Histórico da Frelimo aponta "crise de existência" do partido após protestos

por Lusa

O primeiro ministro da saúde de Moçambique independente alertou hoje para a "crise que ameaça" a Frente de Libertação de Moçambique (Frelimo), após protestos, denunciando a existência de "infiltrados e negociantes" na organização.

"O nosso partido enfrenta, hoje, a pior crise de sempre, desde a fundação da Frelimo, em 1962. Uma crise que ameaça a existência da Frelimo como partido líder do desenvolvimento da nação", avisou Hélder Martins, numa carta dirigida ao presidente do partido, Filipe Nyusi, e ao seu secretário-geral, Daniel Chapo.

No documento de oito páginas a que a Lusa teve acesso hoje, o antigo governante alertou sobre "gravosas situações" que levam simpatizantes a afastarem-se da organização.

"Negar a existência da crise na Frelimo, hoje, é uma traição aos nobres desígnios do nosso partido, porque é condenar, intencionalmente, o partido à destruição", lê-se na carta do membro fundador da formação política e também médico.

"O nosso partido está infiltrado por oportunistas de todos os estilos, meros negociantes, gente que vê na política um meio de enriquecimento com os bens públicos e com o suor do povo, alguns dos quais chegando ardilosamente a tomar postos nos órgãos e na direção do partido, capturando-os", acrescentou.

Como consequência, escreveu, instalou-se na Frelimo o que considera de "obstrução ao direito à opinião" com o espaço para a discussão de ideias "fechado".

"Hoje, só a voz da bajulação é ouvida no partido", sentenciou.

Hélder Martins denunciou que, nos últimos anos, faltam requisitos para a admissão de membros e a definição de perfis para candidatos a dirigentes do partido.

"A par disto, foram-se abandonando critérios éticos nas fontes de financiamento do partido, aceitando-se dinheiro de fontes ilícitas e que mafiosos sejam tratados com respeito, só porque financiam o partido", apontou.

O ex-ministro chamou a atenção para a criação de um "exército de desempregados", em referência à "preocupante situação da juventude", apontando estatísticas que indicam que um em cada três jovens alcançaram os 18 anos nos últimos três anos, sendo que, deste número, apenas 5% a 7% conseguiram emprego formal.

"Ao desemprego somam-se a fome, a insegurança alimentar e a miséria, a falta de habitação, a fraca qualidade dos cuidados de Saúde, o estado caótico em que se encontra o nosso Sistema Nacional de Educação, a precariedade e insegurança do transporte público", destacou, reconhecendo que são estas dificuldades que estão a levar moçambicanos para as ruas, em contestação de resultados eleitorais.

Para "purificar as fileiras" do partido, Hélder Martins pediu a convocação da "conferência nacional de quadros" para se debater a situação económica, social e política do país, mas também para analisar a situação interna da Frelimo, definindo, nomeadamente, os perfis de candidatos a membros e a órgãos da organização.

As manifestações têm sido convocadas pelo candidato presidencial Venâncio Mondlane, que nega a vitória de Daniel Chapo, apoiado pela Frente de Libertação de Moçambique (Frelimo, no poder), dado como vencedor, com 70,67 % dos votos, segundo resultados anunciados pela Comissão Nacional de Eleições (CNE).

Mondlane ficou em segundo lugar, com 20,32%, mas este afirmou não reconhecer os resultados, que ainda têm de ser validados e proclamados pelo Conselho Constitucional, o qual não tem prazos para esse efeito e ainda está a analisar o contencioso.

Venâncio Mondlane anunciou que as manifestações de protesto são para manter até que seja reposta a verdade eleitoral, tendo apelado, na terça-feira, para que os moçambicanos cumpram três dias de luto nacional, iniciados na quarta-feira, pelas "50 vítimas mortais" que contabiliza nos protestos pós-eleitorais.

 

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