Um novo estudo - controverso - publicado na revista Nature esta quarta-feira, conclui que o Homem chegou às Américas mais de 100.000 anos antes do estimado até agora.
A nova hipótese coloca ainda duas outras dúvidas imediatas: quem seriam esses Homens e como chegaram ali?O estudo levanta a possibilidade de hominídeos, como os Neandertais ou um grupo conhecido como Denisovanos ou hominídeo de Denisova, tenham de alguma forma chegado à América do Norte vindos da Ásia e prosperado. Outras hipóteses admitem que possam ter vindo do Alasca.
O estudo foca fragmentos de osso antigos encontrados em 1992 durante reparações de uma estrada na área suburbana de San Diego.
A descoberta parou a construção. E o paleontologista Tom Demeré, do Museu de História Natural de San Diego, liderou uma escavação do local ao longo de cinco meses.
A sua equipa descobriu dentes, chifres e ossos de um antigo parente dos elefantes, chamado mastodonte (mammut americanum), junto a grandes pedras partidas e desgastadas.
Tinha sido tudo coberto por um pó fino deixado por água corrente. Mas Deméré achou que as rochas eram demasiado grandes para terem chegado ali trazidas pelo antigo riacho.
"Pensávamos em explicações possíveis para este padrão e voltávamos sempre à hipótese de que poderiam estar envolvidos humanos ", refere Deméré.
Tinha sido tudo coberto por um pó fino deixado por água corrente. Mas Deméré achou que as rochas eram demasiado grandes para terem chegado ali trazidas pelo antigo riacho.
"Pensávamos em explicações possíveis para este padrão e voltávamos sempre à hipótese de que poderiam estar envolvidos humanos ", refere Deméré.
Chegada anterior a 20.000 anos
Nos anos 1990, tentativas de datar o marfim sugeriram que este tinha 300 mil anos mas Deméré manteve-se cético. Considerava que os seus colegas tinham usado um método de datação problemático e a idade indicada parecia também muito improvável para seres humanos viverem na Califórnia - mesmo se atualmente alguns estudos indicam datas anteriores à normalmente indicada.
Ao longo da última década, pesquisas arqueológicas e estudos de ADN moderno e antigo chegaram ao consenso de que os seres humanos povoaram as Américas há 20 mil anos, vindos da Ásia, tendo chegado ao Alasca através de uma ligação terrestre existente no estreito de Bering. Há 15 mil ou 14 mil anos alcançaram o extremo oposto na América do Sul.Alguns estudos referem que os seres humanos chegaram antes dos 20 mil anos apontados. Mencionam locais onde foram encontradas pedras que parecem instrumentos assim como grandes ossos animais com desgastes aparentemente provocados por humanos. Muitos cientistas permanecem céticos sobre estas hipóteses.
Entre os pesquisadores que defendem uma data anterior para a chegada de Homens à América estão os dois co-autores de Deméré no estudo agora publicado: Kathleen Holen e o marido, Steven Holen, são arqueólogos no Centro para a Pesquisa do Paleolítico Americano, em Hot Springs, no Dakota do Sul.
Ambos publicaram já estudos sobre diversos locais no Midwest onde alegam existirem provas da presença humana com até 40.000 anos. Quando ouviram falar do mastodonte de San Diego, o casal Holen visitou Deméré em 2008, para ver os vestígios encaixotados.
"Estávamos a olhar para algo muito, muito antigo, mas tinha os mesmos padrões de fratura que tínhamos visto antes", afirma Kathleen. Os ossos pareciam ter sido colocados numa grande pedra que servia de bigorna e batidos com uma rocha usada como martelo, referem.
A datação
A equipa sustenta que as pedras recuperadas no local foram usadas ou para extrair a medula óssea dos ossos do mastodonte ou para fazer ferramentas de osso mais delicadas.
Não há também marcas óbvias de cortes no osso, o que sugere que o animal não foi morto nem desmembrado pela sua carne.
O artigo da Nature refere que, usando novos métodos, mais recentes, os investigadores tentaram de novo determinar a idade do local. Não foi fácil.
Por um lado não podiam usar radiocarbono nos restos do osso do mastodonte, pois este não possuía proteína de colagénio com carbono. Um segundo método era demasiado impreciso.
"Estávamos a olhar para algo muito, muito antigo, mas tinha os mesmos padrões de fratura que tínhamos visto antes", afirma Kathleen. Os ossos pareciam ter sido colocados numa grande pedra que servia de bigorna e batidos com uma rocha usada como martelo, referem.
A datação
A equipa sustenta que as pedras recuperadas no local foram usadas ou para extrair a medula óssea dos ossos do mastodonte ou para fazer ferramentas de osso mais delicadas.
Não há também marcas óbvias de cortes no osso, o que sugere que o animal não foi morto nem desmembrado pela sua carne.
O artigo da Nature refere que, usando novos métodos, mais recentes, os investigadores tentaram de novo determinar a idade do local. Não foi fácil.
Por um lado não podiam usar radiocarbono nos restos do osso do mastodonte, pois este não possuía proteína de colagénio com carbono. Um segundo método era demasiado impreciso.
Uma terceira técnica, que mede níveis relativos de urânio radioativo e thorium presente no osso, sugeria que os restos tinham 130 mil anos."Tenho a certeza que muitos dos nossos colegas vão mostrar-se muito céticos. Estou à espera disso. Isto é muito, muito mais antigo do que a maioria dos arqueólogos esperam ver hominídeos na América do Norte", reconhece Steven Holen. "Até eu digo isso".
John McNabb, um arqueólogo especializado no Paleolítico, da Universidade de Southampton, no Reino Unido, mostrou-se entusiasmado à revista Nature. "É uma descoberta espantosa e - se for genuína - muda tudo. Realmente muda os pressupostos completamente" afirma.
