Os procuradores do Congresso, que estão a dirigir o julgamento de impeachment de Donald Trump, revelaram novas e perturbadoras gravações do ataque da multidão ao Capitólio no passado dia 6 de janeiro.
Um vídeo mostrou a entrada violenta de uma multidão, a partir vidros e portas e gritando ameaças ao vice-presidente e à presidente da Câmara dos Representantes.
As imagens mostram ainda agentes de polícia a pedirem ajuda pelos rádios. E o quão próximo os amotinados estiveram dos líderes norte-americanos.
Os senadores, sentados como jurados no Congresso, assistiram em silêncio aos vídeos das câmaras de segurança e aos relatórios da polícia.
Membros de extrema-direita, uniformizados com roupa de combate, foram os primeiros a entrar no edifício.
Em imagens de segurança inéditas, Mike Pence, que presidia à sessão para confirmar a vitória de Joe Biden nas eleições de 3 de novembro, foi retirado juntamente com a sua família para uma sala perto da câmara do Senado, cerca de 15 minutos depois dos manifestantes invadirem o Capitólio.
Gritos de “enforquem Mike Pence” rebarbavam pelo edifício de mármore, enquanto do lado de fora outro manifestante construía uma forca improvisada. Em determinada altura, os manifestantes chegaram a estar a menos de 30 metros da sala onde o ex-vice-presidente estava protegido, acrescentaram os procuradores.
Um vídeo mostrou um polícia a disparar por uma janela partida, matando a veterana da Força Aérea Ashli Babbitt, enquanto ela tentava entrar no edifício. Vários senadores ficaram visivelmente chocados com imagens do polícia Daniel Hodges a ser esmagado por uma porta enquanto tentava impedir que os manifestantes invadissem o Capitólio.
Outro vídeo mostra Eugene Goodman, polícia do Capitólio, a retirar o senador Mitt Romney para longe dos manifestantes.
Há ainda imagens de funcionários de segurança da presidente da Câmara dos Representantes, Nancy Pelosi, a correrem para o seu gabinete e a barricaram-se na sala, poucos minutos antes dos manifestantes chegarem e invadirem o seu escritório.
"Eles fizeram isto porque Trump os enviou"
Segundo os procuradores, um dos manifestantes que posou para uma fotografia durante o assalto ao Capitólio com as botas em cima da secretária de Pelosi estava com uma arma de choque, que poderia ter causado graves danos se fosse usada.
“Eles fizeram isto porque Trump os enviou com essa missão”, afirmou Stacey Plaskett, o procurador democrata eleito para a Câmara dos Representantes pelas Ilhas Virgens.
Os democratas da Câmara dos Representantes – chamados de procuradores de impeachment durante o julgamento – traçaram metodicamente a campanha de Trump, que durou meses, para anular a sua derrota nas eleições, argumentando que o ex-vice-presidente não era um “espetador inocente”, mas o “instigador chefe”.
Os procuradores usaram o primeiro dia do julgamento para argumentar que a invasão ao Capitólio não foi um ato aleatório de caos, mas sim “montado, inflamado e incitado” por Trump ao longo de vários meses.
Trump violou o seu juramento presidencial ao não agir para tentar travar a violência, alegando que em vez disso, assistiu com “alegria” aos seus apoiantes a invadirem o Capitólio, consideraram os procuradores.
"O caos e a loucura"
“Para nós, isto parece o caos e a loucura, mas houve método na loucura daquele dia”, afirmou o representante Jamie Raskin, eleito pelo Estado de Maryland, que acusou Trump de ser o instigador dos atacantes.
“Quando a sua multidão atacou e ocupou o Senado, atacou a Câmara e agentes de polícia, ele via isto na televisão como se fosse um reality show, acusou.
Os procuradores teceram a reconstrução da tarde de 6 de janeiro com relatórios assustadores do departamento de polícia. Numa gravação de áudio, um dos oficiais pede ajuda urgente depois dos manifestantes atacarem as barricadas em direção ao Capitólio.
