Crise política em França. Deputados aprovam moção de censura contra o Governo

por Andreia Martins - RTP
Foto: Sarah Meyssonnier - Reuters

A Assembleia Nacional Francesa votou esta quarta-feira a favor da destituição do primeiro-ministro Michel Barnier. O Governo francês cai menos de três meses depois de ter assumido funções.

Michel Barnier está de saída do Hôtel Matignon nove semanas depois da tomada de posse e menos de meio ano desde as últimas eleições legislativas. Para ser aprovada, a moção de censura necessitava do voto favorável de 288 dos 577 deputados. No total, 331 deputados votaram a favor da moção.

Emmanuel Macron chegou a França esta quarta-feira após uma visita à Arábia Saudita. O presidente irá falar aos franceses na quinta-feira às 20h00 locais (19h00 em Portugal Continental).

A moção de censura foi aprovada com os votos da União Nacional, de extrema-direita, e da coligação de esquerda Nova Frente Popular, que acusaram Michel Barnier de não ter ouvido as exigências ao validar um Orçamento para a segurança social sem apoio parlamentar.

Barnier recorreu na última segunda-feira ao artigo 49.3 da Constituição francesa, que prevê a possibilidade de aprovar leis evitando uma votação parlamentar. Em troca, o Governo é submetido a uma moção de censura.

Este é o mandato mais curto de sempre de um primeiro-ministro na V República e apenas a segunda vez na história que um executivo é censurado por uma moção aprovada no Parlamento.
A primeira vez tinha sido em 1962, com a queda do Governo de Georges Pompidou.
O que se segue?

Segundo a Constituição francesa, com este resultado na Assembleia Nacional, a demissão do primeiro-ministro está assegurada, mas necessita ainda assim de ser formalizada perante o Eliseu, o que acontecerá esta quinta-feira, pelas 10h00 locais. 

Depois da moção de censura, o Governo demissionário mantém-se em funções até que haja um sucessor, mas não pode levar a votação os documentos orçamentais já existentes, o que poderá dificultar a adoção de um orçamento até ao final de 2024.

O jornal Le Monde escreve esta quarta-feira que a questão está a ser alvo de debate entre os constitucionalistas. Alguns defendem que a rejeição do Governo de Barnier leva à anulação imediata do Orçamento do Estado para 2025 (PLF) e de outros documentos que estavam a ser discutidos. Outros consideram, por outro lado, que nada impede um novo Executivo de apresentar o mesmo documento ou uma versão alterada do mesmo.

No discurso que antecedeu a votação, Michel Barnier tinha alertado que os desafios económicos que o país enfrenta "não desaparecem com uma moção de censura".

De recordar que o primeiro-ministro chegou ao poder a 5 de setembro, após várias semanas de impasse. Em junho último, o presidente francês convocou eleições legislativas antecipadas na sequência da vitória da extrema-direita nas eleições europeias. 

Esse escrutínio, finalizado a 7 de julho, resultou numa Assembleia Nacional fragmentada em que a coligação de esquerda Nova Frente Nacional saiu vencedora, mas não conseguiu que Emmanuel Macron aprovasse as suas propostas de nomeação de um primeiro-ministro.

Foi o presidente Macron que acabou por lançar o nome de Michel Barnier, proposta que acabaria por ser aprovada com a garantia de que a extrema-direita não faria cair Michel Barnier.
As reações à esquerda e à direita
Marine Le Pen, da União Nacional, considera que Emmanuel Macron é o "grande responsável" pela situação que o país vive. Em declarações à TF1, Le Pen considera que a pressão sobre o presidente "será cada vez mais forte", mas especificou: "Não peço a demissão de Emmanuel Macron".

A líder da União Nacional está envolvida num processo judicial por desvio de fundos do Parlamento Europeu e a sentença deverá ser conhecida no final de março de 2025, o que coincidiria com o calendário de uma eleição presidencial antecipada. Marine Le Pen pretende que um eventual escrutínio possa acontecer só depois da leitura dessa sentença.

Em novembro, o Ministério Público francês pediu uma pena de prisão de cinco anos (incluindo uma pena de prisão efetiva de dois anos) e uma pena de inelegibilidade de cinco anos. Essa sentença proibiria os arguidos de concorrer "em futuras eleições locais ou nacionais".

Por seu lado, a esquerda radical exige a demissão de Emmanuel Macron. A presidente do grupo parlamentar, Mathilde Panot, apelou à saída imediata de Emmanuel Macron, exigindo "eleições presidenciais antecipadas".

Apesar da moção de censura ao Governo, o presidente francês não é obrigado, de um ponto de vista constitucional, a apresentar a demissão.
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