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Fixação europeia nos fluxos ilegais confunde verdade das migrações de África

por Lusa
Leonhard Foeger - Reuters

O representante da União Africana (UA) e economista guineense Carlos Lopes disse hoje que a tendência europeia de se fixar na migração ilegal "confunde a natureza e a verdade dos números" das migrações africanas para a Europa.

"A tendência da Europa de se concentrar na migração ilegal e na repatriação de requerentes de asilo reprovados confunde a natureza da migração da África para a Europa e confunde também, na opinião pública, a verdade dos números", disse Carlos Lopes.

O Alto-Representante da UA para as Parcerias com a Europa falava hoje na conferência "Segurança e Desenvolvimento. Desafios para Portugal, Europa e África", promovida em parceria pelo Centro de Estudos Internacionais do ISCTE e pelo Instituto da Defesa Nacional no âmbito da Presidência Portuguesa do Conselho da União Europeia.

Para Carlos Lopes, a discussão migratória tem sido "muito dominada pelo discurso político e não por dados e factos", desmistificando a ideia de que os africanos são os principais migrantes para a Europa.

"Neste momento, a China bate a África de longe. É apenas um país e ninguém fala da China com o vigor que se fala dos migrantes africanos", disse.

Carlos Lopes assinalou que apenas um quarto dos migrantes africanos estão na Europa, e destes, apenas 6% são ilegais, considerando que este "é o número mágico que deve ser sublinhado sempre".

"Não é esta a visão que as pessoas têm, tal como ter havido uma diminuição significativa dos migrantes, quando as pessoas pensam que há um aumento. No Mediterrâneo, mesmo com todo o drama e a tragédia, temos vindo a constatar uma diminuição nos fluxos de migrantes", apontou.

Neste contexto, Carlos Lopes defende um "tratamento diferente" para África nas rotas legais e regulares de migração, numa altura em que a "discussão é cada vez mais centrada no irregular".

"A esmagadora maioria [dos migrantes] tem residência legal. Registou-se um aumento do número de pedidos de asilo de migrantes que chegam às costas do Mediterrâneo, mas porque o pedido de asilo é o primeiro e cada vez mais o único passo disponível para entrar na União Europeia", considerou.

Carlos Lopes adiantou que tem havido "uma diminuição dramática" das migrações africanas para a Europa, particularmente das migrações irregulares.

"O número de migrantes irregulares intercetados pela Frontex diminuiu 69% entre 2016 e 2018, enquanto a migração da União Europeia para África cresceu 19% no mesmo período", notou.

Segundo o economista guineense, apesar desta melhoria, as rotas de migração legal são "cada vez mais restritas" e os países africanos "dominam sistematicamente a maior taxa de recusa para pedidos de vistos Schengen", sendo que oito dos dez países que têm este tipo de vistos recusados são africanos.

"A taxa de recusa média é de 37% em comparação com 0,8% para a Rússia e 0,3% para a China, países que exportam mais migrantes para a Europa do que qualquer país africano", disse.

Carlos Lopes considerou que, nas suas políticas migratórias, a União Europeia está "mais interessada nos esforços para concluir acordos de readmissão [de migrantes] com países africanos", considerando que estes protocolos preveem, entre outras cláusulas, a obrigação dos estados aceitarem nacionais de países terceiros que tenham cruzado as suas fronteiras para chegar à Europa.

"Em janeiro, tinha apenas um acordo com esse tipo de exigência que assinou com Cabo Verde. Com a Tunísia e Marrocos, iniciou negociações para obter o mesmo tipo de quadro, mas com o que se passa atualmente em Ceuta não vai ser muito fácil", apontou, numa referência à crise vivida na última semana na fronteira daquele território autónomo de Espanha.

O representante da UA recordou ainda o apelo lançado pela União Europeia para negociações com os países africanos, em 2018, para o estabelecimento das chamadas "plataforma de desembarque", seguindo o modelo concluindo com a Turquia por causa dos refugiados sírios.

Carlos Lopes admite que as "migrações continuam a ser uma questão controversa" entre a União Europeia e África, defendendo que as negociações sobre esta matéria entre os dois blocos devem ser "focadas tanto na migração regular, como na irregular".

"Qualquer acordo sobre migrações deve incorporar a dimensão de desenvolvimento, incluindo a migração como fonte de financiamento do desenvolvimento de África", disse.

Para o alto-representante da União Africana para as Parcerias com a Europa "é muito importante que a discussão sobre migrações deixe de ser tão politizada", mas reconheceu que é um exercício "difícil".

"Os populistas ocupam terreno na Europa e obrigam a posições extremistas nesta matéria e também existe por parte de África uma acomodação a um certo cinismo de assinar tudo o que os europeus pedem e depois não fazer", disse.

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