Governo britânico aprova acordo de Theresa May para o Brexit

por Andreia Martins - RTP
Theresa May confirmou que o acordo foi aprovado pelo Governo britânico ao fim de um "debate longo, detalhado e acalorado" Henry Nicholls - Reuters

O acordo técnico alcançado entre Londres e Bruxelas foi esta quarta-feira aprovado pelo executivo britânico. A decisão surge depois de um Conselho de Ministros extraordinário que se estendeu por cinco horas.

O anúncio foi feito durante uma curta declaração aos jornalistas junto ao número 10 de Downing Street, residência oficial da primeira-ministra britânica.

Theresa May informou que o rascunho de acordo para a saída do Reino Unido da União Europeia foi aprovado "coletivamente" pelo Governo britânico ao fim de um "debate longo, detalhado e acalorado" e de "milhares de horas" de negociações.

"Acredito firmemente, com a minha mente e o meu coração, que esta é uma decisão que serve os interesses do Reino Unido", afirmou a líder britânica.

Nesta declaração aos jornalistas - que não teve direito a perguntas - Theresa May considerou que o acordo aprovado cumpre com o que foi aprovado no referendo de 2016 sobre a saída do Reino Unido da União Europeia.

De acordo com o jornalista Christopher Hope, do diário britânico The Telegraph, um terço do Governo reunido esta tarde "manifestou-se contra o acordo". No total, 11 dos 29 ministros apresentaram uma visão negativa deste entendimento. "Não foi, definitivamente, uma aprovação unânime ao acordo de Theresa May para o Brexit", acrescenta o repórter.


Juncker vê "progresso decisivo"

Na mesma noite em que o acordo foi aprovado, o Governo britânico disponibilizou o documento à imprensa. São mais de 585 páginas sobre os termos da saída do Reino Unido da União Europeia. Um outro documento com sete páginas expõe o quadro político para uma relação futura entre as partes.

Depois do anúncio de terça-feira sobre o acordo alcançado a nível técnico, as entidades europeias foram cautelosas e só hoje, após a aprovação dos ministros, se manifestaram sobre o documento.

Poucos minutos após a declaração de Theresa May, o presidente da Comissão Europeia, Jean-Claude Juncker, considerou que o esboço de acordo constitui um "progresso decisivo" na saída britânica, abrindo caminho à realização de uma cimeira extraordinária sobre o Brexit ainda durante o mês de novembro. 


Em conferência de imprensa a partir de Bruxelas, Michel Barnier, responsável que negociou o acordo em nome da União Europeia, considerou que o esboço deste entendimento é um passo decisivo para consumar o Brexit.

"Este acordo é decisivo, um passo crucial para concluir as negociações", apontou Michel Barnier, acrescentando que o caminho que falta para terminar o processo será "difícil".



O negociador-chefe do lado europeu considera que foi encontrada uma solução para a questão da fronteira entre a Irlanda do Norte, membro integrante do Reino Unido, e a República da Irlanda, Estado-membro da União Europeia que ocupa grande parte da ilha irlandesa.

"A Irlanda do Norte vai continuar no mesmo território aduaneiro do restante Reino Unido. Além disso, a Irlanda do Norte vai permanecer alinhada com as regras do mercado único, essenciais para evitar uma barreira física", acrescentou.

Michel Barnier esclareceu ainda que o chamado "backstop", um procedimento como solução de recurso - que evita a violação do Acordo de Sexta-Feira Santa, assinado em 1998 ao fim de mais de 30 anos de violência entre unionistas afetos a Londres e separatistas republicanos -, só será ativado caso a parceria futura entre Bruxelas e Londres não fique de fechada antes do final do período de transição, que termina a 31 de dezembro de 2020.

Este prazo só poderá ser prolongado uma única vez por uma duração limitada. O primeiro-ministro irlandês, Leo Varadkar, já reagiu às alíneas do acordo sobre a questão da fronteira, considerando que todas as exigências de Dublin foram respeitadas.

"Estas prioridades protegem o Acordo de Sexta-Feira Santa (...) e mantêm os beneficios para cidadãos irlandeses e britânicos, reafirmando o nosso lugar no coração da União Europeia", disse o líder do Governo irlandês.
Moção de censura? 

Na declaração desta quarta-feira, a primeira-ministra britânica reconheceu que a decisão do Governo "vai estar sob intenso escrutínio". E reconheceu: "Sei que vêm aí dias difíceis".

Já esta quinta-feira, Theresa May vai à Câmara dos Comuns explicar o acordo técnico perante os deputados, mas a votação só deverá acontecer em dezembro.

Ao longo dos últimos dias, vários parlamentares - eurocéticos e europeístas - demonstraram o desagrado para com o plano do Governo britânico.

Para dar seguimento a este acordo, Theresa May irá necessitar de pelo menos 320 votos, mas esta será uma missão difícil, uma vez que enfrenta críticos ferozes dentro do próprio Partido Conservador.

Durante a tarde, enquanto decorria o Conselho de Ministros extraordinário, a imprensa britânica avançou mesmo que os tories mais críticos do acordo poderão avançar com uma moção de censura contra a primeira-ministra.

No Twitter, a editora de política da BBC Laura Kuenssberg cita um responsável do Partido Conservador: "A raiva é tanta neste momento que parece provável que haja uma moção de censura amanhã [quinta-feira]". "As cartas estão a chegar", acrescentou a jornalista no mesmo tweet


Um possível desafio à liderança de Theresa May só poderá ser desencadeado se 15 por cento dos membros do Partido Conservador no Parlamento avançarem para a moção de censura contra a líder do partido, que é neste caso a primeira-ministra.

Sendo que o Partido Conservador conta com 315 parlamentares, serão necessárias pelo menos 48 cartas para dar luz verde à votação.

Já esta noite, a líder do DUP (Partido Unionista Democrático), Arlene Foster, anunciou que o partido não poderá apoiar o acordo e que "haverá consequências" quando este for votado na Câmara dos Comuns.


"Enquanto unionistas, não podemos dar apoio a um acordo que fragmente o Reino Unido", afirmou a responsável em declarações aos jornalistas. De recordar que o DUP é o partido da Irlanda do Norte que apoia o Governo minoritário de Theresa May saído das últimas eleições legislativas.

No mesmo sentido, a primeira-ministra da Escócia, Nicola Sturgeon, considerou que o acordo é "mau" para os escoceses.

"É óbvio que [Theresa May] mal consegue unir o seu próprio gabinete sobre este acordo, e torna-se também cada vez mais claro que vai encontrar muitas dificuldades para alcançar uma maioria no Parlamento. Se este acordo for rejeitado, o Governo britânico terá de voltar à mesa das negociações para alcançar um melhor", considera Sturgeon numa resposta por escrito enviada esta quarta-feira aos meios de comunicação britânicos.
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