais” enfatizou Michael Marshall.

E no caso os restos de madeira da era romana na Grã-Bretanha – 43 / 410 d.C - "raramente sobrevivem até aos dias de hoje". 

Porém, como o cemitério, a seis metros de profundidade relativamente ao solo atual de Londres, fica ao lado do Rio Fleet, agora subterrâneo, as urnas e os restantes materiais em madeira acabaram por permanecer bem preservadas, mergulhadas no terreno húmido, como a lama e lodo.
Lucerna com decoração de um gladiador derrotado
Na necrópole romana, perto dos restos mortais, foram encontrados objetos pessoais que acompanhariam os defuntos. Entre joias com contas de âmbar e azeviche e um frasco de vidro aparentemente ainda contendo resíduos, foi recuperado uma lucerna decorada com uma representação de um gladiador derrotado, “o que é uma coisa maravilhosa”, disse Marshall.

“Há algo no simbolismo do gladiador caído que faz sentido num contexto funerário. Um gladiador derrotado é alguém que está a morrer, obviamente – mas também a lutar contra a morte”, acrescenta. O arqueólogo acredita que esta lucerna se enquadra no período mais antigo da ocupação romana, que data entre 43 e 80 d.C.

Lucerna romana, frasco de vidro e contas de um enterro de cremação - MOLA

“Portanto, estão a começar a surgir, a partir da análise desses enterros, evidências de que algumas escolhas, por vezes subtis, sobre como as pessoas lamentavam e enterravam os seus mortos", remata Marshall.

Os trabalhos arqueológicos acontecem previamente às obras que irão transformar o local junto ao viaduto Holborn num espaço de escritórios de uma empresa de advogados Hogan Lovells. Penny Angell, sócia-gerente da empresa no Reino Unido, diz estar “fascinada em saber que faz parte desta descoberta arqueológica” e acrescenta estar prevista uma área de exposição dos artefactos que representam as vidas passadas desse local histórico.


Escavação das urnas romanas de madeira - MOLA

A investigação feita pelo MOLA permite não só recuperar materiais escondidos no lodo há pelo menos dois mil anos, como também registar com dados georreferênciados todas as evidências para a reconstituição do sítio arqueológico romano.
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