Várias unidades do Exército espanhol foram enviadas para Ceuta na manhã desta terça-feira para controlar as ruas da cidade, após cerca de seis mil migrantes terem entrado de forma ilegal no enclave espanhol desde a véspera. Espanha já reenviou para Marrocos 2700 destas pessoas. O primeiro-ministro espanhol garantiu que o Governo irá utilizar "a máxima firmeza" para restaurar a normalidade em Ceuta.
As autoridades espanholas e marroquinas tinham concordado em devolver a Marrocos os jovens daquele país que chegassem a Ceuta e o ministro espanhol da Administração Interna, Fernando Grande-Marlaska, anunciou esta terça-feira que já reenviaram para Marrocos 2700 dos seis mil migrantes “e estamos a continuar essas devoluções”.
"A lei, os tratados internacionais e os nossos acordos com Marrocos" serão aplicados para a proteção dos cerca de 1500 menores que estão entre os imigrantes, assegurou o ministro espanhol.
Para agilizar este processo e garantir a segurança dos cidadãos, Grande-Marlaska anunciou que ainda esta terça-feira chegarão ao enclave espanhol 200 militares, 150 polícias nacionais e 50 guardas civis para complementar os 1100 efetivos que habitualmente se encontram na cidade de Ceuta.
“Ceuta é tanto Espanha como Madrid ou Barcelona. Vamos ser incisivos na defesa das nossas fronteiras”, garantiu Grande-Maslaska. “Seremos tão beligerantes na defesa das nossas fronteiras como somos na luta contra o discurso de ódio”, acrescentou.
“Tem sido uma noite de tensa calmaria, mantivemos nossas posições como ontem [segunda-feira] para vê-los chegar, porque perante uma avalanche de pessoas com estas características não podemos fazer mais nada”, disse um guarda civil a El País, que teme o surgimento de problemas de segurança, uma vez que a cidade não tem capacidade para controlar todos estes imigrantes. Na manhã desta terça-feira, houve relatos de confrontos entre um grupo de imigrantes e a guarda civil.
“A cidade está lotada, há grupos de imigrantes em todas as ruas, principalmente na zona portuária, no centro e no bairro de San José”, afirmou um agente. “A maioria, 99 por cento, é jovem”, acrescenta.
Pedro Sánchez assegura “máxima firmeza”
Numa mensagem publicada na rede social Twitter, o primeiro-ministro espanhol, Pedro Sánchez, garantiu que o Governo irá utilizar "a máxima firmeza" para restaurar a normalidade em Ceuta.
Mi prioridad en este momento es devolver la normalidad a Ceuta. Sus ciudadanos y ciudadanas deben saber que cuentan con el apoyo absoluto del Gobierno de España y la máxima firmeza para velar por su seguridad y defender su integridad como parte del país ante cualquier desafío.
— Pedro Sánchez (@sanchezcastejon) May 18, 2021
"A minha prioridade neste momento é devolver a normalidade a Ceuta. Os seus cidadãos devem saber que têm o apoio total do Governo de Espanha e a máxima firmeza para garantir a sua segurança e defender a sua integridade como parte do país face a qualquer desafio", afiançou o chefe do Executivo.
A situação no enclave espanhol no norte de África levou Pedro Sánchez a cancelar a viagem que tinha prevista a Paris para participar numa cimeira sobre o financiamento de África organizada pelo Presidente francês, Emmanuel Macron.
No final desta manhã, após a reunião semanal do Conselho de Ministros espanhol, Sánchez fará uma declaração institucional a partir da sede do Governo, o Palácio da Moncloa, sobre a situação em Ceuta.
“Estado de exceção”
O presidente de Ceuta, Juan Jesús Vivas, garantiu, por sua vez, que a situação atual na cidade é de “exceção”, justificando com a pandemia da Covid-19. “As pessoas estão fechadas em casa. As crianças não foram à escola. Não está apenas em jogo a tranquilidade de Ceuta, mas também a integridade territorial espanhola”, afirmou Jesús Vivas esta terça-feira.
O presidente de Ceuta afirma que a cidade “sofreu uma invasão” e defende que “seria um erro tratar este assunto como um problema migratório. Isto vai além do campo migratório e atinge outros aspetos pela forma como ocorreu, pelo número de pessoas e pela atitude das autoridades marroquinas”.
Jesús Vivas implorou ainda ao Governo espanhol para que seja dada “uma resposta proporcional, eficaz, contundente e imediata”. “O Estado tem de estar presente e responder. Precisamos que a polícia, a Guarda Civil e o Exército continuem a atuar e a exercer toda a capacidade diplomática”, asseverou o presidente de Ceuta.
A entrada massiva de marroquinos em Ceuta ocorre num contexto de tensão diplomática com Marrocos, após a hospitalização em Espanha do líder do movimento de independência saharaui Frente Polisario, que estava a ser tratado e a recuperar da infeção por Covid-19.
O chefe da diplomacia marroquina Nasser Bourita convocou, em abril, o embaixador espanhol para expressar "incompreensão e exasperação" e "pedir explicações" após a receção em Espanha do secretário-geral da Polisario. O Ministério dos Negócios Estrangeiros justificou a receção do dirigente saharaui, a pedido da Argélia, "por razões estritamente humanitárias", mas Marrocos considerou o gesto uma decisão "premeditada" e tomada "nas costas de um parceiro e vizinho".
Durante as declarações desta terça-feira, o ministro espanhol da Administração Interna minimizou este conflito e sublinhou que o Executivo espanhol tem “uma relação absolutamente frutífera com o Governo de Marrocos em questões de migração”. “Vemos como muitas pessoas morrem no mar. Estamos perante uma crise migratória contínua. Esta é uma situação excecional, mas conseguimos reverter a situação”, afirmou Grande-Marlaska.
Pelo menos cinco mil migrantes, incluindo mil menores, já tinham chegado a Ceuta na segunda-feira ao longo do dia, tratando-se, segundo as autoridades espanholas, de um número “recorde”. Nem mesmo nas épocas de maior pressão migratória foram alcançados números semelhantes. O recorde mais recente foi quebrado em novembro do ano passado, quando cerca de 1500 pessoas entraram nas Ilhas Canárias num único dia e um total de 2200 migrantes desembarcou durante o fim-de-semana de 7 e 8 de novembro.
No ano passado, 41.861 migrantes chegaram de forma irregular a Espanha, por via marítima e por via terrestre, um aumento de 29 por cento em relação a 2019, em parte por causa da forte pressão migratória verificada nas Ilhas Canárias, segundo dados oficiais.