“Perdemos a linha! Perdemos a linha!”, gritavam de forma frenética.
A divulgação dos vídeos e áudios recordou duras emoções aos senadores que estavam no Capitólio a 6 de janeiro. Durante um intervalo, vários afirmaram que ficaram abalados e chocados a ver as imagens.
Apesar disso, continua a ser extremamente improvável que os procuradores do impeachment convençam os 17 senadores republicanos a juntarem-se aos democratas para declarar Donald Trump culpado de crimes graves e infrações. Se condenado, o Senado poderia votar para impedir que Trump volte a ser eleito Presidente dos Estados Unidos.
Já o congressista Joe Neguse dissecou o discurso de Trump durante um comício nesse dia, argumentando que Trump pretendia assanhar os seus apoiantes para atacar o Capitólio onde os votos eleitorais estavam a ser contados e para impedirem o Congresso de certificar a vitória de Joe Biden.
Para Joe Neguse, Trump convidou publicamente os seus simpatizantes para irem a Washington naquele dia específico e planeou uma manifestação no momento exato em que o Congresso se reunia para contar os votos eleitorais.
"Lutar"
Quando Trump falou, encorajou os apoiantes a “lutar” linguagem que inequivocamente foi o sinal para eles atacarem, acrescentou Neguse.
“Essas palavras foram cuidadosamente escolhidas e tinham um significado específico para aquela multidão. Ele não disse apenas para eles lutarem. Ele disse como, onde e quando, e garantiu que seriam avisados com antecedência”, acusou o congressista eleito pelo Estado do Colorado.
Os democratas recordaram as declarações falsas proferidas por Trump durante meses sobre a fraude nas eleições de 6 de novembro.
Para os democratas, essas mentiras representam um esforço deliberado para semear a desconfiança da eleição que explodiu com o ataque ao Capitólio.
Os procuradores do impeachment exibiram ainda excertos de entrevistas na televisão e discursos nos quais Trump repetia que se recusava a aceitar uma transição pacífica do poder.
“Ele construiu uma máfia ao longo de muitos meses com mensagens repetidas, que levou os apoiantes a acreditarem que as eleições tinham sido fraudulentas”, frisou o congressista democrata Eric Swalwell, eleito pelo Estado da Califórnia.
Os procuradores exibiram ainda um vídeo de Donald Trump alegando em maio, cinco meses antes do ato eleitoral, que a única forma de perder as eleições seria se fosse roubado.
Os senadores ouviram também um áudio de uma conversa entre Trump e o secretário do Estado da Geórgia, durante a qual o ex-presidente dos Estados Unidos implorava que “encontrasse” votos suficientes para reverter a vitória de Biden no Estado.
“Senadores, não podemos ficar insensíveis a isso. Trump fez isso Estado após Estado com tanta frequência, tão alto e tão publicamente”, afirmou a senadora eleita pela Pensilvânia Madeleine Dean.
Para os procuradores o pior de tudo foi que Trump não fez nada para desencorajar os manifestantes que estavam a provocar violência e destruição em seu nome. E destacaram os apelos de republicanos e ex-funcionários da Casa Branca para que condenasse a violência e encorajasse os seus apoiantes a voltar para casa.
“A verdade é que os factos são a 6 de janeiro e Donald Trump nunca condenou esse ataque. Nem uma vez condenou os agressores”, realçou o congressista de Rhode Island, David Cicilline.
Ao longo de oito horas, os procuradores do impeachment falaram de forma pessoal e comovente sobre o assalto ao Capitólio, revivendo as suas próprias experiências.
“Trump também fez um juramento como Presidente. Ele jurou sobre a Bíblia preservar, proteger e defender. E quem pode dizer honestamente que acredita que ele manteve esse juramento? E que de nós vai permitir o abandono de tal dever”, disse Joaquin Castro, senador do Texas.