Uma fação nigeriana do grupo jihadista Estado Islâmico assinalou este Natal com a divulgação de um vídeo de quase um minuto, durante o qual 11 homens são executados, um a tiro e os restantes decapitados. O grupo afirmou que se tratava de cristãos e a intenção das mortes foi proclamada por um dos islamitas.
Tratou-se de "uma mensagem para os cristãos do mundo inteiro", afirmou o homem de cara tapada.
O grupo nigeriano responsável pelas mortes será proveniente de uma cisão no grupo islamista nigeriano Boko Haram, que mudou de campo e assumiu o nome Província da África Ocidental do Estado Islâmico, ISWAP na sigla em inglês.
O vídeo de 56 minutos, gravado "nas últimas semanas" numa localidade do Estado de Borno, no nordeste nigeriano, foi produzido e publicado dia 26 de dezembro à noite, pela agência Amaq, o organismo de propaganda do Estado Islâmico.
De acordo com a mensagem do vídeo, os cristãos foram executados para vingar a morte do líder do grupo, Abu Bakr al-Bagdhadi, e do seu porta-voz, Abul-Hasan Al-Muhajir, numa operação norte-americana na Síria.
A operação dos EUA, que resultou na morte dos dois líderes, ocorreu em outubro de 2019. Quase dois meses depois, a 22 de dezembro, o Estado Islâmico proclamou uma nova campanha militante para "vingar" as suas mortes. Desde então ocorreram uma série de ataques em vários países.
Em África os principais alvos têm sido as forças militares e as comunidades cristãs, procurando conversões forçadas ao islamismo e executando quem se recusa.
Na sua mensagem de Natal, o Papa Francisco denunciou estes ataques. O pontífice desejou "conforto àqueles que são perseguidos pela sua fé religiosa, especialmente missionários e membros dos fiéis que foram raptados, e às vítimas dos ataques de grupos extremistas, particularmente no Burkina Faso, Mali, Níger e Nigéria".
Ataques a cristãos agravam-se
Na Nigéria, de acordo com a fundação pontifícia Ajuda à Igreja que Sofre, os grupos islamitas têm atuado com total impunidade, apesar das promessas do Presidente, Muhammadu Buhari, de dominar os terroristas.
As próprias populações têm sido forçadas a formar milícias populares para se defenderem.
No início de dezembro, a Igreja Católica do país pediu mais
segurança, até pela aproximação do Natal, um período que está a
tornar-se especialmente difícil para as comunidades cristãs.
O apelo foi infrutífero. Nos últimos cinco dias houve ataques quase todos os dias.
Dia 24 de dezembro, numa ação atribuída ao grupo islamita Boko Haram a
uma aldeia cristã perto de Chibok, foram mortes sete pessoas e um
adolescente foi raptado.
Na última segunda-feira, pelo menos dois civis morreram e 13 ficaram feridos
num ataque do ISWAP contra uma posição militar na mesma região.
A 22 de dezembro, um ataque a um comboio militar nigeriano matou seis
soldados. No mesmo dia, cerca de 30 militantes do ISWAP mataram seis
pessoas e raptaram outras cinco, após bloquearem uma estrada principal
em Borno.
A violência já não afeta só o nordeste do país. Os sequestros de sacerdotes, contra pedidos de resgate, tornaram-se habituais no sul, de maioria cristã e até agora relativamente a salvo das ações islamitas.
Desde o inicio de 2019, foram
sequestrados pelo menos nove padres no Estado de Enugu, numa prova da crescente insegurança
sentida pelas comunidades. Apenas dois foram libertados com vida.
Cristãos em perigo de extinçãoNa última década, os islamitas de um dos grupos armados mais ativos no centro e ocidente de África, o Boko Haram, espalharam o terror no nordeste na Nigéria e nas regiões vizinhas de Chade, do Níger e dos Camarões, tentando expulsar as populações cristãs e forçar a criação de um califado.
De acordo com o balanço mais recente das Nações Unidas, estas ações terroristas fizeram pelo menos 36 mil mortos e provocaram dois milhões de deslocados. Só em 2018, segundo a AIS, foram mortos cerca de 3700 cristãos na Nigéria.
Praticamente todos os países vizinhos da Nigéria sofrem ações dos grupos armados, fiéis ou não ao grupo Estado Islâmico.
Em agosto de 2019, o presidente da Conferência Episcopal do Burkina Faso e do Níger, o
Bispo de Dori, D. Laurent Birfuoré Dabiré, denunciou os
massacres de cristãos por parte destes grupos, que actuam com
apoio do exterior e que, segundo ele, "estão melhor armados e equipados"
do que os elementos do exército nacional.
"Se o mundo
continuar a não fazer nada, o resultado será a eliminação da presença
cristã", alertou o prelado.
Num relatório recente, a AIS revelou que o Burkina Faso, o país mais pobre de África, se tornou o mais recente alvo da pressão islamita.
A violência do extremismo islâmico tem vindo a afetar as zonas norte e leste do país, vizinho do Mali, que tem uma longa história de luta contra os jihadistas, e do Níger, entre outros.
Neste país, apesar das operações lançadas pelas forças de
segurança, o assassínio de cristãos durante missas e procissões, e de sacerdotes, tem vindo a agravar-se.
Plano para "semear o terror"
Sobre a origem destes grupos armados que têm vindo a
aterrorizar as populações no norte do Burkina Faso, não há dados
concretos. As armas usadas nos diversos ataques "não são fabricadas"
localmente, asseguraram as fontes citadas pela Fundação AIS no seu relatório.
O alvo dos jihadistas têm sido tanto as comunidades católicas como protestantes, assim como as forças de Defesa.
Terça-feira, um duplo ataque a uma base militar e à cidade norte de Abinda fez 35 mortos civis, 31 deles mulheres. A crueldade dos islamitas deixou o país em estado de choque.
"Pessoas, mulheres na sua maioria, estavam a recolher água e foram assassinadas a sangue frio pelos terroristas, quando estes estavam em retirada", revelou o ministro das Comunicaçoes e porta-voz do Governo, Remis Dandjinou.Numa demonstração de solidariedade, "as bandeiras foram colocadas a meia-haste e todas as celebrações do Natal foram canceladas".
A defesa "heróica" dos militares levou à morte de 80 islamitas, referiu por seu lado o Presidente do Burkina Faso, Roch Marc Christian Kabore.
O ISWAP acabou por reivindicar este ataque, já na sexta-feira.
No início de dezembro, num ataque a uma igreja protestante em Hantoukoura, no leste do Burkina Faso, haviam sido executados também "a sangue frio" pelo menos 14 cristãos durante um serviço religioso, incluindo o pastor e algumas crianças.
Nas localidades de Hitté e de Rounga, os cristãos estão a ser forçados pela ameaça islamita a abandonar as suas casas, para não se converterem ao Islão.
Fontes da AIS referem um "plano para semear o terror" neste país africano, que procura provocar um conflito religioso e que está a provocar a fuga das populações.
As autoridades eclesiásticas falam numa "situação muito difícil de gerir", mas sublinham a onda de solidariedade que se tem gerado e que envolve igualmente elementos da população muçulmana.