Foi um dia histórico o que se viveu em Moçambique esta quinta-feira, 1 de Agosto de 2019, com a assinatura de um novo acordo de paz, o terceiro em três décadas. O processo de negociação concluído com as assinaturas do presidente Nyusi e do líder da Renamo, Ossufo Momade, decorreu no Parque da Gorongosa com um objetivo comum: é tempo de colocar um ponto final nos confrontos e traçar o futuro do país segundo as coordenadas da paz.
Pedro Martins, correspondente da RTP em Moçambique
Um forte abraço entre Filipe Nyusi e Ossufo Momade selou o acordo fechado ao início da tarde no Parque da Gorongosa, centro do país, uma escolha com forte componente simbólica, já que se trata de uma região dominada politicamente pela Renamo, precisamente onde o principal partido da oposição mantém o seu quartel-general.Do conteúdo deste acordo faz parte um processo de entrega de armas e a integração dos guerrilheiros da Renamo nas forças de segurança e da polícia.
É também esse o desejo da população moçambicana: que este terceiro acordo seja capaz de levar a Moçambique um clima de paz que faça esquecer os anos de tensão entre os dois partidos.A Renamo entregou os nomes dos seus oficiais que serão nomeados para postos de comando nas Forças Armadas de Defesa de Moçambique.
Uma primeira iniciativa em busca da paz teve lugar há 27 anos, em 1992, quando a Frelimo de Joaquim Chissano e a Renamo então liderada por Afonso Dlhakama – que trabalhou no presente acordo com Filipe Nyusi até ao seu falecimento em maio do ano passado – firmaram um Acordo Geral de Paz que punha termo a 16 anos de guerra civil. O pacto seria violado entre 2013 e 2014, quando as partes se envolveram em confronto armado espoletados por desentendimentos relativos ao processo eleitoral.
Novamente de volta à mesa de negociações, os dois principais partidos do país assinaram em 2014 um outro acordo de cessação das hostilidades militares que estava já destinado a ser rasgado entre acusações de fraude no escrutínio. Dois anos depois, em 2016, são declaradas tréguas por tempo indeterminado, mas falta um acordo formal ao entendimento, um acordo que chega agora pela mão de Nyusi e Momade.
“Incerteza dá lugar à esperança”
O presidente moçambicano declarou após a cerimónia das assinaturas que está enterrada de vez a confrontação armada: “Somos nós, moçambicanos, que escolhemos enterrar definitivamente a confrontação armada”, sublinhou Filipe Nyusi, para garantir que “a incerteza quanto ao futuro de Moçambique deu lugar à esperança de paz, reconciliação nacional e desenvolvimento social e económico”.
“Hoje, dia 1 de agosto, fica indelevelmente marcado na história do povo moçambicano como o dia em que irmãos se encontram em atos e sentimentos e dizem basta à guerra”, acrescentou o chefe de estado no discurso da Gorongosa. “A partir de hoje abre-se uma nova era na história do nosso país onde nenhum moçambicano ou grupo de moçambicanos deve usar a violência armada como meio de solucionar diferenças políticas ou de opinião”.
Nyusi acredita que o acordo abre as portas a uma “nova era, para um verdadeiro processo de reconciliação nacional, condição necessária para o desenvolvimento económico e social” do país.
“Com este acordo queremos que Moçambique se junte a outras nações da região e do mundo onde o primado da lei é prática instituída na resolução de conflitos”, propugnou o presidente.
Fim da "lógica da violência"
Ossufo Momade tomou também a palavra para anunciar o fim da “lógica de violência”, uma receita para a paz duradoura: “Queremos garantir ao nosso povo e ao mundo que enterrámos a lógica da violência como forma de resolução das nossas diferenças”.
O líder da Renamo sublinhou que o partido se compromete a trabalhar para a manutenção da paz e reconciliação nacional como alicerces para o desenvolvimento económico e social.
“Queremos enterrar a cultura da violência e da falta de aceitação do outro, a negação das liberdades e dos direitos fundamentas dos moçambicanos”, declarou Momade.
“Passo enorme para a paz e estabilidade”
O ministro português dos Negócios Estrangeiros referia-se ainda ontem ao acordo como “um passo enorme para a paz e para a estabilidade” dos moçambicanos.
“Este acordo significará um passo enorme para a paz e a estabilidade de Moçambique e um fator muito importante para o desenvolvimento económico e social, para o bem-estar e para a segurança das populações moçambicanas”, afirmou Augusto Santos Silva à Lusa na véspera da assinatura.
O chefe da diplomacia portuguesa explicou que Portugal foi acompanhando “o trabalho muito intenso, demorado, mas empenhado, conduzido ao mais alto nível (...). Um trabalho que teve um objetivo que agora foi cumprido (...) de trazer a paz a Moçambique definitivamente, celebrando um acordo para a cessação definitiva das hostilidades militares que ainda restavam entre a Renamo e o Estado moçambicano”.
O acordo de paz com a Renamo anunciado hoje em Maputo é uma excelente notícia para #Moçambique e para a África lusófona. A paz é o melhor caminho para o desenvolvimento e prosperidade. Os moçambicanos merecem. #Portugal saúda esta notícia com alegria e sólida esperança no futuro.
— António Costa (@antoniocostapm) July 31, 2019
Através da sua conta no Twitter, o primeiro-ministro António Costa saudou aquilo que considera ser “uma excelente notícia para Moçambique”.