EUA avisam. Coreia do Norte "irá pagar o preço" se ajudar a Rússia com armamento

por Graça Andrade Ramos - RTP
O líder da Coreia do Norte. Kim Jong Un, visita uma fábrica de produção de mísseis, uma da rede da indústria de Defesa norte-coreana, a 13 de agosto de 2023 KCNA - Reuters

Pyongyang irá enfrentar consequências se providenciar armas para Moscovo prosseguir com a guerra contra a Ucrânia, avisou Washington.

"Irá pagar o preço por isso por parte da comunidade internacional", afirmou aos repórteres esta terça-feira o Conselheiro para a Segurança Nacional dos EUA, Jake Sullivan.

A ameaça pode não passar disso mesmo, uma vez que tanto Moscovo como Pequim deverão bloquear quaisquer tentativas de castigar a Coreia do Norte com novas sanções internacionais.

A Administração Biden assume preocupação com a hipótese, avançada pelos seus serviços de informação, de que o Kremlin está em contactos com o Governo norte-coreano para aprofundar os laços militares bilaterais, incluindo o fornecimento de munições de artilharia e mísseis, para repor os seus arsenais esgotados pela guerra na Ucrânia.

Segunda-feira, fontes norte-americanas avançaram a possibilidade de um encontro entre o Presidente russo Vladimir Putin, e o seu homólogo Kim Jong Un, em Vladivostok, na próxima semana, precisamente para discutir o assunto.

Questionado sobre essa possibilidade, Dmitri Peskov, porta-voz do Kremlin, recusou quaisquer esclarecimentos. "Não há nada a comentar", disse.

A Coreia do Norte assumiu compromissos internacionais para recusar auxílio militar à Rússia. Contudo, Pyongyang poderá ceder aos pedidos russos em troca de tecnologia nuclear ou espacial e de mantimentos de que necessita.
Apelo dos EUA
Washington quer evitar a todo o custo que a indústria de armamento norte-coreana comece a vender os seus arsenais a Moscovo
ou a produzir munições para a Rússia, quando a mesma capacidade de entrega e de produção está a esgotar-se do lado ocidental.

Esta quarta-feira, o porta-voz da Casa Branca para a Segurança Nacional, John Kirby, confirmou que as negociações de armamento entre a Rússia e a Coreia do Norte progridem ativamente.

Kirby confirmou igualmente relatos de que Putin e Kim têm estado a trocar correspondência na qual se comprometem a aprofundar a cooperação bilateral e a estabelecer acordos militares que permitiriam a Moscovo aceder a armamento para repor as perdas sofridas na Ucrânia, assim como matérias-primas para relançar a sua indústria de Defesa.

O porta-voz da Casa Branca sublinhou que tais acordos seriam uma violação das resoluções do Conselho de Segurança das Nações Unidas.

"Apelamos à República Popular Democrática da Coreia do Norte que cesse as suas negociações de armas com a Rússia e respeite os compromissos públicos subscritos por Pyongyang, no sentido de não fornecer nem vender armas à Rússia", disse Kirby aos repórteres presentes.
Seul atenta
A Coreia do Sul, aliada dos Estados Unidos na Ásia, vê com igual preocupação os resultados de uma possível aproximação militar entre a Rússia e o sue vizinho do Norte. 

Seul acredita que o ministro russo da Defesa, numa visita em julho a Pyongyang, se reuniu a sós com o líder norte-coreano, a quem terá proposto intercâmbios militares não só entre os dois países mas também aproximação à China. Sergei Shoigu confirmou esta segunda-feira que Moscovo está a contemplar a realização de exercícios navais conjuntos entre as frotas russa, chinesa e norte-coreana.

Seul receia a transferência de tecnologia de armamento russa para a Coreia do Norte e de conhecimentos que permitam a Pyongyang conseguir avanços no seu programa nuclear, incluindo submarinos e satélites-espiões, que não conseguiu até agora desenvolver.

Um observador para o Instituto Asiático de Estudos Políticos, Yang Uk, admite que "Moscovo possa pagar as armas norte-coreanas através de petróleo e comida e com isso reavivar a moribunda economia norte-coreana" com uma nova fonte de rendimentos.

Yang, especialista em estratégia militar e sistemas de armamento, acrescenta que a aproximação entre Moscovo e Pyongyang poderia fazer ruir "de uma penada" todo o edifício de sanções internacionais que têm impedido a Coreia do Norte de desenvolver armas nucleares.

A "Rússia é membro permanente do Conselho de Segurança da ONU e pode causar o colapso de todo o sistema", afirmou o analista. No último ano, graças à intervenção da China, a comunidade internacional tem sido incapaz de castigar a Coreia do Norte pelos testes nucleares que tem vindo a efetuar crescentemente, e a Rússia iria contribuir para esta muralha.
O que busca Kim
Para o líder da Coreia do Norte, a amizade com Vladimir Putin poderia igualmente contrabalançar a dependência de Pequim, sobretudo a nível alimentar e de estratégias para evitar as sanções internacionais, frisou Yang.

Um Putin desesperado pode também revelar-se generoso e não seria a primeira vez que a Coreia do Norte colocaria Pequim e Moscovo em competição de apoios, "como uma criança chantageia os pais desavindos", apontou por seu lado o Dr Bernard Loo, da Escola de Estudos Internacionais de Singapura. "Já o fez durante a Guerra Fria", lembrou.

A favor dos Estados Unidos e de Seul estará a paranóia com a própria segurança que leva Kim Jong Un a recear viajar além das fronteiras do seu país. Uma visita a Vladivostok, como foi avançado, pode ser uma aventura demasiado arriscada. 


Contudo, considerou Loo, a capacidade de manobra de Kim é "limitada". "Depois da publicidade feita aos exercícios navais tripartidos ser-lhe-ia difícil cancelar este tipo de eventos", afirmou.

Parte da estratégia norte-americana, para impedir tanto a China como a Coreia do Norte de fornecer armamento à Rússia, tem sido por isso expor publicamente tais acordos, de forma a evitar que avancem.

Até agora, Pequim e Pyongyang têm negado sequer sugestões de negócios de armas com Moscovo. É pouco provável que queiram que eventuais acordos do género venham a público, concluiu o analista de Singapura.
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