"Suspeito que o estudo vai provocar muitas reações e a maior parte delas não vai ser de aceitação", vaticina o especialista.
Erella Hovers, uma arqueóloga que reviu o estudo para a revista, teve a mesma reação. Conta que começou por erguer as sobrancelhas quando o trabalho lhe chegou à caixa de e-mail. "Foi como: a sério?".
John McNabb, um arqueólogo especializado no Paleolítico, da Universidade de Southampton, no Reino Unido, mostrou-se entusiasmado à revista Nature. "É uma descoberta espantosa e - se for genuína - muda tudo. Realmente muda os pressupostos completamente" afirma.
"Suspeito que o estudo vai provocar muitas reações e a maior parte delas não vai ser de aceitação", vaticina o especialista.
Erella Hovers, uma arqueóloga que reviu o estudo para a revista, teve a mesma reação. Conta que começou por erguer as sobrancelhas quando o trabalho lhe chegou à caixa de e-mail. "Foi como: a sério?".
Após revisões comparativas dos dados, que demonstraram que bater em ossos de elefantes modernos com pedras produz padrões de estragos semelhantes aos marcados nos ossos do mastodonte, Hovers convenceu-se que estes foram criados por hominídeos na atual Califórnia.
"Isto é alucinante", afirma. "Levanta uma tonelada de perguntas porque não sabemos mais nada, exceto que aqui existiu uma qualquer espécie de povo nesta altura".
Afastar hipótese de ação da natureza
Também o método de datação, baseado em modelos simples de como o urânio se entranha no osso vindo da água, não tem falhas óbvias mesmo sendo simplista.
"Isto é alucinante", afirma. "Levanta uma tonelada de perguntas porque não sabemos mais nada, exceto que aqui existiu uma qualquer espécie de povo nesta altura".
Afastar hipótese de ação da natureza
Também o método de datação, baseado em modelos simples de como o urânio se entranha no osso vindo da água, não tem falhas óbvias mesmo sendo simplista.
"De forma geral, os resultados parecem ser tão bons como quaisquer outros", afirma Alistair Pike, um arqueólogo da Universidade de Southampton, especializado neste método de datação.
Já um especialista em ADN antigo, Pontus Skoglung, um geneticista de população da Universidade Médica de Harvard em Boston, Massachussets, refere que o estudo da relação da história evolutiva do mastodonte em causa com a de outros mastodontes poderá ajudar a estabelecer a idade do local.
"Se a descoberta se confirmar", acrescenta, "será uma das mais absolutas revisões da nossa visão do povoamento da Terra".
Antes de invocar a ação humana, os investigadores terão contudo de afastar definitivamente a possibilidade do efeito de forças naturais nas pedras e nos ossos, avança David Meltzer, um arqueóloga da Universidade Metodista de Dallas, no Texas.
"Se vamos atrasar a antiguidade humana no Novo Mundo em mais de 100 mil anos de uma penada, vamos precisar de o fazer com base num caso arqueológico bem melhor do que este", refere.
Quem seriam?
Entretanto, já há vários candidatos aos primeiros povoadores.
Os antepassados dos modernos humanos não-africanos deixaram aquele continente há menos de 100 mil anos mas migrações anteriores poderiam ter chegado à América do Norte referem Deméré e os seus colegas.
Já um especialista em ADN antigo, Pontus Skoglung, um geneticista de população da Universidade Médica de Harvard em Boston, Massachussets, refere que o estudo da relação da história evolutiva do mastodonte em causa com a de outros mastodontes poderá ajudar a estabelecer a idade do local.
"Se a descoberta se confirmar", acrescenta, "será uma das mais absolutas revisões da nossa visão do povoamento da Terra".
Antes de invocar a ação humana, os investigadores terão contudo de afastar definitivamente a possibilidade do efeito de forças naturais nas pedras e nos ossos, avança David Meltzer, um arqueóloga da Universidade Metodista de Dallas, no Texas.
"Se vamos atrasar a antiguidade humana no Novo Mundo em mais de 100 mil anos de uma penada, vamos precisar de o fazer com base num caso arqueológico bem melhor do que este", refere.
Quem seriam?
Entretanto, já há vários candidatos aos primeiros povoadores.
Os antepassados dos modernos humanos não-africanos deixaram aquele continente há menos de 100 mil anos mas migrações anteriores poderiam ter chegado à América do Norte referem Deméré e os seus colegas.
Lembram a descoberta de dentes semelhantes aos do Homo-sapiens e com 100 mil anos na China e vestígios genéticos que ligam grupos de indígenas da Amazónia a habitantes de ilhas asiáticas e apontam uma possível migração anterior para as Américas.
Chris Stringer, um paleoantropólogo do Museu de História Natural de Londres, é mais favorável à hipótese de Denisovanos ou de Neandertais, já que ambos viveram na Sibéria do Sul há pelo menos 100 mil anos. Mas não há provas de que qualquer um dos dois pudesse sobreviver à viagem através do Ártico, da Sibéria para o Alasca.
"Muitos de nós querem ver provas que sustentem esta antiga ocupação, noutros locais, antes de abandonarmos o modelo convencional de uma primeira chegada de hominídeos dentro dos últimos 15 mil anos", afirma.
"Vamos começar a procurar", promete Deméré, já com intenção de escavar noutro local da Califórnia que a sua equipa estudou há alguns anos.
Já Steven Holen espera que outros cientistas se juntem à busca. "Mantenham os olhos abertos para estes tipos de materiais quando estiverem em campo", apela.
"Não digam apenas 'não pode ser!'"