A historiadora e jornalista norte-americana Anne Applebaum questiona a posição "muito, muito estranha" do Presidente do Brasil, Lula da Silva, após as eleições presidenciais "antidemocráticas" na Venezuela, num contexto de aproximação a regimes autocráticos como o chinês.
"Não percebo porque é que o líder, democraticamente eleito, do maior país da América do Sul não quer que se realizem eleições democráticas na Venezuela", disse a autora em entrevista à Lusa a partir de Nova Iorque.
Num contexto em que "a oposição ganhou as eleições, tem as provas e pode demonstrá-las", Applebaum disse que esperava que o "Brasil desempenhasse um papel importante em convencer [Nicolás] Maduro de que tinha perdido e que deveria sair".
A Venezuela realizou eleições presidenciais no passado dia 28 de julho, após as quais o Conselho Nacional Eleitoral (CNE) atribuiu a vitória a Nicolás Maduro com pouco mais de 51% dos votos, sem apresentar as atas da votação, o que levou a que grande parte da comunidade internacional não reconhecesse o resultado.
Munida das atas, a oposição venezuelana contesta os dados oficiais e alega que o seu candidato, o antigo diplomata Edmundo González Urrutia, atualmente asilado na Espanha, obteve quase 70% dos votos.
Os resultados eleitorais foram contestados nas ruas, com manifestações reprimidas pelas forças de segurança, com o registo, segundo as autoridades, de mais de 2.400 detenções, 27 mortos e 192 feridos.
Após a decretada vitória presidencial de Maduro, Anne Applebaum acredita que a Venezuela continuará a "provocar caos, violência e refugiados" até ao afastamento do líder venezuelano, o que contribui para a sua relutância em compreender a decisão de Lula.
Autora do novo livro "Autocracia, Inc. - Os ditadores que querem governar o mundo", Anne Applebaum é historiadora e jornalista norte-americana, vencedora do Prémio Pulitzer em 2004.
Applebaum é ainda redatora da equipa do The Atlantic e membro sénior do Agora Institute da Universidade Johns Hopkins, onde co-dirige um projeto sobre a desinformação do século XXI.
A jornalista alertou ainda para a aproximação do Brasil à China, com Lula a manifestar intenções de "jogar algum tipo de jogo com a China".
"Não sei se [a aproximação de Lula à China] é por causa de investimento ou se é por causa do apoio político", adiantou.
Sobre a posição do Brasil em relação à invasão da Ucrânia pela Rússia, tema pouco prioritário da agenda da política internacional, Applebaum diz que "a influência brasileira não fará diferença".